O amargo Brasil Holandês pós-Nassau

Publicação: 10/06/2017 03:00

“A 7 de fevereiro, o senhor general Sigismund von Schoppe saiu em expedição contra os portugueses com 4 mil homens, mas foi derrotado pelo inimigo, deixando no campo 1,4 mil mortos e 200 presos.” Era 1649, quando o jovem Peter Hansen Hajstrup, enviado a Pernambuco no mesmo ano do retorno de Maurício de Nassau, relatou em seu diário sobre mais um dia sangrento em terras pernambucanas. Enquanto a estada de Nassau foi denominada Tempo da Boa Paz, o período posterior é marcado pela revolta dos luso-brasileiros, com guerra e miséria.

A rotina extenuante de tentativas de contenção da revolta foi resgatada no livro Viagem ao Brasil (1644-1654) - O diário de um soldado dinamarquês a serviço da Companhia das Índias Ocidentais. Organizada pelo professor da UFRPE Bruno Miranda, em parceria com os pesquisdores Benjamin Teensma e Lucia Xavier, a obra foi lançada no fim do ano passado. Hansen passou cerca de 10 anos em Pernambuco e participou das batalhas de Tabocas, Casa Forte e Guararapes, sobre os quais traz relatos que chocam. “Lá recebi um tiro na veia da perna direita e não foi possível fechar a ferida (…) Assim, tive que ir a cavalo duas milhas até chegarmos, à noite, ao quartel”, contou, sobre o embate nos Guararapes.

As memórias de Hansen são um dos poucos relatos das baixas patentes da companhia recrutadas para atuar em terras pernambucanas, e mostram um Brasil Holandês pós-Nassau violento e pobre. “Encontramos nosso carrasco morto no centro de um círculo de 32 portugueses gravemente mutilados: em parte cortados em dois pedaços, em parte decapitados e em parte sem braços ou pernas. O carrasco havia lhes vendido caro a sua vida”, relatou o soldado, sobre as batalhas de 1645.

A fome era um pesadelo para os soldades, que recebiam rações escassas. “Uma libra e meia (680g) de bacalhau, uma libra de farinha de trigo, uma caneca de azeite de palma e uma caneca de vinagre. Com isso nós deveríamos [nos] contentar durante nove semanas. Muita gente passou para o inimigo e muitos morreram”.

Para o arquiteto do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico de Pernambuco José Luiz de Menezes, dos 24 anos de Brasil Holandês, apenas a época de Nassau deixou legado. “Depois, ficaram militares governando. O que existe de cultura foi deixado por Nassau. Mas há há um falácia sobre como seríamos melhores com os holandeses”.