José Almino de Alencar
Sociólogo e ex-presidente da Fundação Casa de Rui Barbosa
Publicação: 21/11/2024 03:00
Passamos juntos os nomes e Gilberto Marques Paulo foi-me orientando. Delgado (o velho, o novo seria meu colega no primeiro ano) é uma pessoa boníssima e provavelmente será simpático. Mário Batista, idem. Marcos Meira é o representante dos alunos e geralmente vota a favor dos pleitos de estudantes. Lourival Vilanova, não sei, mas não objetará se uma maioria estiver formada. O difícil mesmo seria J.J. Almeida, rígido e intransigente. Murilo era presidente e teria de se manter discreto. Portanto, importante era garantir uma recepção favorável ao parecer de Gilberto justificando a excepcionalidade do caso.
Fiz a minha peregrinação em um fim de semana pelas casas da maioria dos conselheiros pela mão de Jorge Carneiro da Cunha. Gilberto seria o secretário imparcial e não poderia cabalar votos. Delgado, Mario Batista, Marcos Meira reagiram como previsto. Vamireh Chacon também aderiu. Todos alertavam sobre o voto possivelmente contrário do velho J.J. Almeida.
Mantive-me longe da Faculdade e dei entrada discretamente a meu pedido como uma solicitação burocrática normal. No dia da reunião (soube depois): Gilberto carregou nas tintas ao tratar do meu caso. Salientou o fato de que eu, dentro das normas da UnB, poderia ter cursado Economia ou Direito. E que tendo sido obrigado a começar os estudos no segundo semestre, havia-me tornado praticamente um estudante de Direito. Mas, apesar disso, não solicitava o reconhecimento de cursos, mas apenas o direito de recomeçar meu primeiro ano universitário.
Antes de apresentar o seu arrazoado teve de enfrentar uma preliminar levantada por Almeida. Ele argumentava que o caso não tinha porque ser examinado, por ser fora das normas. Assim, o parecer de Gilberto foi o de um advogado de defesa, desfiando os esclarecimentos acima, destacando a excepcionalidade da medida. Foi apoiado por quem prometera apoiar; e J.J. terminou cedendo.
Obviamente, eu manifestei enfaticamente a minha gratidão. Com o tempo, porém, a gratidão foi acrescida pela admiração do gesto, feito com sobriedade, cortesia e objetividade. Na época, ele era um funcionário qualificado e respeitado, mas a distância hierárquica entre ele e os membros do conselho era considerável. A posição social desses representantes da congregação sendo muito mais alta do que hoje em dia.
O Conselho era conservador e a Faculdade também. Gilberto era um rapaz (rapaz na época, sim) de origem mais humilde que fizera todo o curso trabalhando. Seu empenho era apreciado por aquelas pessoas e não convinha desagradá-las. Sua posição exigia prudência, mas também coragem. Estávamos no final de 1964 ou começo de 1965.
Meu pai, Miguel Arraes, encontrava-se preso no Quartel do Corpo de Bombeiros. Eu acho que não é necessário adjetivo algum para qualificar o seu empenho. Imperativo é agora para mim narrá-lo publicamente tal como foi. Afinal, eu não encontrei mais Gilberto Marques Paulo depois de dezembro de 1965, quando segui para o exterior juntando-me ao exílio paterno.
Estranha forma de vida esta nossa, onde um gesto individual, espontâneo, de decência pode e deve ser considerado como um fato excepcional!
Fiz a minha peregrinação em um fim de semana pelas casas da maioria dos conselheiros pela mão de Jorge Carneiro da Cunha. Gilberto seria o secretário imparcial e não poderia cabalar votos. Delgado, Mario Batista, Marcos Meira reagiram como previsto. Vamireh Chacon também aderiu. Todos alertavam sobre o voto possivelmente contrário do velho J.J. Almeida.
Mantive-me longe da Faculdade e dei entrada discretamente a meu pedido como uma solicitação burocrática normal. No dia da reunião (soube depois): Gilberto carregou nas tintas ao tratar do meu caso. Salientou o fato de que eu, dentro das normas da UnB, poderia ter cursado Economia ou Direito. E que tendo sido obrigado a começar os estudos no segundo semestre, havia-me tornado praticamente um estudante de Direito. Mas, apesar disso, não solicitava o reconhecimento de cursos, mas apenas o direito de recomeçar meu primeiro ano universitário.
Antes de apresentar o seu arrazoado teve de enfrentar uma preliminar levantada por Almeida. Ele argumentava que o caso não tinha porque ser examinado, por ser fora das normas. Assim, o parecer de Gilberto foi o de um advogado de defesa, desfiando os esclarecimentos acima, destacando a excepcionalidade da medida. Foi apoiado por quem prometera apoiar; e J.J. terminou cedendo.
Obviamente, eu manifestei enfaticamente a minha gratidão. Com o tempo, porém, a gratidão foi acrescida pela admiração do gesto, feito com sobriedade, cortesia e objetividade. Na época, ele era um funcionário qualificado e respeitado, mas a distância hierárquica entre ele e os membros do conselho era considerável. A posição social desses representantes da congregação sendo muito mais alta do que hoje em dia.
O Conselho era conservador e a Faculdade também. Gilberto era um rapaz (rapaz na época, sim) de origem mais humilde que fizera todo o curso trabalhando. Seu empenho era apreciado por aquelas pessoas e não convinha desagradá-las. Sua posição exigia prudência, mas também coragem. Estávamos no final de 1964 ou começo de 1965.
Meu pai, Miguel Arraes, encontrava-se preso no Quartel do Corpo de Bombeiros. Eu acho que não é necessário adjetivo algum para qualificar o seu empenho. Imperativo é agora para mim narrá-lo publicamente tal como foi. Afinal, eu não encontrei mais Gilberto Marques Paulo depois de dezembro de 1965, quando segui para o exterior juntando-me ao exílio paterno.
Estranha forma de vida esta nossa, onde um gesto individual, espontâneo, de decência pode e deve ser considerado como um fato excepcional!