Boate Kiss: dois anos de impunidade A tragédia da boate Kiss não teve um único responsável condenado e a legislação federal anti-incêndio não saiu do papel

JULIA CHAIB
Do Correio Braziliense

Publicação: 26/01/2015 03:00

Catástrofe mantém feridas abertas, depois da morte de 242 pessoas em Santa Maria, no Rio Grande do Sul (CARLOS VIEIRA/CB/D.A PRESS)
Catástrofe mantém feridas abertas, depois da morte de 242 pessoas em Santa Maria, no Rio Grande do Sul
Na véspera de completar dois anos, a tragédia que matou 242 pessoas na boate Kiss ainda mantém feridas abertas. Além dos que morreram na catástrofe que acometeu a casa noturna de Santa Maria (RS) em 27 de janeiro de 2013, há pelo menos 297 sobreviventes com problemas respiratórios. Outros 26 receberam atendimento no ano passado por estarem com sequelas de queimaduras, fora os diversos com acompanhamento psiquiátrico ou psicológico. Já no campo da prevenção à segurança contra esse tipo de acidente, a tão prometida lei federal sobre o tema segue parada no Congresso com dois projetos. E, na esfera da Justiça, dos mais de 40 denunciados, ninguém está preso até hoje.

Desde a tragédia, seis processos tramitam no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Mais de 40 pessoas foram denunciadas à Justiça pelo Ministério Público. Na esfera criminal, os dois sócio-proprietários da boate, Elissandro Spohr e Mauro Hoffman,e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Augusto Bonilha, acabaram denunciados em abril do ano passado por homicídio doloso qualificado (motivo torpe, meio cruel) e tentativa de homicídio de 636 feridos. Eles chegaram a ter a prisão preventiva decretada, mas, em maio de 2013, o tribunal revogou a prisão.

Na esfera cível, há uma ação sobre a indenização dos parentes das vítimas, e outra civil pública que investiga a suspeita de Improbidade administrativa contra quatro Oficiais do Corpo de Bombeiros da cidade. O presidente da Associação de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), Adherbal Ferreira, conta que os funcionários da boate presentes no dia da tragédia receberam indenizações trabalhistas. Já as vítimas, nem todas pediram ressarcimento e, das que solicitaram, nem todas receberam.

“Nós ainda estamos com a sensação da injustiça. Todo o processo que houve nesses dois anos nos levou a ficar meio desacreditados na Justiça. Nós imaginávamos que o fato de serem 242 vítimas e 600 e tantas tentativas de morte, a essa altura, eles já estariam presos”, desabafa Aderbhal. Neste ano, podem acontecer os depoimentos dos réus no processo e uma possível reconstrução da noite da tragédia.

Na madrugada da tragédia, havia cerca de mil pessoas na boate com capacidade máxima para 631. Superlotada e com apenas uma saída, a Kiss foi palco de um incêndio provocado pelo sinalizador acionado por integrantes da banda Gurizada Fandangueira. A faísca emitida pelo artefato entrou em contato com a espuma responsável pelo isolamento acústico do local.