Aperte o botão de pânico e chame a delegada Eugênia Villa entrou de cabeça na luta contra o feminicídio no Piauí e criou App que reduz crimes

Luce Pereira
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Publicação: 21/02/2018 03:00

O Brasil tornou-se um país de cidadãos atônitos, com o crescimento objetivo da brutalidade. No caso da violência contra mulheres, um lugar perfeito para entusiastas de um machismo combatido a duras penas, que tenta se colocar muito à vontade novamente, empurrado pela cada vez mais crescente onda de “vistas grossas” sobre tantos crimes. Não vale aqui voltar aos fatos escabrosos que marcaram 2017, com ênfase para a consumação do assédio mais vil – o que humilha publicamente a vítima – como foram aqueles registrados no transporte público, com enorme repercussão mundo afora. Ali, o machismo mais explícito e degradante acabou dando uma mão e tanto na construção da pior imagem possível. Vale, sim, é ressaltar que tanta covardia e arrogância está produzindo respostas. As mulheres têm ido às ruas e às redes sociais, certas de que precisam romper o silêncio, especialmente porque, do outro lado, nem tudo é indiferença. Basta o grande exemplo de coragem e dedicação à causa dado pela delegada piuiense Eugênia Villa, cujo esforço também contribui para a tese de que, quando a polícia decide, o crime realmente deixa de compensar.

Villa é o que se pode chamar de profissional obstinada e fatos comprovando, na carreira de 17 anos, não faltam. Agora a visibilidade do trabalho já atravessou o oceano, com todos os méritos, porque de tanto raciocinar em busca de uma maneira de fazer cair o número de feminicídios no Piauí, acabou chegando a um caminho que chamou a atenção até de autoridades inglesas. Com a ajuda de pessoas da própria corporação e de setores de tecnologia do estado, criou um App contendo “botão de pânico”, que, uma vez acionado pela vítima, mostra a geolocalização da ocorrência e leva uma viatura direta e imediatamente ao local. Nenhum custo para a instituição. No Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o projeto, é claro, ganhou a distinção de práticas inovadoras e ela, ainda mais estímulo para continuar defendendo que os ventos da mudança só sopram na direção de quem quer alcançar um objetivo e não desiste dele por nada.

Se a questão é autoridade para falar sobre o assunto, tem de sobra. Decidida a mergulhar profundamente na matéria, voltou à universidade e fez especialização, mestrado e agora doutorado. Em 2015, montou um núcleo de estudos e pesquisa para produzir ações voltadas à prevenção e repressão à violência de gênero, disposta a criar uma infraestrutura convincente. A bem-sucedida criação, batizada de Salve Maria, vem no rastro desses esforços e rende frutos que só quem vive sob ameaça tão estarrecedora é capaz de avaliar a importância. Estado considerado pelo 11º Anuário Brasileiro de Segurança Pública como o número um na violência de gênero, o Piauí agradece – em janeiro, a polícia já havia registrado 147 denúncias chegadas através do aplicativo. Às autoridades inglesas que a convidaram para ir a Londres falar sobre a experiência, além de fazer um intercâmbio com a área de segurança e universidades, disse que sua luta agora é para aperfeiçoar a invenção, oferecendo mais meios de proteção à vítima na hora do manuseio. O agressor poderia ser filmado, fotografado e gravado sem ser visto e sem suspeitar sobre o acionamento do dispositivo.

A delegada Eugênia Villa espera que a divulgação do App no país seja grande o suficiente para que outros estados coloquem o projeto em prática. Nenhum custo a mais terão por isso. Mas mesmo a nova proposta não deixando dúvida sobre sua importância no combate à violência de gênero, o que enche mesmo os olhos e dá alento é a seriedade e determinação com que ela encara a tarefa. De repente, bate aquele sentimento de que o Brasil ainda tem jeito.