Em defesa da jaca

Vladimir Souza Carvalho
Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras
vladimirsc@trf5.jus.br

Publicação: 10/03/2014 03:00

Acho que o grande problema da jaca não é o bago, o caroço, o grude, nem o nabo. Reside no formato. Sejamos sinceros: a jaca é feia para ninguém botar defeito. Nem é comprida, nem redonda, casca espinhenta, a escurecer quando bem madura. Aí onde a coruja pia. É o formato que predominou, fazendo o nome da fruta, pejorativamente, ser transladado para o ser humano, assentando bem no gordo, sem cintura, seja homem, seja mulher. Parece uma jaca. Uma jaca autêntica. Tão bem feita que nem jaca. Jaca ambulante. É o que se fala. E, como não se fosse suficiente, colho em Fred Navarro (Dicionário do Nordeste, p. 380), o uso da palavra jaca, em alguns estados (Alagoas, Maranhão, Pernambuco e Piauí), como sinônimo de traseiro, bunda de nós todos, rabo.

Sergipe não participa dessa ação eminentemente delituosa, ressalto, de logo, que, inclusive, agrava, mais ainda, a baixa reputação da jaca. Não fica só aí. Ouvi, em menino, num jogo de empulhação, a indagação maliciosa: já quer dura ou já quer mole, que traduzidas, significam jaca dura e jaca mole. No fundo, é um desrespeito para com a jaca, de nome científico pomposo, artocarpus integriofolia, o que lhe confere o mais alto padrão de nobreza. Não era para ser tratada como se fosse uma fruta qualquer, nascida em monturo. Ademais, acusa-se, injustamente, a jaca de ser uma bomba atômica em termos de caloria, o que não é verdade.
Tem menos caloria que o mamão e a maçã, segundo A. Balbacgh %u2013 D. Boarim (As frutas na medicina natural). Estou citando para mostrar que não puxo o seu saco. Tudo, então, contribui para o seu desprestígio, baixíssima cotação e ausência nas mesas, em detrimento de outras frutas, de sabor inferior e de caloria maior.

Apresento minha proposta, centralizada na criação da Associação dos Amigos e Defensores da Jaca, com a finalidade precípua de mostrar os fatores positivos da jaca, sobretudo da dura, bem gelada, na tentativa de evidenciar que, mesmo se cuidando de uma fruta feia (é verdade!), o bago de jaca é saborosíssimo.

Ou seja, ninguém deve se desencantar pelo nome, mas ser guiado pelo sabor. Experimente um bago de jaca %u2013 pode ser o lema da campanha -, antes que a jaca desapareça. Sugiro criar, também, o Partido da Jaca, arregimentar os jaquistas por todo o país, para fortalecer a defesa da jaca, responsável por um centro de estudos e pesquisas encarregado de espalhar mudas de jaca para todo o território nacional. E, se possível, mudas de jaqueiras cujos novos frutos sejam despojados do grude.

Vamos, então, incluí-la na merenda escolar, no café dos hotéis, sobremesa nos melhores restaurantes, incentivando as pesquisas para, igualmente, se atracar na jaqueira que, com menos de um metro e meio, comece a parir jacas sem espinho na casca e sem perder o primitivo sabor, aprimorando o formato, %u2013 aí, sim, a novidade -, para sua maior atração, tornando bonito, de cintura fina a dividir o corpo em duas partes distintas, de modo que, ante a mulher bela, que passa, se possa dizer que esta é, enfim, a verdadeira jaca. Traduza-se: o homem, com suas técnicas, reparando o secular equívoco da natureza.