EDITORIAL » Anayde Beiriz, sempre presente

Publicação: 22/10/2016 03:00

Há 86 anos, uma mulher circulava pelas ruas do Recife prestes a encerrar a sua história. O veneno (suicídio? assassinato?) foi o triste epílogo da paraibana Anayde Beiriz, 16 dias depois da execução, na Casa de Detenção (hoje Casa da Cultura) do seu amante, João Dantas, matador de João Pessoa, crime que detonou a Revolução de 1930, levando Getulio Vargas ao poder. Estava com 25 anos de idade.

Professora, poetisa, frequentadora de saraus, aluna do primeiro curso de datilografia da Paraíba, Anayde havia saído do seu estado por causa do “linchamento moral” que sofreu depois que a intimidade de sua relação com Dantas foi exposta em cartas e fotos no jornal A União, órgão do governo da Parahyba do Norte. Com o assassinato de João Pessoa, renegada pela própria família, veio buscar guarida em Pernambuco.

No Recife, conseguiu se encontrar a duras penas com o amante preso. Estava hospedada no Asylo Bom Pastor, no bairro da Madalena, um local onde, segundo descrição do Diario de Pernambuco, “se abrigam as infelizes que foram desviadas do caminho do bem, regenerando-se para a volta do seio da comunhão social”. Às 11h de 22 de outubro de 1930, Anayde dava o último suspiro. Seria enterrada como indigente no mesmo dia.

Mas Anayde Beiriz não foi apagada da história. Ressurgiu como uma pioneira da liberdade feminina nordestina e brasileira da primeira metade do século passado. Historiadores e escritores buscaram recuperar a sua pouca obra que resistiu à destruição por ter sido considerada “imoral”.

Defensora do voto feminino, ela ensinava adultos e escandalizava os paraibanos com seu figurino e o cabelo curto. Namorar homem com o dobro de sua idade também contribuía para a fama de quem  tinha o apelido de “Panthera dos Olhos Dormentes”.

Em 1983, a cineasta Tizuka Yamazaki leva para as telas a adaptação do livro de José Joffily (Anayde Beiriz, paixão e morte na Revolução de 30) com o título de Parahyba Mulher Macho. Tânia Alves incorporou Anayde.

No filme, um repentista cego (feito por Bráulio Tavares) recita versos que servem para Anayde e para os muitos outros que fazem da vida a própria história: Pois são essas pessoas que estão/ conquistando a riqueza e o poder/ mas sem nunca jamais compreender/ os caminhos da história como são/ eles nunca entenderam a lição/ de quem soube nadar contra a corrente/ de quem sempre arriscou um passo à frente/ e pisou sem ter medo do escuro/ empurrou na ladeira do futuro a carroça pesada do presente.