Muito perto do inferno (I)

Murilo Cavalcanti
Secretário de Segurança Urbana da Cidade do Recife

Publicação: 21/01/2017 03:00

O Brasil vive uma guerra civil não declarada. Os números não mentem: 58.467 pessoas foram assassinadas no ano de 2015. No  somatório, 279.567 morreram violentamente no país no período de março de 2011 a novembro de 2015. Nesse mesmo período na guerra da Síria foram 256.124 mortes violentas. Tem mais: 45.460 estupros foram notificados pela Polícia em 2015. 110.325 armas ilegais de fogo foram apreendidas no mesmo ano. 76% dos brasileiros têm medo de morrer assassinados. A cada nove minutos um brasileiro é executado. Estamos muito, muito perto do inferno.

Nunca a violência urbana assustou tanto os brasileiros como tem ocorrido nos últimos anos. Homicídios, assaltos, rebeliões, estupros, agências bancárias estouradas, caixas eletrônicos detonados, essa é a rotina de milhões de pessoas que vivem nos grandes centros urbanos do Brasil. E o que é pior, sem nenhuma perspectiva de haver uma luz no fim do túnel, que leve o país a encontrar a tão almejada paz social. Essa violência que vive o Brasil não é fruto da omissão de um governo. Essa omissão vêm de várias gestões, principalmente dos governos centrais, que ao longo de mais de 30 anos de descaso com a política de segurança pública, não construíram um Pacto Nacional em defesa da vida.

Nenhuma medida isoladamente tirará o país do caos que vive atualmente. A crise dos presídios é a mesma crise de violência que o cidadão enfrenta nas ruas dos centros urbanos. Sem nenhuma perspectiva de trabalho ou de uma vida digna, dois terços dos jovens brasileiros na faixa dos 18 a 27 anos de idade estão desempregados. São parcelas desses jovens que estão matando e morrendo nessa guerra insana. Para enfrentar o dilema da insegurança pública e da deliquência que atinge os brasileiros, se faz urgente e necessário uma Política Nacional de Enfrentamento à Violência Urbana, coordenada pelo governo federal, com a participação ativa dos governos dos estados e dos prefeitos das regiões metropolitanas, onde há uma maior predominância do crime. Há uma necessidade imperiosa de se estabelecer uma política pública nacional de segurança que vá, das medidas preventivas, passando por medidas repressivas e de ressocialização, focada principalmente nos jovens da periferia dos grandes centros urbanos, jovens esses completamente excluídos de escolas públicas de qualidade, espaços de convivência cidadã, atividades voltadas para cultura de paz e não violência e preparação para o mercado de trabalho, cada vez mais exigente de profissionais com elevado grau de conhecimento acadêmico e de mercado.

Se queremos nos inspirar em políticas de resultados, nenhuma autoridade pública brasileira pode desconhecer e menosprezar o sucesso da nossa vizinha Colômbia, que nos anos 1980 estava literalmente no inferno. Seis candidatos à Presidência da República assassinados. O ministro da Justiça, Lara Bonilla, executado. O dono do periódico El Espectador fuzilado nas imediações do jornal. Explosão de avião da Avianca com 108 passageiros. Pablo Escobar tocando fogo no país. Essa era a dura realidade colombiana. Era. O Brasil está próximo de se transformar na Colômbia dos anos 1980.

Um presidente da República corajoso junto com uma boa safra de bons prefeitos, com determinação política e ações públicas integradas nos territórios mais vulneráveis e mais violentos, resgataram Medellìn e Bogotá das páginas policiais e declinaram essas duas cidades colombianas, até então, ostentadoras do título de cidades mais violentas do mundo, em referências internacionais de políticas de reversão da violência urbana. Medellín e Bogotá estão constantemente com suas taxas de homicídios em queda e consequentemente recebendo maiores investimentos privados na América Latina. Elementar: aonde há crime não há investimentos.