Reflexos das mudanças nas regras do jogo Com o fim das coligações proporcionais, que podem ser abolidas em 2018, o resultado final das urnas deve ser outro

Aline Moura
aline.moura@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 24/06/2017 03:00

A eleição de 2018 pode ser a última a manter as coligações proporcionais ou a primeira, desde a redemocratização, a acabar com esse tipo de acordo político, no qual muitos parlamentares se elegem mesmo tendo menos votos do que outros. Em Pernambuco, segundo a contagem de lideranças políticas, nove deputados estaduais venceram a disputa sem estar entre os mais votados, assim como um deputado federal: Kaio Maniçoba (PMDB). Isso não quer dizer que eles não tiveram votos, mas os 10 receberam uma votação inferior a concorrentes que ficaram de fora da Assembleia Legislativa e da Câmara dos Deputados. Cinco já mudaram de partido.

O debate sobre o fim das coligações está sendo realizado em três frentes no Congresso Nacional em meio à crise política de representatividade, aquela em que muitos parlamentares agem numa direção oposta ao que pensam seus eleitores e estão envolvidos em escândalos de corrupção. Ninguém, contudo, garante haver tempo para mudar as regras do jogo no auge da Lava-Jato.

A PEC 282/16 prevê o fim das coligações para 2020, a PEC 77/2003 cogita incluir a discussão sobre a verdade eleitoral por meio de emenda neste ano e outra está sendo articulada para aprovar o distritão (ganha quem tiver mais votos) já para 2018. Todas as propostas têm praticamente o mesmo conceito: reduzir o número de deputados que receberam poucos votos, mas ainda conseguiram o lugar ao sol na política. Coincidentemente, a maioria deles compõe o chamado baixo clero da Câmara dos Deputados e da Assembleia Legislativa, ou seja, representantes com pouca influência política, com exceções.

Muitos deles venceram por conta de puxadores de votos. É possível citar o caso do Pastor Cleiton Collins, que pertence ao PP e se coligou com o Pros. Em 2014, Collins teve 216.874 votos para deputado estadual - foi o mais bem votado -, uma quantidade suficiente para se eleger como deputado federal. Mas como ele precisava apenas de 93.931 votos para conquistar uma cadeira na Assembleia, os votos restantes ajudaram a dar a vitória a Zé Maurício (PP), Dr. Valdir (PP), Everaldo Cabral (PP) e Joel da Harpa (Pros). Beto Acciolly (SD) e o Professor Lupércio (SD) também não teriam sido eleitos se não fossem as coligações partidárias com PTN, PRTB e PV. O mesmo raciocínio vale para João Eudes (PRP), cujo partido se coligou com o PSDC, e Eduíno (PHS), que fez alianças proporcionais com o PSL e o PPS. Edilson Silva (PSol) conquistou 30,4 mil votos e seu partido coligou-se com o PMN. Dos dez eleitos sem estarem entre os mais votados, contudo, cinco trocaram de legenda: Eduíno e João Eudes foram para o PP; Beto Accioly mudou-se para o PSL; Joel da Harpa migrou para o PTN; e Kaio Maniçoba, antes do PHS, está agora no PMDB.

De maneira mais simples, as coligações ajudam um candidato a atingir o quociente eleitoral em cada estado, porém podem prejudicar quem teve mais votos. Em 2014, uma coligação para deputado estadual em Pernambuco garantiu uma vaga quando atingiu 93.931 votos - o quociente eleitoral. Para federal, deu a vitória a uma liderança quando a soma dos votos atingiu 179.329. Se uma pessoa teve 20 mil para deputado estadual, por exemplo, e outros menores de sua aliança tiveram valores parecidos que somam a 93,3 mil, ela pode se eleger. Se outro candidato teve 40 mil, porém, sua coligação não atingiu o quociente e ele perde.  

O deputado Cleiton Collins fala com cuidado sobre as coligações proporcionais, mas ele é a favor do fim delas. O parlamentar admite que o distritão dificulta a vida dos que concorrem ao primeiro mandato. Mas ele lembra que também já se candidatou pela primeira vez e precisou ter uma história para vencer. “O mais viável é que prevaleça a verdade eleitoral, porque se identifica com a vontade da população. Quando o eleitor é responsável direto por aquela vitória, ele tem o direito e dever de acompanhar o deputado”.

O deputado Soldado Joel da Harpa, que teve a menor quantidade de votos entre os eleitos (19.794), acha justo que prevaleça a vontade do eleitor numa disputa política. Ele faz a ressalva, no entanto, sobre o distritão. “Com as coligações, os políticos que não têm estrutura financeira para fazer campanha têm uma oportunidade a mais”. Kaio Maniçoba foi procurado, mas não quis falar.

Antes e depois

Como funciona

  • Uma coligação partidária consiste na união de dois ou mais partidos que apresentam os seus candidatos em conjunto para uma determinada eleição. Perante a Justiça Eleitoral, uma coligação funciona como apenas um partido, tendo os mesmos direitos e deveres dos partidos políticos isolados.
  • As coligações partidárias podem ser formadas só para a eleição majoritária (que elege pessoas para o cargo de prefeito e vice-prefeito), só para a eleição proporcional (cargo de vereador) ou para as duas.
  • A eleição é definida através do sistema proporcional, onde primeiramente são calculados os partidos e coligações que obtiveram mais votos. Só a partir daí as vagas disponíveis em cada município são distribuídas entre os candidatos mais votados de cada partido.
  • O Brasil adota o sistema proporcional de lista aberta, no qual a legenda partidária elegerá um número de cadeiras no Parlamento, proporcional ao número de votos que obteve, e serão eleitos os candidatos mais bem votados da legenda até o limite de cadeiras que obteve.
  • Antes, esse sistema proporcional permitia, por exemplo, o denominado "Efeito Tiririca", no qual um determinado candidato com uma votação muito expressiva, que ultrapassasse o quociente eleitoral, permitia que candidatos com poucos votos e pertencentes a uma legenda com muitos votos fossem eleitos em detrimento de outros com mais votos.
  • A partir das eleições de 2016 foi necessário, além do partido ou da coligação alcançar o quociente, o candidato atingir 10% total desse quociente.
Como pode ficar
  • No dia 23 de novembro do ano passado, o Senado aprovou, em segundo turno, por 63 votos a 9, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 282/16, que prevê mudanças no atual sistema político do país.
  • A PEC propôs o fim das coligações para eleições proporcionais para deputados e vereadores e previu a criação de cláusulas de desempenho eleitoral para que os partidos políticos tenham acesso ao fundo partidário e ao tempo gratuito de televisão. Também determina a perda do mandato ao político que se desfiliar do partido pelo qual foi eleito.
  • No dia 6 de junho deste ano, a Câmara dos Deputados instalou uma comissão especial para analisar a Proposta de Emenda à Constituição 282/16, do Senado.
  • Os deputados deverão apresentar agora as emendas ao texto do Senado. O prazo se iniciou no último dia 6 de junho e vai durar 10 sessões do Plenário da Câmara. A comissão tem o prazo de 40 sessões - iniciado em 17 de maio, data da sua constituição - para discutir e votar o parecer, que depois irá para o plenário da Casa.
  • Para que as coligações sejam acabadas, o texto em tramitação deve ser aprovado na Câmara e no Senado até o final de setembro. A proposta inicial é para o fim das coligações passarem a valer a partir de 2020, mas há parlamentares que defendem a validade da regra para 2018.
  • Como alternativa ao fim das coligações, os partidos com afinidade ideológica  e programática poderão se unir em federação, que deverá atuar com identidade política única nas casas legislativas.
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral e Câmara dos Deputados