Um abrigo de criaturas fantásticas Mais de 300 trabalhos de expressão artística ficam expostos, a partir de amanhã, em novo espaço dedicado a exposições no Shopping RioMar

Júlio Cavani
juliocavani.pe@dabr.com.br

Publicação: 15/08/2016 03:00

Animais, monstros, músicos, santos, assombrações, torcedores e soldados estão entre os mais de 300 personagens que passam a habitar sala do Shopping RioMar, a partir de amanhã, quando será aberta a exposição Liramartes, com peças da coleção de arte do arquiteto Carlos Augusto Lira. O espaço é nova galeria que funcionará todos os dias, com acesso gratuito, mas sem comercializar obras.

Lira tem acervo com mais de 4,5 mil itens. As três centenas de obras selecionadas não são as mesmas mostradas no Museu do Estado em 2014. Desta vez, ele escolheu esculturas que retratam seres humanos, animais e criaturas fantásticas, confeccionadas por mestres de diversas regiões do Brasil. "Artistas populares têm essa tradição figurativa", identifica.

O resultado é um ambiente que transpira vitalidade e mexe com a imaginação. No texto de apresentação, o arquiteto cria uma situação hipotética em que as figuras ganham vida e começam a caminhar pelo shopping, como acontece nos filmes Uma noite no museu e Toy story. A madeira é o material mais representado, com cerca de 50 peças (sem contar as dezenas de ex-votos). De barro, há em torno de 40 esculturas. Mais de 150 artistas estão representados.

Além dos mestres autodidatas mais espontâneos (classificados como "artistas populares"), há nomes consagrados do circuito de arte moderna e contemporânea, como João Câmara, Brennand, Gilvan Samico. Jota Zeroff representa uma nova geração de pintores. Também há reproduções de pinturas clássicas, de estrangeiros como Miró e Salvador Dalí, para criar contraponto e indicar coincidências. "Não vejo a arte popular como regionalismo. Picasso não seria nada sem a influência da África. Um artista que nunca foi a uma grande capital pode ter tudo dentro dele mesmo", acredita Lira.

Os únicos produtos à venda na galeria são comes e bebes oferecidos pela chef Anna Corina, e o livro A lírica de Carlos Augusto Lira, que reúne fotos da coleção do arquiteto.

Por enquanto, a galeria ainda tem um aspecto de loja, com vitrine, prateleiras, espelhos e balcões. Carlos Augusto Lira foi bastante criativo na forma como cada espaço foi ocupado (inclusive os provadores, preenchidos com esculturas religiosas e eróticas, de temática mais íntima), mas espera-se que a estrutura esteja mais propriamente adequada para a arte nas próximas exposições.

Detalhes

Mulher-Monstro
Ao lado da reprodução de uma pintura do artista medieval holandês Hieronymus Bosch, Carlos Augusto Lira mostra uma escultura do alagoano José Petrônio Farias dos Anjos, que retrata uma criatura monstruosa com dentes afiados e corpo de mulher.

Lições morais
Placas com textos ilustrados por pinturas apresentam lições moralistas do passado, preconceituosas, ultrapassadas e conservadoras. Uma delas diz que mulheres não devem aprender a nadar com estranhos na praia para não se destruir. Outra fala em "delinquência sexual".

Bonecos

Mamulengos e bonecos articulados, utilizados em espetáculos teatrais, estão presentes na exposição e devem encantar as crianças. Entre eles, um conjunto de fantoches produzidos pelos alunos do mestre José Lopes, de Glória de Goitá, com personagens do cotidiano e seres mitológicos.

Provadores
Nas cabines onde ficavam os provadores da loja que funcionava no local da galeria, Carlos Augusto Lira colocou esculturas que representam o lado íntimo dos seres humanos nas práticas espirituais e carnais (o sagrado e o profano). De um lado, estão figuras religiosas. Do outro, peças eróticas e até pornográficas.

Anônimos
Carlos Augusto Lira não sabe quem são os autores de todas as peças da coleção. Algumas das obras mais importantes da exposição são de anônimos, como um jacaré, em tamanho natural (cerca de dois metros de extensão), feito a partir de um tronco.