Batalha contra o streaming Cineastas europeus assinam manifesto para reivindicar proteção contra a política expansionista de serviços como a Netflix

Publicação: 23/05/2017 03:00

Importantes cineastas europeus, incluindo Michael Haneke (Áustria), Wim Wenders (Alemanha), os irmãos Dardenne (Bélgica), Stephen Frears (Reino Unido) e os espanhóis Fernando Trueba e Alejandro Amenábar assinaram ontem um manifesto em favor do cinema europeu contra os gigantes da internet.

Coincidindo com o Festival de Cannes, onde a seleção em competição de dois filmes da Netflix despertou grande polêmica, os signatários afirmam que é “mais urgente do que nunca manter a territorialidade dos direitos, porque serve para estruturar e assegurar o elevado nível de financiamento de obras na Europa, especialmente no caso das indústrias cinematográficas mais frágeis”.

O texto se alinha a posicionamentos adotados em Cannes contrários à estratégia da Netflix de exibir o filme no festival e ignorar as salas de cinema antes de oferecê-lo via streaming. Pressionada em 2017, a organização decidiu barrar das próximas edições as produções cujo cronograma de projeção despreza o circuito cinematográfico. O presidente do júri, o cineasta Pedro Almodóvar, se mostrou desconfortável em premiar com a Palma de Ouro um longa-metragem destinado somente à plataforma online. “Seria um paradoxo”, afirmou na abertura.

À revista Variety, o diretor de conteúdo da Netflix, Ted Sarandos, considerou “menos atrativo” um retorno a Cannes após a exigência de exibição nos cinemas por ferir o princípio do serviço de streaming de disponibilizar as obras aos assinantes. A plataforma levou à Riviera Francesa dois filme para disputar a Palma de Ouro: Okja e The Meyerowitz stories.

O manifesto assinado pelos cineastas alertam para a necessidade da criação de mecanismos de proteção à autonomia artística em relação ao poder financeiro das gigantes multinacionais - representadas atualmente na Netflix e na Amazon. “Deve ser consolidado e reforçado o direito dos autores a viver de sua arte para que possam continuar criando. A integração dos gigantes da Internet na economia criativa europeia é determinante para o futuro do cinema”, diz o texto.

Os cineastas consideram que “a Europa deve definir uma meta e assegurar as condições de um jogo competitivo mais justo e sustentável entre todos aqueles que difundem nossas obras”. “Há muita coisa em jogo, mas o desafio é formidável: nos unirmos - atores políticos, criadores e cidadãos - para redesenhar e reconstruir uma política cultural exigente e ambiciosa, adaptada ao ambiente digital, a sua economia e as suas aplicações, que coloque em valor as obras e situe os criadores no epicentro da ação”, concluem.

Paolo Sorrentino (Itália), Pablo Berger, Montxo Armendáriz, Iciar Bollain, Fernando Colomo, José Luis Cuerda (Espanha), Costa Gavras, Michel Hazanavicius, Bertrand Tavernier (França), Cristian Mungiu (Romênia) e Volker Schlöndorff (Alemanha), entre outros cineastas, se juntaram ao apelo, publicado durante a realização do Festival de Cannes, o maior festival de cinema do mundo.

De volta
O ex-vice-presidente americano Al Gore voltou a Cannes ontem com um filme exibido em caráter hors-concours, década após o sucesso em apresentar a primeira parte do documentário em defesa do meio ambiente. Em 2006, Uma verdade inconveniente contribuiu para conscientizar sobre a urgência de agir contra o aquecimento global. Nos EUA, tornou-se o terceiro documentário mais visto nos cinemas e levou um Oscar. Em 2017, o impacto climático é mais evidente, mas os meios para agir também são mais importantes: Uma verdade mais inconveniente mostra o caminho percorrido e quer dar uma visão positiva.