Diferença retratada nos quadrinhos Autora francesa Julie Dachez transpõe para a o formato de graphic novel a convivência com o autismo descoberto tardiamente, aos 27 anos de idade

ALEXANDRE DE PAULA
edviver@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 26/06/2017 03:00

A francesa Julie Dachez descobriu só aos 27 anos que tinha autismo. O diagnóstico alterou sua vida, já que ela não entendia por que se sentia tão deslocada de tudo e de todos e por que qualquer mudança era uma hecatombe no cotidiano. A descoberta permitiu entender e aceitar melhor a razão de a vida considerada normal ser tão penosa para ela. Foi essa experiência que baseou o quadrinho A diferença invisível, publicado agora no Brasil pela editora Nemo. A obra foi produzida em parceria com a desenhista e ilustradora Mademoiselle Caroline, que cuidou da parte gráfica da narrativa.

Apesar de Julie optar por não usar o primeiro nome, a história contada na HQ é realmente um retrato dela. Chamada de Marguerite (nome do meio de Julie), a protagonista passa por situações bem parecidas com as que ela viveu para enfrentar o autismo e as diferenças.

No quadrinho, há um salto muito grande quando a protagonista descobre que tem autismo. Isso abre para ela a possibilidade de se aceitar e compreender o que ocorria antes. “Após 10 anos de peregrinação, esse diagnóstico me libertou porque veio me dar uma palavra sobre a minha diferença. Era absolutamente essencial para mim, para aprender a respeitar meus limites enquanto me concentrava em meus pontos fortes”, contou Julie a um blog francês.

Julie diz acreditar que a linguagem dos quadrinhos favorece a representação do que é ter autismo e do que se passa na cabeça de quem vive com a síndrome. “Eles permitem que os leitores compreendam concretamente o que acontece na cabeça de uma pessoa com Asperger. É importante reconhecer o trabalho da ilustradora, que conseguiu entrar na minha pele e transcrever perfeitamente meus sentimentos”, comentou.

Além de publicar a história em quadrinhos, Julie se mantém ativa em diversas plataformas (blog, YouTube) para falar sobre autismo e a necessidade de se lidar de maneira diferente com a síndrome. Um questionamento recorrente é se o autismo ainda é forte na vida dela. “Sou e sempre serei autista, então tenho os mesmos problemas - e as mesmas forças também - de antes. Mas foi a minha maneira de perceber e experimentar que mudou tudo. Finalmente me reconciliei comigo e adaptei meu ambiente (e minha vida) para as minhas características, em vez de gastar o meu tempo me ajustando em um ambiente em que não me encaixo”, explicou.

Para Julie, apesar de tratar especificamente do autismo, o quadrinho pode fazer sentido para a vida de todos. “Eu costumava dizer que o autismo é uma desculpa para falar sobre a diferença em sentido amplo e autoaceitação. E estar em paz consigo mesmo é uma busca universal”.

Serviço

A diferença invisível
Julie Dachez e Mademoiselle Caroline. Editora Nemo. 192 páginas. R$ 44,90.