Essa família (nem) é muito unida...
Mudanças na estrutura tradicional da célula familiar inspiram filme do estado e obras recentes da cinematografia do país
BRENO PESSOA
breno.pessoa@diariodepernambuco.com.br
Publicação: 23/09/2017 03:00
Parte expressiva dos dramas familiares vem da relação entre pais e filhos. De tão comum, o problema é frequentemente tema a ser trabalhado na arte, seja como exercício criativo ou forma de exorcizar traumas pessoais. As clássicas questões e conflitos originários da família aparecem em primeiro plano em uma série de produções recentes do audiovisual brasileiro e despontam também no cerne do longa-metragem pernambucano Paterno, novo filme de Marcelo Lordello (Eles voltam), atualmente em gravação no Recife.
De acordo com o cineasta, o título faz parte de uma tetralogia em desenvolvimento, que pretende abordar diferentes fases da vida de uma pessoa. “Eu faço um recorte a partir da idade dos personagens”, afirma, acrescentando que Eles voltam (2012), focado na adolescência, é a primeira peça da composição, enquanto Paterno, cuja figura central é um homem de meia-idade, seria a terceira parte da série.
A razão para adiar, momentaneamente, o que seria a sequência natural do primeiro trabalho tem a ver com a vida pessoal do diretor. “Paterno foi o segundo (a ser gravado) porque era muito pertinente com uma fase que eu estava passando, a paternidade”, diz o realizador, pai de duas crianças.
A produção é estrelada por Marco Ricca, no papel de Sérgio, arquiteto à frente de uma construtora familiar, a Bittencourt Ramos. A morte do pai, fundador da empresa, passa a refletir sobre os rumos da vida. “Ele vive aquele momento vida em que seus fundadores, os pais, estão sumindo, falecem”, explica.
“Ele percebeu que o que ele fez da vida até agora não foi o que ele queria ter feito quando era jovem. Ele tinha um sonho e teve de abrir mão em prol da empresa familiar, um projeto do pai”, detalha Lordello. “É o recorte de um momento de crise, de pensar a vida”, acrescenta Ricca, que também viveu um pai recentemente nas telas, em As duas Irenes, atualmente em cartaz nos cinemas.
Ele não enxerga semelhanças entre os dois papéis, de estratos sociais diferentes e distintos problemas, embora igualmente complexos. “O maior desafio, para qualquer ator, é dar credibilidade ao personagem, torná-lo uma pessoa real”, ressalta Ricca, que tem participado de ensaios quase que diários na sequência das filmagens, como preparação para os trabalhos do dia seguinte.
Orçado em R$ 1,2 milhão, com recursos do Ministério da Cultura e Funcultura, Paterno começou a ser rodado no início de setembro e as filmagens devem prosseguir até outubro. O filme ainda não tem data de estreia definida. O elenco conta ainda com Selma Egrei, Fabiana Pirro e Gustavo Patriota.
“Ele percebeu que o que ele fez da vida até agora não foi o que ele queria ter feito quando era jovem.
Ele tinha um sonho e teve que abrir mão”
Marco Ricca, ator de Paterno
No seio familiar
As duas Irenes
Escrito e dirigido por Fabio Meira, corroteirista de Paterno, a produção tem origem em uma história familiar: os rumores de que o avô do cineasta teria duas filhas com o mesmo nome, como as protagonistas do longa-metragem. No filme, uma garota chamada Irene descobre que o pai, Tonico (Marco Ricca), tem não só relação extraconjugal como também uma filha de mesmo nome. As duas acabam se aproximando, sem o conhecimento dos familiares, e progressivamente, elas percebem as fragilidades existentes nos relacionamentos dentro dos respectivos lares. De comportamento rústico e conservador, Tonico tenta transmitir para as garotas a imagem de alguém com postura irrepreensível e inquestionável.
Bingo: O rei das manhãs
O filme de Daniel Rezende é uma espécie de cinebiografia do ator Arlindo Barreto, um dos intérpretes do palhaço Bozo na televisão, mas a história não se detém na busca do personagem pela fama e sucesso. O arco dramático do roteiro, de Luiz Bolognesi (Bicho de sete cabeças), passa também pela lacuna que o personagem central, Augusto (Vladimir Brichta), deixa na vida filho Gabriel (Cauã Martins), após assumir o papel do apresentador infantil Bingo. Embora retratado como figura amorosa, o pai é também relapso: esquece o aniversário da criança enquanto se diverte em festa regada a drogas e bebidas e, em outras ocasiões, se mostra preocupado só com a carreira e deixa de lado responsabilidades familiares.
Como nossos pais
A popular música de Belchior foi o ponto de partida para o filme, escrito e dirigido por Laís Bodanzky (Chega de saudade), ainda que a história não tenha relação direta com a letra. O embate de gerações toma forma com os atritos entre Rosa (Maria Ribeiro) e a mãe, Clarice (Clarisse Abujamra). Tratada por vezes de maneira ríspida, a filha por vezes enxerga a figura materna como antagonista e sente dificuldades em compreender as atitudes e comportamento dela. As questões sobre maternidade/paternidade também são abordadas a partir da relação da própria Rosa e seu marido, Dado (Paulo Vilhena), as duas filhas e as dificuldades para manter o equilíbrio entre as obrigações familiares e aspirações pessoais.
Mulher do pai
A protagonista Nalu (Maria Galant) é uma garota de 16 anos que mora com o pai e a avó no interior do Rio Grande do Sul com o Uruguai. Cego desde os 20 anos, pai, Ruben (Marat Descartes) não é muito próximo da filha e passa maior parte do tempo acompanhado da mãe, tecendo lã. Quando a idosa morre, a garota se vê obrigada a se aproximar do homem. No longa de Cristiane Oliveira, a filha fica em uma posição ambígua e delicada: ao mesmo tempo que vive sob tutela do pai, que tenta tolher o comportamento da adolescente e mantê-la o máximo de tempo em casa, ela também se torna responsável por ele. As inesperadas obrigações assumidas pela adolescente geram uma série de brigas entre os dois.
Inspiração
Segundo Lordello, a ideia de abordar diferentes períodos da vida em uma série de quatro filmes teve como inspiração o personagem Antoine Doinel, protagonista de cinco filmes dirigidos por François Truffaut ao longo de 20 anos. Interpretado por Jean-Pierre Léaud, Doinel era uma espécie de alterego do diretor e tem a vida contada em diversos períodos marcantes, como a infância na escola, a transição da adolescência para a maioridade e crises conjugais, entre outros. O primeiro título dessa saga é Os incompreendidos (1959) e o último é O amor em fuga (1979). Ao contrário de Truffaut, Lordello vai explorar as faixas etárias sob a ótica de diferentes personagens.
De acordo com o cineasta, o título faz parte de uma tetralogia em desenvolvimento, que pretende abordar diferentes fases da vida de uma pessoa. “Eu faço um recorte a partir da idade dos personagens”, afirma, acrescentando que Eles voltam (2012), focado na adolescência, é a primeira peça da composição, enquanto Paterno, cuja figura central é um homem de meia-idade, seria a terceira parte da série.
A razão para adiar, momentaneamente, o que seria a sequência natural do primeiro trabalho tem a ver com a vida pessoal do diretor. “Paterno foi o segundo (a ser gravado) porque era muito pertinente com uma fase que eu estava passando, a paternidade”, diz o realizador, pai de duas crianças.
A produção é estrelada por Marco Ricca, no papel de Sérgio, arquiteto à frente de uma construtora familiar, a Bittencourt Ramos. A morte do pai, fundador da empresa, passa a refletir sobre os rumos da vida. “Ele vive aquele momento vida em que seus fundadores, os pais, estão sumindo, falecem”, explica.
“Ele percebeu que o que ele fez da vida até agora não foi o que ele queria ter feito quando era jovem. Ele tinha um sonho e teve de abrir mão em prol da empresa familiar, um projeto do pai”, detalha Lordello. “É o recorte de um momento de crise, de pensar a vida”, acrescenta Ricca, que também viveu um pai recentemente nas telas, em As duas Irenes, atualmente em cartaz nos cinemas.
Ele não enxerga semelhanças entre os dois papéis, de estratos sociais diferentes e distintos problemas, embora igualmente complexos. “O maior desafio, para qualquer ator, é dar credibilidade ao personagem, torná-lo uma pessoa real”, ressalta Ricca, que tem participado de ensaios quase que diários na sequência das filmagens, como preparação para os trabalhos do dia seguinte.
Orçado em R$ 1,2 milhão, com recursos do Ministério da Cultura e Funcultura, Paterno começou a ser rodado no início de setembro e as filmagens devem prosseguir até outubro. O filme ainda não tem data de estreia definida. O elenco conta ainda com Selma Egrei, Fabiana Pirro e Gustavo Patriota.
“Ele percebeu que o que ele fez da vida até agora não foi o que ele queria ter feito quando era jovem.
Ele tinha um sonho e teve que abrir mão”
Marco Ricca, ator de Paterno
No seio familiar
As duas Irenes
Escrito e dirigido por Fabio Meira, corroteirista de Paterno, a produção tem origem em uma história familiar: os rumores de que o avô do cineasta teria duas filhas com o mesmo nome, como as protagonistas do longa-metragem. No filme, uma garota chamada Irene descobre que o pai, Tonico (Marco Ricca), tem não só relação extraconjugal como também uma filha de mesmo nome. As duas acabam se aproximando, sem o conhecimento dos familiares, e progressivamente, elas percebem as fragilidades existentes nos relacionamentos dentro dos respectivos lares. De comportamento rústico e conservador, Tonico tenta transmitir para as garotas a imagem de alguém com postura irrepreensível e inquestionável.
Bingo: O rei das manhãs
O filme de Daniel Rezende é uma espécie de cinebiografia do ator Arlindo Barreto, um dos intérpretes do palhaço Bozo na televisão, mas a história não se detém na busca do personagem pela fama e sucesso. O arco dramático do roteiro, de Luiz Bolognesi (Bicho de sete cabeças), passa também pela lacuna que o personagem central, Augusto (Vladimir Brichta), deixa na vida filho Gabriel (Cauã Martins), após assumir o papel do apresentador infantil Bingo. Embora retratado como figura amorosa, o pai é também relapso: esquece o aniversário da criança enquanto se diverte em festa regada a drogas e bebidas e, em outras ocasiões, se mostra preocupado só com a carreira e deixa de lado responsabilidades familiares.
Como nossos pais
A popular música de Belchior foi o ponto de partida para o filme, escrito e dirigido por Laís Bodanzky (Chega de saudade), ainda que a história não tenha relação direta com a letra. O embate de gerações toma forma com os atritos entre Rosa (Maria Ribeiro) e a mãe, Clarice (Clarisse Abujamra). Tratada por vezes de maneira ríspida, a filha por vezes enxerga a figura materna como antagonista e sente dificuldades em compreender as atitudes e comportamento dela. As questões sobre maternidade/paternidade também são abordadas a partir da relação da própria Rosa e seu marido, Dado (Paulo Vilhena), as duas filhas e as dificuldades para manter o equilíbrio entre as obrigações familiares e aspirações pessoais.
Mulher do pai
A protagonista Nalu (Maria Galant) é uma garota de 16 anos que mora com o pai e a avó no interior do Rio Grande do Sul com o Uruguai. Cego desde os 20 anos, pai, Ruben (Marat Descartes) não é muito próximo da filha e passa maior parte do tempo acompanhado da mãe, tecendo lã. Quando a idosa morre, a garota se vê obrigada a se aproximar do homem. No longa de Cristiane Oliveira, a filha fica em uma posição ambígua e delicada: ao mesmo tempo que vive sob tutela do pai, que tenta tolher o comportamento da adolescente e mantê-la o máximo de tempo em casa, ela também se torna responsável por ele. As inesperadas obrigações assumidas pela adolescente geram uma série de brigas entre os dois.
Inspiração
Segundo Lordello, a ideia de abordar diferentes períodos da vida em uma série de quatro filmes teve como inspiração o personagem Antoine Doinel, protagonista de cinco filmes dirigidos por François Truffaut ao longo de 20 anos. Interpretado por Jean-Pierre Léaud, Doinel era uma espécie de alterego do diretor e tem a vida contada em diversos períodos marcantes, como a infância na escola, a transição da adolescência para a maioridade e crises conjugais, entre outros. O primeiro título dessa saga é Os incompreendidos (1959) e o último é O amor em fuga (1979). Ao contrário de Truffaut, Lordello vai explorar as faixas etárias sob a ótica de diferentes personagens.