Pernambuco animado Mostra de cinema leva ao interior uma programação cheia de debates e sessões para comemorar o legado da animação pernambucana

Allan Lopes

Publicação: 07/05/2024 03:00

Com pouco mais de cinco décadas, a história do cinema animado em Pernambuco ainda não foi completamente desvendada. A ausência de registros é um dos empecilhos no resgate da memória da produção audiovisual local. Visando aprofundar o debate, a mostra “50 anos da Animação em Pernambuco” irá refletir sobre o legado e os novos desafios da cena local até o próximo dia 17. A programação é composta por uma sessão especial com 13 filmes que ajudam a contar a história e evolução da animação pernambucana, seguida por um debate com pesquisadores e cineastas. A entrada é gratuita, mediante a capacidade dos locais.

Em curso desde o último dia 30, quando esteve no Recife, a mostra itinerante continua em três cidades do interior: Petrolina (11/05), no Espaço Cultural Janela 353, às 18h; Garanhuns (16/05) no Centro de Produção Cultural do SESC, às 19h; e finaliza em Triunfo (17/05), no Cine Teatro Guarany, às 14h. A interiorização do festival visa contemplar populações que não costumam participar de eventos realizados na Região Metropolitana. “Pensamos que seria interessante expandir a mostra para o interior também, em vez de se limitar apenas à região metropolitana, e possibilitar que pessoas de todas as regiões do estado participem”, explica Marcos Buccini, pesquisador, cineasta e coordenador geral da mostra.

Considerado o marco inicial da animação em Pernambuco, o curta-metragem Vendo/Ouvindo (1972), criado por Lula Gonzaga e Fernando Spencer, faz parte das obras exibidas. “Pernambuco tem muito mais a oferecer do que essa seleção de 90 minutos. Seria possível preencher facilmente quatro horas com filmes primorosos. Este é apenas um aperitivo do que foi realizado no estado até o momento”, comenta Buccini. A filmografia da mostra também apresenta: A Saga da Asa Branca (1980); SomoS SomoS (2005); A Morte do Rei de Barro (2005), Até o Sol Raiá (2007), O Jumento Santo e a Cidade que Acabou Antes de Começar (2007), Voltage (2008), As Aventuras de Paulo Bruscky (2010); Visceral (2012); Deixem Diana em Paz (2013), O Ex-mágico (2016), Guaxuma (2018); e Um Peixe para Dois (2019).

Frente ao amplo debate sobre o cinema nacional, a animação raramente é contemplada. Conforme Buccini, a negligência envolve profissionais do audiovisual. “Sem dúvida, a animação ainda é vista por muitas pessoas do meio audiovisual como um cinema de menor importância”. Segundo ele, a influência dos filmes da Disney colabora para a percepção infantilizada da animação. “A partir de filmes da Disney e dos cartoons americanos, há uma percepção de que a animação é principalmente uma forma de arte voltada para o público infantil, o que não é verdade. A animação tem suas raízes profundamente ligadas às artes plásticas”. Uma vez que há filmes destinados a adultos e crianças, cada sessão da mostra será ajustada de acordo com o perfil do público.

Apesar de surgir após o cinema live-action, a animação pernambucana tem alcançado reconhecimento pela qualidade de suas produções. A filmografia animada do estado teve dois momentos marcantes: o primeiro durante o Ciclo do Super-8, com 13 obras de destaque, como Vendo/Ouvindo, A Saga da Asa Branca e Cotidiano (1980). O segundo boom veio com a popularização de computadores e softwares de animação nos anos 2000, abrindo caminho para uma nova geração de animadores. Com o surgimento de festivais e mostras locais dedicadas à indústria, a exemplo de Animage, Brasil Stop-Motion e Animacine, as produtoras pernambucanas se consolidaram entre as principais agentes da animação brasileira.

“Estamos vivendo um bom momento em Pernambuco. Temos bons profissionais e cada vez mais pessoas estão sendo formadas. Além disso, há perspectivas interessantes de trabalhar online com pessoas de outras regiões. Então, acredito que as produtoras locais estão passando por um momento de crescimento”, aponta o pesquisador e cineasta. Mundo Bita, fenômeno infantil no Brasil e na América Latina, é um projeto desenvolvido pela agência pernambucana Mr. Plot. Um exemplo mais recente é o curta-metragem animado A menina e o pote, criado pela pernambucana Valentina Homem, cujo enredo apresenta um mundo distópico, onde uma garota quebra seu pote de cerâmica que guardava um segredo.

Por outro lado, Marcos Buccini lamenta as consequências em nível nacional do desmantelamento do setor audiovisual durante o governo de Jair Bolsonaro.

“Houve uma ausência de editais e uma não liberação dos recursos de editais que já haviam sido conquistados por alguns realizadores. Isso resultou em quatro anos em que muitos estavam basicamente vivendo de migalhas e colhendo os frutos do que havia sido estabelecido anteriormente. Em outras palavras, os filmes que foram lançados durante o governo Bolsonaro foram aqueles que as pessoas já estavam produzindo antes”. Com a recriação do Ministério da Cultura e reestruturação do Funcultura, ele demonstra confiança no futuro. “A perspectiva é que as coisas voltem a crescer”.