3 perguntas // Kemla Baptista Contadora de histórias, pedagoga e empreendedora social criadora do canal Caçando Estórias

Publicação: 01/06/2019 03:00

Por que é preciso desenvolver um olhar mais atento para as múltiplas infâncias?
Há uma realidade de diferenciações. Uma criança branca numa escola de classe média ou até de subúrbio recebe carinho, é idolatrada. Já uma criança preta nesses espaços de sociabilidade da infância não recebe o mesmo tratamento. Dizer, por exemplo, que o cabelo dela é difícil de pentear, indomável, já é uma agressão. Desde muito cedo, essa criança lida com situações de racismo, violência física e emocional.

Quando se fala de múltiplas infâncias, do que estamos falando?
Das famílias de crianças adotivas, das famílias inter-raciais, etc. A gente vive, por exemplo, o dilaceramento das relações familiares derivadas da estrutura de racismo na qual vivemos. Não pensamos disso quando falamos de primeira infância. Como é que você vai falar de autoestima para um pai branco que tem uma filha negra e a sociedade desconfia dessa paternidade? Como fica a construção de masculinidade de um garoto que vê o pai encarcerado? E a criança de religião de matriz africana, que tem o pleno exercício religioso cerceado? É necessário um olhar atento e vigilante a essa diversidade na infância. Não podemos construir uma geração futura com ódio e afastamento.

Qual o impacto da falta de representatividade na infância?
Durante anos, o que aparecia na mídia e nos espaços de consumo eram brancos e loiros. Isso afeta a construção de identidade infantil. É preciso trazer a pessoa negra sem estereotipar, animalizar. São questões que afetam a construção de afetividade, de autoconfiança da criança.