Carinhosa, do céu vem os filhos salvar Frequentadores do templo recifense dedicado a Fátima celebram milagres que mudaram vidas

Publicação: 13/05/2017 03:00

Ana Lúcia atribuiu a cura do câncer do filho a um milagre de Nossa Senhora de Fátima. Inaugurado em 8 de dezembro de 1935, o santuário do Recife abriu suas portas 18 anos antes do grande templo localizado na cidade portuguesa de Fátima, na Cova da Iria (Thalyta Tavares/Esp.DP | Roberto Ramos/DP)
Ana Lúcia atribuiu a cura do câncer do filho a um milagre de Nossa Senhora de Fátima. Inaugurado em 8 de dezembro de 1935, o santuário do Recife abriu suas portas 18 anos antes do grande templo localizado na cidade portuguesa de Fátima, na Cova da Iria

Milagres para os fiéis que frequentam o Santuário de Nossa Senhora de Fátima, na Boa Vista, não são apenas aqueles que têm a chancela do Vaticano. Apesar da distância de 5.954 quilômetros que separa o Recife de Fátima, em Portugal, a ligação entre os católicos é a mesma. Baseada na fé profunda, eles creditam as graças alcançadas à virgem. Gente que conseguiu se curar de uma doença, conquistou um emprego, formou os filhos, comprou a casa própria ou pagou uma grande dívida.

É preciso ter fé e perseverança. Acreditar que o difícil pode ser transformado em realidade. Foi assim com a comerciante Ana Lúcia Souza Leão, 53, que há um ano viveu o drama da descoberta de um câncer raro no seu filho mais velho, Pedro Souza Leão, 21. Em 1º de abril de 2016, o universitário teve o diagnóstico de um linfoma de Hodgkin, doença que se origina nos linfonodos (gânglios) do sistema linfático. “Ele tinha um tumor de 8,7 centímetros entre o mediastino e o pulmão, que não podia operar. Fiquei muito nervosa quando recebi a notícia, mas me agarrei à santa. Atribuo a sua cura a Nossa Senhora de Fátima”, disse.

Na semana em que Pedro foi diagnosticado com a doença, uma amiga a procurou perguntando se ela poderia receber em sua residência a visita dos Arautos do Evangelho, grupo católico que atua em mais 50 países. “Eles levaram a imagem de Fátima para minha casa, e meu filho coroou a santa. Ficamos muito emocionados”, lembrou.

Pedro foi submetido a tratamento, mas aliado aos cuidados médicos, a família nunca deixou de rezar. Pedia sua cura à virgem de Fátima. Assim, em 13 de abril deste ano, após sessões de quimioterapia, ele realizou novos testes para mapear a doença e o resultado do pet scan (exame de imagem que utiliza uma substância radioativa para rastrear células tumorais no organismo) foi regressivo.

“Eu recebi o envelope do exame e deixei na médica com medo de abrir. Fui direto para o santuário orar. Chorei bastante, no outro dia de manhã, a médica ligou avisando que Pedrinho estava curado. Só posso dizer que teve as mãos de Nossa Senhora. Foi ela quem trouxe a saúde do meu filho de volta”, afirmou Ana Lúcia, que toda semana vai à missa no santuário.

A coordenadora pedagógica Maria Helena da Rocha Bezerra Pinton, 49, também testemunha graça alcançada junto a Nossa Senhora de Fátima. Com dificuldades sérias para engravidar devido a uma endometriose, ela deu à luz a seu único filho, após quase dez anos de tentativas. Hoje, Gabriel está com 12 anos. “Foi uma dádiva. Pedi muito a Fátima e ela me atendeu. Fiz promessa, fui até o santuário em Portugal, quando meu filho completou dez anos”, falou.

Mais antiga fiel do santuário recifense de Fátima, Severina Ferreira de Arruda, conhecida como dona Nina, 79 anos, diz que deve a educação dos filhos a um milagre da santa. Viúva, moradora da Rua Oliveira Lima, ela lembra que pedia para entrar na igreja, mesmo fechada, para ficar orando. “Me ajoelhava diante do altar com todas as portas trancadas. Olhava para os olhos da virgem e pedia muito pelos meus cinco filhos pequenos. Queria que eles tivessem boa educação e se formassem. Graça que alcancei. Tenho filhos médicos, dentistas e engenheiros”, contou dona Nina.

O reitor do santuário, padre Antônio Mota, diz que o milagre não é o fim, mas sim o meio para transformar as pessoas. O maior milagre é a vida, um dom presente, aquilo que é dado gratuitamente e não é valorizado”, diz. O religioso lembrou que Jesus costumava dizer os seus discípulos: “a tua fé, te salvou”. “Não se deve confundir milagre com mágica. É preciso que se arranque a fé de cada um de nós, assim conseguiremos a superação”.

Padre Damião Silva também acredita que o milagre acontece mediante a fé de cada um. Para o religioso, não há dúvidas de que a fé é o combustível que impulsiona e faz o impossível acontecer.

“Um encontro com Deus”

As aparições de Nossa Senhora por si só não resolvem a fé, mas servem como um encontro com Deus para fazer lembrar as mensagens encontradas no evangelho. As palavras são do conselheiro do papa Francisco e reitor da Pontifícia Faculdade de Teologia Marianum, em Roma, Salvatore Perrella, que participou no Recife do Simpósio Internacional de Mariologia, na Universidade Católica de Pernambuco.

Mariologia é a ciência que estuda a mãe de Jesus. Pesquisador com mais de 25 livros publicados sobre o tema, Perrella disse que as aparições são como um dom para a fé por fazer recordar-se de Deus. A Igreja Católica aprovou apenas 12 aparições de Maria no mundo todo em um período de 100 anos. O processo de verificação passa por critérios severos e demorados antes de ser afirmada a credibilidade dos acontecimentos narrados pelos fiéis.

“Os eventos que se dizem sobrenaturais não são ao acaso. Esses são fatos da fé, mas que fazem parte da história. E como é possível acreditar hoje em dia? Existem diversas formas. De acordo com a Igreja, as aparições são um encontro do Senhor com seus filhos e filhas para que possam, nesse místico encontro, realizar o Ágape, a comunhão e caridade”, explicou. (Mariana Fabrício)

Patrimônio recifense tombado que une arte e fé

O santuário de Nossa Senhora Fátima, no bairro da Boa Vista, preserva a história. Lá, estão guardados os restos mortais de 47 padres jesuítas, entre os quais os do padre José Aparício, confessor da vidente Lúcia Santos, conhecida como Irmã Lúcia de Fátima. Ela foi uma das três crianças pastorinhas que testemunhou as aparições em Portugal em 1917.

O Santuário de Fátima foi o primeiro do país dedicado à Virgem. Em 2000, a igreja foi tombada pela Fundação do Patrimônio Artistico de Cultural de Pernambuco (Fundarpe). Inaugurado em 8 de dezembro de 1935, o santuário do Recife abriu suas portas 18 anos antes do templo localizado na cidade de Fátima, na Cova da Iria.

Sua construção teve início em 15 de outubro de 1933 e as obras concluídas em 8 de setembro de 1935. Erguido com a ajuda da colônia portuguesa e pelo jesuíta português Domingos Gomes, a edificação tem projeto arquitetônico do francês George Mounier, um dos fundadores do curso de arquitetura na Escola de Belas Artes do Recife, em 1932.

O piso de toda igreja é de mosaicos multicolores com figuras que representam a azinheira, árvore sobre a qual Nossa Senhora aparecia aos pastores. Os detalhes foram desenhados pelo padre Antônio Simas, professor de desenho e artes do Colégio Nóbrega.

O projeto tem formas arrojadas. Sua nave tem formato de cruz com 26 metros de altura por 14 metros de largura, única no país desse tamanho. A torre tem 56 metros. Na entrada principal da igreja, encontram-se pilares de sustentação de uma torre com 50 metros de altura, tendo suas paredes laterais em forma de cruzes, fechadas por vitrais. No altar, uma estátua da virgem do Rosário que mede três metros de altura. A imagem foi produzida pelo artista português Antonio da Paz.