A solidariedade ultrapassa fronteiras Primeira missionária africana trazida pela Obra de Maria ao Brasil arrecada alimentos para carentes

Marcionila Teixeira
marcionila.teixeira@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 14/10/2017 03:00

Há dez anos, a pedagoga africana Assiba Prisca Agon, 44 anos, deixou o Benim, república de 10 milhões de habitantes na região ocidental da África, para ajudar os mais pobres no Brasil. No dia do embarque, carregava uma bagagem imaginária repleta de expectativas sobre a nova jornada. Prisca, como é conhecida, é a primeira missionária africana da Comunidade Obra de Maria a vir para o país. Seu protagonismo terminou inspirando outros conterrâneos a embarcarem na mesma missão. Atualmente, cerca de 300 africanos atuam no Brasil, pela comunidade, estando 20 deles em Pernambuco.

A pedagoga põe um largo sorriso no rosto e, toda sexta-feira, lidera uma equipe com mais de uma dezena de voluntários para coletar alimentos doados. O destino é o Centro de Abastecimento e Logística de Pernambuco (Ceasa/PE), no Curado. O grupo chega cedo em meio aos corredores já repletos de gente que busca aquisições mais em conta. São 5h e homens e mulheres do grupo de Prisca já se dividiram para arrecadar os produtos alimentícios. “Os comerciantes doam frutas, verduras e raízes, principalmente”, conta a missionária.

Já perto do meio-dia, a pedagoga e os demais voluntários começam a recolher as doações reunidas em quatro pontos do Ceasa para colocá-las em um caminhão com destino à Obra de Maria. De lá, os alimentos seguirão para quem tem fome. “Doamos ao pessoal de um assentamento localizado entre Paudalho e São Lourenço da Mata; aos meninos e meninas da Creche Mãezinha do Céu, em Jaboatão dos Guararapes; aos missionários e funcionários da Obra de Maria e aos estudantes”, conta. Prisca não sabe calcular a quantidade de doações arrecadadas a cada sexta-feira. Sabe apenas que consegue encher um caminhão.

Lílian Mendonça, 25, é de Guiné Bissau, país africano que tem o português como língua oficial (no Benim se fala francês) e pertence ao mesmo grupo de voluntários de Prisca. Ela conta que quando a conterrânea não está, o trabalho de coleta de alimentos não é tão fácil. “Ela tem um jeito que cativa as pessoas. Conseguimos muito mais doações.” A beninense ri alto ao escutar a amiga e arrisca um palpite para justificar seu desempenho. “Primeiro eu cumprimento as pessoas, dou atenção a elas. Mas o que tem de melhor é Deus. O que faço é apenas um meio de evangelização, acolhimento, atenção e paz. Eles confiam muito em nosso trabalho”, reflete.

Dia desses, a esposa de um comerciante pediu ao marido para conseguir o número de telefone de Prisca, pois andava doente e sem disposição. “Ela vinha ao Ceasa, mas deixou de vir. Quando me ligou, a recebi com muita alegria. Acho que as pessoas terminam amparadas psicologicamente com a oração. Muitos têm uma vida sofrida”, diz a missionária.

Corrente do bem
Maria Rodrigues Góes, 47, tem comércio no Ceasa há 23 anos. Toda sexta-feira, costuma contribuir com os missionários. “Conheci a Obra de Maria na época da morte de meu sogro. Me apaixonei pelo lugar e quis até morar lá. Sempre achei que eles se identificam mais com as pessoas carentes. Ouvi várias vezes de frei Damião de Bozzano que ele não era santo, e as pessoas é que eram carentes. Costumo doar batata, cebola e lhe digo: não faz falta. Ao contrário. Para mim as coisas melhoraram”, garante. Prisca, diz a comerciante, se identifica com o povo. “Ela é alegre, faz festa, tenta adivinhar a mente das pessoas.”

Prisca pertence a uma família católica de nove filhos. O irmão mais novo da africana, inclusive, está em Belém de Maria, a 120 km do Recife, onde vai ser ordenado padre. A pedagoga foi convidada pelo fundador da Obra de Maria, o psicanalista Gilberto Gomes Barbosa, para viajar ao Brasil como missionária. “Nossa família adotou, desde o início, a Igreja Católica no seio materno. Conheci Gilberto na Costa do Marfim. Então, ele disse para mim: ‘você nasceu para participar da Obra de Maria’. Achei meio doido aquilo porque ele nem me conhecia e disse isso. Depois descobri que era uma profecia da parte dele. Hoje sei que estou em meu lugar.” Prisca conta que tem um desejo posto em prática há dez anos no Brasil, todos os dias: levar o evangelho a todo povo, sem distinção de raça, religião ou cultura. “Por meio do que sou, tenho e acredito.”

Números

A Obra de Maria é representada por:

  • 2.620 membros
  • 236 paróquias
  • 76 dioceses
  • 17 países têm a presença da comunidade
  • 2,8 mil missionários integram o projeto
  • 690 voluntários trabalham na Obra
Principais projetos sociais:

Casa Sagrada Família

Recuperação para dependentes químicos através do trabalho, oração, lazer e atendimento
psicológico e social a famílias carentes.

Creche Mãezinha do Céu
Assistência dada a crianças, nas áreas de saúde, educação, alimentação e lazer.

Projeto Cultural e Esportivo
Oficinas de dança, teatro e atividades esportivas para crianças e adolescentes em situação de risco.

Assistência Familiar
Cursos para as mães das crianças e distribuição diária gratuita de sopa e pão a diversas famílias carentes.

Posto Assistencial Pe. Pio
Atendimento psicológico dado aos jovens assistidos nos projetos da Obra e à comunidade carente local, entre outros necessitados, que procuram a entidade.

Centros de Evangelização
Realização de encontros, retiros, congressos espirituais e grupos de oração.

Projeto dos Cenáculos
Evangelização porta a porta, que atualmente atinge cerca de 100 mil pessoas, levando as famílias a terem uma experiência de fé, com o Cristo Ressuscitado.