Usucapião em cartório

Silvio Neves Baptista
Advogado e professor de Direito Civil

Publicação: 09/09/2017 03:00

A usucapião constitui uma das formas de aquisição da propriedade ou de outros reais pela posse prolongada de um bem móvel ou imóvel. A posse usucapível há de ser pacífica, contínua pelo tempo que a lei estabelece, justa (ou seja, sem violência, clandestinidade ou precariedade), e, em regra, com um título ou documento que a justifique.

O direito brasileiro admite as seguintes modalidades de usucapião de imóveis, cada qual com os seus próprios requisitos: a usucapião extraordinária (CC art. 1238); a ordinária (CC art. 1.242); especial rural (CF art. 198); especial urbano (CF art. 183); usucapião por abandono do lar conjugal (CC art. 1.240-A); usucapião indígena (Lei 6.001/73, art. 33); e a usucapião coletiva (Lei 10.257/ 2001 art. 10).

No Código de Processo Civil de 1973 as ações de usucapião de terras particulares eram contempladas com um procedimento especial, mas o Código de Processo de 2015 retirou o procedimento específico dessas ações, caindo assim na vala do rito comum (arts. 318 e seguintes).

Entretanto, o art. 1.071do novo CPC acrescentou o art. 216-A à Lei do Registro Público (Lei 6.015/73) para admitir o pedido de reconhecimento extrajudicial da usucapião, a ser processado perante o cartório de registro de imóveis da comarca em que estiver localizado o imóvel. Para isso, o procedimento da usucapião extrajudicial terá de passar obrigatoriamente por duas etapas distintas : a primeira, junto ao Tabelionato, para a lavratura da ata notarial; a segunda, perante o registro de imóveis.

No primeiro momento, o interessado deverá reunir a documentação necessária para a lavratura da ata notarial, que deverá conter a descrição do bem com as suas benfeitorias, a prova do tempo de posse e da cadeia  sucessória, o justo título, a indicação dos confinantes, e sobretudo a indispensável anuência do titular do domínio e dos demais direitos reais, se houver, pois a modalidade extrajudicial da usucapião é necessariamente consensual.  

Em seguida, uma vez lavrada a ata notarial, o requerente, através de advogado, processará o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião junto ao cartório do registro de imóveis da comarca onde se acha situado o imóvel. Nesse requerimento, além da ata notarial do Tabelião,  o possuidor deverá juntar a planta e memorial descritivo assinados por profissional habilitado e pelos titulares de direitos reais; as certidões negativas dos distribuidores do foro da localidade do imóvel e do domicílio do requerente, e bem assim o título que demonstre a origem, o tempo e a natureza da posse.

Autuado o pedido, o oficial do registro dará ciência  à União, ao Estado e ao Município para que se manifestem no prazo de 15 dias, inclusive com publicações de editais, na forma da lei, para conhecimento de terceiros interessados, também pelo prazo de 15 dias.

Por fim, estando em ordem a documentação e transcorridos os prazos legais para manifestação dos eventuais interessados, o oficial do cartório do registro de imóveis registrará a aquisição do bem em nome do possuidor, podendo abrir matrícula, conforme prevê o § 6º do art. 216-A da citada Lei de Registro Público.