DP+SAúDE » Celular demais causa compulsão e dependência Medo de ficar sem o aparelho pode se transformar em fobia e, consequentemente, pode acarretar em uma série de fatores prejudiciais na vida da pessoa

Larissa Ferreira
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Publicação: 06/12/2021 03:00

A nomofobia, também popularmente conhecida como síndrome da dependência digital, trata-se de uma fobia que parte do medo irracional, do indivíduo, de ficar sem seu celular, e que tem se desenvolvido ao redor de todo o mundo. Esse medo, que posteriormente se transforma em uma fobia, surge do uso excessivo dessas tecnologias, e consequentemente pode acarretar em uma série de fatores prejudiciais na vida da pessoa que está inserida nesse contexto de compulsão e posterior dependência.

A médica psiquiatra do Hospital das Clínicas (HC – UFPE), Isabela Pina, comenta sobre o significado do termo e quais principais sintomas são característicos da nomofobia. “O termo vem do inglês ‘no mobile’ (sem celular ou, de forma mais ampla, sem tecnologia) e fobia (medo), e é usado para descrever uma ansiedade ou medo de ficar sem o celular e sem o acesso à tecnologia, podendo gerar uma grande angústia. Os sintomas são basicamente relacionados com a ansiedade, através da inquietação, apreensão e tristeza, caso precise se ficar sem o aparelho, podendo levar a quadros de irritabilidade, medo, angústia e até a crises de ansiedade, com sintomas físicos intensos, sendo estes: falta de ar, tontura, tremores, náuseas, taquicardia, entre outros”.

A fobia relacionada ao uso dos smartphones pode ser caracterizada como uma compulsão que pode afetar a autonomia do indivíduo, levando a um vício. O psicólogo clínico André Souza, que atende no espaço integrado de terapias ATMA, no Poço da Panela, explica como se procedem os hábitos relacionados ao vício. “Esse comportamento repetido dispara mecanismos de recompensa, como a sensação do like, onde a partir de uma publicação feita pela pessoa, e os likes que aquela publicação rendem, trazem uma certa. O ‘fazer bem’, das curtidas, é exatamente um processo bioquímico que está se desenvolvendo no sistema nervoso central do indivíduo. Essa satisfação, feita com pouco gasto de energia, por serem movimentos feitos apenas com os dedos, ativa nosso sistema de recompensa e nos deixa condicionados a repetir essa recompensa, visto que em nosso sistema nervoso existe um efeito rebote. A nomofobia se guia não apenas pelo prazer despertado do ato, mas também do medo de não ser curtido, ou não ser o primeiro a saber das devidas informações”, afirma.

Alguns sinais indicam o excesso de exposição às telas.

Isabela explica que trazer o celular para momentos de descanso, como dormir ao lado dele, é um dos primeiros indícios de que a relação está se tornando tóxica. “As pessoas podem perceber que estão perdendo controle de sua relação com o celular através de alguns comportamentos, como: manter o celular ligado 24h por dia, com recebimento de ligações e de notificações, dormir com o celular próximo ou até mesmo embaixo do travesseiro, acordar durante a noite para checar o aparelho, minimizar o risco de ficar sem bateria ou checando o tempo inteiro o nível da bateria, sensação de inquietação e desconforto caso esteja em algum local sem área no celular ou sem conexão, entre diversos outros indicativos. Também é importante observar as críticas que as pessoas ao redor podem fazer, como queixas de que a pessoa não dá atenção às conversas ou com distrações durante o trabalho, reduzindo a produtividade e as interações físicas”.

CRIANÇAS
Dentro do aspecto da nomofobia, observa-se que o debate sobre o vício dos aparelhos telefônicos, especificamente em crianças, vem se tornando cada vez mais comum. “No caso das crianças, a nomofobia se torna algo ainda mais grave, visto que, na primeira fase da vida, o sistema nervoso ainda está em desenvolvimento, o que está diretamente relacionado com o movimento. Então, a criança que não se move tem que ser observada com muito cuidado, porque é um desenvolvimento potencial que não está acontecendo no momento que deveria”, expõe André Souza.

Ainda no que diz respeito à intensa interação das crianças com os telefones, a psiquiatra Isabela Pina reforça que a exposição em níveis cada vez mais elevados pode prejudicar o desenvolvimento de habilidades sociais. “Cada vez mais cedo as crianças são expostas ao mundo digital e ainda não temos total conhecimento sobre os prejuízos que isso pode gerar no neurodesenvolvimento dessas crianças. Nessa fase, é muito importante que elas tenham interações sociais com outras pessoas, para melhor desenvolvimento da linguagem, da fala e das habilidades sociais. O contato com celulares e telas é feito de forma mais solitária, sedentária e, ainda por cima, de forma passiva, podendo prejudicar o brincar e imaginar da criança”.

Se faz importante observar também que a nomofobia não está relacionada apenas a tecnologia em si, mas principalmente na forma de utilização, e até mesmo desenvolvimento pessoal que se é estabelecido com os aparelhos, visto que os mesmos estão inseridos de forma ampla em nosso cotidiano. “Essa motivação direcionada apenas para o celular não dá espaço para que o indivíduo socialize, estude, desenvolva sua produtividade, trabalhe, se relacione e se desenvolva nas demais áreas. Esse isolamento e baixa socialização leva a uma ansiedade que pode se desenvolver para um medo irracional, se transformando na fobia. É importante monitorar sempre o tempo de tela, de uso do celular, e ter uma consciência como fazer uma saudável utilização desses aparelhos. Deve se preencher o dia com outras atividades, sendo estas físicas, como um grupo de corrida, dança, leitura, entre outros exemplos, que permitam uma maior socialização”, conclui André Souza.