Nordeste reage contra a importação de álcool Entidades se mobilizam para reverter decisão do governo Bolsonaro de isentar imposto para os EUA

Publicação: 17/09/2019 03:00

O setor de açúcar e álcool do Nordeste tratou de se mobilizar assim que foi informado sobre a decisão do governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) de facilitar a vida dos produtores de etanol dos Estados Unidos. O Brasil cedeu e atendeu a um pedido do republicano Donald Trump para não apenas prorrogar por mais 12 meses a compra de álcool anidro, obtido a partir do milho, sem a cobrança de imposto de importação, de 20%, mas também aumentou a cota livre do tributo, de 600 milhões de litros para 750 milhões.

Passadas quase duas semanas desde o anúncio da medida, a inquietação de parte do setor quanto ao que considera ser uma decisão prejudicial aos produtores de cana-de-açúcar e usinas só aumentou. Tanto que, agora, o assunto extrapolou o debate entre entidades e representantes do governo e chegou ao Congresso. Hoje, às 17h, representantes dos plantadores de cana-de-açúcar e das usinas vão se reunir com o líder do governo na Câmara Federal, Major Vitor Hugo (PSL-GO), e outras lideranças políticas para discutir como minimizar os efeitos dessa concessão. Além de representantes da Agricultura, Economia e Relações Exteriores, vão participar a Federação dos Plantadores de Cana do Brasil (Feplana), que tem associados de 13 estados, com maior peso para os do Nordeste, e a Associação dos Produtores de Açúcar e Bioenergia (Novabio), formada há cerca de cinco meses, a partir de um movimento de articulação dos Sindicatos de Produtores da Indústria do Açúcar e do Álcool das regiões Norte e Nordeste.

Para os presidentes das duas entidades, os produtores do Nordeste serão os mais afetados pelo aumento da importação de etanol norte-americano livre de imposto. O setor vinha de dois anos de acordo com os EUA. A portaria anterior venceu em 31 de agosto, depois de 24 meses. Agora, serão mais 12 meses de benefício tributário para os EUA.

Por questões logísticas, a maior parte dessa cota de álcool vindo dos EUA é desembarcada nos portos do Nordeste e abastece a região. Alexandre Andrade Lima, presidente da Feplana, critica a decisão do governo. Na sua avaliação, “a medida deveria ter vindo acompanhada de uma contrapartida para beneficiar o açúcar brasileiro naquele país, onde enfrenta o regime de cotas que torna o produto nacional pouco atrativo”.

Negociações
A União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), que representa o setor no Centro-Sul e, portanto, tem uma base bem maior do que a das regiões Norte e Nordeste, também não confirmou se vai participar da reunião da próxima semana. Informou, por meio de nota, que avalia o aumento da cota de importação como uma “grande vitória do governo brasileiro, liderada pelo Ministério da Agricultura, com o respaldo do presidente Bolsonaro”. No entanto, apesar de festejar a medida pró-EUA, a Unica argumenta que faltou incluir a contrapartida para o açúcar brasileiro nesse acerto com Trump.

Mas, diferentemente do que diz a Unica, tanto os representantes da Feplana quanto da Novabio acreditam que a pasta liderada por Tereza Cristina (DEM) não participou das negociações com o governo Trump. “A ministra trabalhou bastante (contra a renovação do acordo), mas foi atropelada”, afirma o presidente da Feplana, que também preside a câmara setorial dessa área no Ministério da Agricultura.

Diante da derrota de Tereza Cristina, representantes do setor na região Nordeste trataram de buscar ajuda em suas bancadas na Câmara e no Senado. Com isso, conseguiram que fosse apresentada na Câmara, na última terça-feira, a urgência do projeto de decreto legislativo, assinado por Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), para sustar a decisão do governo de aumentar a cota para importações anuais de etanol dos EUA sem tarifa.

Falta apreciar o mérito do projeto para que ele possa ser colocado em votação. Segundo Lima, essa foi a estratégia para manter as negociações com o governo. “Esse etanol chega em plena safra do Nordeste, uma região com problemas de topografia acidentada e com uma série de particularidades. Boa parte desse etanol, cerca de 90%, vai para o Nordeste”, reclama o líder da Feplana. Na sua avaliação, nesse acordo faltou a contrapartida da abertura do mercado para o açúcar brasileiro, um tema que vem sendo tratado há tempos, segundo o presidente da Feplana, com o novo governo. (Do Correio Braziliense)