Prêmio de consolação

Vladimir Souza Carvalho
Magistrado
vladimirsc@trf5.jus.br

Publicação: 15/06/2015 03:00

Oaviso, antes uma ameaça, teve ensejo a muitas luas atrás. Acho que há uns trinta anos. Coloco o fato na mesa. Ameaça de ficar careca. Da parte do barbeiro, ressalte-se, tesoura na mão, a aparar o então capinzal na parte superior da cabeça. Admito que não quebrei nenhum prato. Mas, fiquei de tocaia toda vez que me sentava, como me sento, em inúmeras cadeiras de barbearia, em diversas plagas deste imenso país, nestes anos que já se passaram, sempre atento a novos e possíveis avisos de igual teor e tenebroso terror.

Pois sim. Um dia desse, vi um retrato meu, de costas, eu caminhando, e fiquei estupefato com a paisagem colhida. De lado, um pouco acima da orelha, para baixo, o capinzal presente. Subindo, onde poderíamos chamar de praça, o quase vazio, como se tivessem colhido quase todo o milharal, deixando, aqui e ali, uma pequena e minúscula toiceira. Não tive outra conduta senão parar para, cotejando a foto, me lembrar do sinistro comunicado e de fatos posteriores, o cabelo, lá em cima, ficando escasso, a ponto de, uma vez, descendo em Petrolina, da aeronave até a sala de desembarque, às 15 hs, mais ou menos, em época de verão, o sol, na cabeça, ter sido suficiente para, à noite, ao passar a escova no cabelo, sentir alguma dor. Essa semana, depois de cortado o cabelo, ao lavar a cabeça, me deparei com a drástica realidade de já está mais para lá do que para cá, ou seja, de poder pedir inscrição em qualquer agremiação que congregue os carecas. Me lembrei de vovô Zeca, nos últimos anos de vida, sem sair de casa, o barbeiro indo até lá para cortar seu cabelo, e, ele, na defensiva, pagando só metade do preço porque era careca e quase não tinha cabelo. Na saída, o barbeiro recebia de vovó o restante do preço, fato que vovô nunca tomou conhecimento.

Entonce, vi a realidade que se avizinha, na colocação de um chapéu, hoje tão sem uso, para proteger a cabeça do sol, quando tiver de enfrentá-lo. O anjo de guarda, feliz, por me alertar para algo que, até então, não tinha me vindo à mente. A marcha de carnaval, na defesa de que é dos carecas que as mulheres gostam mais. Não agradeci, considerando pura gozação, verdadeiro prêmio de consolação. Dei o silêncio como resposta. O olhar feio. A cara amarrada.