Viva o São João!

Marly Mota
Escritora
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Publicação: 20/06/2015 03:00

Neste mês de junho, a chuva esparsa brinca de esconde esconde com o sol que se muda da varanda da sala, á janela do quarto do oitão, de onde se tem uma vista de além- serras e da praça, embandeirada, para os festejos juninos. Festividade antiga no Nordeste do Brasil, vem das origens da crença que nos comunicaram os povoados portugueses, mencionados no ano de 1627 por Frei Vicente do Salvador, brasileiro que seguiu para Coimbra onde se doutorou em Direito Civil e Canônico.
Nenhuma tradição é mais querida no nordeste, especialmente em Pernambuco, do que a festa de São João. Na Praça, em Bom Jardim, dentro dessa corrente de fervor religioso e profano, uma multidão de pessoas se divertia em torno do coreto, ouvindo e dançando, com a música de Luiz Gonzaga nos foles dos sanfoneiros. Outros tiravam a sorte nas barracas, assistindo o subir dos balões, o estampidos dos fogos. A quermesse com prendas doadas pelas famílias do lugar, em beneficio da Matriz, tendo o popular Zé Orobó como leiloeiro, gritando: Quem dá mais ?. No tablado, o Pastoril de Aurora pronto para as jornadas com a formação dos cordões: O Encarnado com a Mestra e o azul com a contramestra. O Velho palhaço usava enorme fraque, colarinho duro, extravagante gravata, chapéu de palhinha. Era o comunicador entre o povo e o espetáculo, com o leilão de cravos que enfeitavam os vestidos e cabelos, das pastoras. As fogueiras queimava em frente as casas e a meninada feliz soltava “estrelinhas,” “pistolas,” “bombinhas” sob a mira dos mais velhos. Quando as brasas não mais soltavam labaredas, começava a brincadeira: “São João dormiu / São Pedro acordou / Vamos ser compadres” que São João mandou. Tantas comadres! Que hoje dormem profundamente, como no poema de Manuel Bandeira.
Em casa, familiares e amigos vindos de fora se deliciavam com a culinária cíclica, servida em vasta mesa. No clima de animação, a quadrilha , marcada por Chico da Farmácia em péssimo francês, entrava pela madrugada. Na cidade todo mundo era parente e o namoro entre primos era breve e cheio de traições. Do Pastoril de Aurora, chegava até nós a última jornada do adeus das pastoras. Euclides da Cunha recorda: (...) divertimentos anacrônicos que os povoados sertanejos reproduzem intactos com os mesmos programas de há três séculos. Escreve Mauro Mota, em sua coluna, Agenda – Diário de Pernambuco, junho de 1972: A descrição é tão viva e atual que tira o anacronismo dos divertimentos. Os mesmos programas continuam.
E viva, São João!