José Paulo Cavalcanti Filho
Jurista e membro da Academia Pernambucana de Letras
Publicação: 23/09/2016 03:00
A presença do Brasil, na vida e na obra de Fernando Pessoa, é fragmentária. E contraditória. Reconhece a importância de nosso país, é certo: Tanto quanto hoje podemos ver, há, de origem europeia, só duas nações fora da Europa com alma para poder ter império – os Estados Unidos e o Brasil (“Portugal, vasto império” – inquérito). Enquanto ao mesmo tempo nos dedica, no seu “Ultimatum”, palavras bem pouco lisonjeiras: E tu, Brasil, “república irmã”, blague de Pedro Álvares Cabral, que nem te queria descobrir! Em Carta a Eurico de Seabra (de 31/4/1996), como que completa: Sociologicamente, não há Brasil.
Por isso, é mesmo natural que dois heterônimos apareçam ligados a nossa terra. Eduardo Lança, um brasileiro que nasce em Salvador – local inspirado, provavelmente, no padre António Vieira (que alí viveu, sofreu e morreu). Para pessoa, era o Imperador da língua portuguesa. E Ricardo Reis – que, em 12/04/1919, parte para seu exílio no Rio de Janeiro. A escolha da cidade é uma espécie de homenagem ao amigo brasileiro Luis de Montalvor – que, no Rio, foi assessor de outro brasileiro, Bernardino (Luis) Machado (Guimarães), então ministro Pleniportuário de Portugal. O mesmo que foi, depois, presidente de Portugal (em 1915/1917 e 1925/1926). Pessoa deve ter se divertido com isso. Reis em seguida feneceu, pouco a pouco, até deixar de escrever em 13/12/1933. Enquanto Montalvor jogou seu carro, com a família, no Tejo – mas essa é outra história.
Portugal e Brasil estão unidos, na alma de Pessoa, sobretudo em duas vertentes principais. Uma é o Sebastianismo. Ponto de união com o Portugal Novo, que seria nosso Brasil. Pessoa reverencia messiânicos daqui. Celebra, por exemplo, a memória de António Conselheiro, bandido, louco e santo, que no Brasil morreu como um exemplo, com seus companheiros sem se render, batendo-se todos, últimos portugueses, pela esperança do Quinto Império e vindo quando Deus quiser, de el-rei D. Sebastião, nosso senhor, imperador do mundo. Outra vertente é a pátria língua – tanto que Portugal quer dizer o Brasil também. E propõe, ainda, considerar o português como língua literária do mundo. Após o que proclama que Minha pátria é a língua portuguesa.
Por aqui, Pessoa gosta de Machado de Assis – fundador e primeiro presidente da Academia Brasileira de Letras. Tanto que pensa publicar, na sua editora Olisipo, Memórias Póstumas de Brás Cubas. Ficaria no desejo. E também gosta de Cecília Meireles – que no Brasil escreveu, em 1944, os primeiros textos críticos a respeito de sua poesia, na antologia Poetas Novos de Portugal.
Há episódio curioso, com eles. Em fins de 1934, Cecília vai pela primeira vez a Lisboa. Ela e seu primeiro marido, Fernando Correia Dias – que se suicidaria, logo depois, no mesmo mês em que morreria Pessoa. Marcam encontro na Brasileira (do Chiado). Depois de duas horas de espera em vão, retorna para o hotel em que se hospedara – provavelmente o Borges (da Rua Garret). E lá encontra exemplar do livro Mensagem, de Pessoa, dedicado A Cecília Meireles, alto poeta, e a Correa Dias, artista, velho amigo e até cúmplice (vide Águia). Essa Águia é uma revista em que Pessoa escreve, ilustrada por Correia Dias. Junto, bilhete justificando essa ausência. É que, sentindo vibrações mediúnicas, decidira fazer seu horóscopo daquele dia. Nele vendo que os dois eram para não se encontrar. Com Pessoa, tudo é possível. (Continua).
Por isso, é mesmo natural que dois heterônimos apareçam ligados a nossa terra. Eduardo Lança, um brasileiro que nasce em Salvador – local inspirado, provavelmente, no padre António Vieira (que alí viveu, sofreu e morreu). Para pessoa, era o Imperador da língua portuguesa. E Ricardo Reis – que, em 12/04/1919, parte para seu exílio no Rio de Janeiro. A escolha da cidade é uma espécie de homenagem ao amigo brasileiro Luis de Montalvor – que, no Rio, foi assessor de outro brasileiro, Bernardino (Luis) Machado (Guimarães), então ministro Pleniportuário de Portugal. O mesmo que foi, depois, presidente de Portugal (em 1915/1917 e 1925/1926). Pessoa deve ter se divertido com isso. Reis em seguida feneceu, pouco a pouco, até deixar de escrever em 13/12/1933. Enquanto Montalvor jogou seu carro, com a família, no Tejo – mas essa é outra história.
Portugal e Brasil estão unidos, na alma de Pessoa, sobretudo em duas vertentes principais. Uma é o Sebastianismo. Ponto de união com o Portugal Novo, que seria nosso Brasil. Pessoa reverencia messiânicos daqui. Celebra, por exemplo, a memória de António Conselheiro, bandido, louco e santo, que no Brasil morreu como um exemplo, com seus companheiros sem se render, batendo-se todos, últimos portugueses, pela esperança do Quinto Império e vindo quando Deus quiser, de el-rei D. Sebastião, nosso senhor, imperador do mundo. Outra vertente é a pátria língua – tanto que Portugal quer dizer o Brasil também. E propõe, ainda, considerar o português como língua literária do mundo. Após o que proclama que Minha pátria é a língua portuguesa.
Por aqui, Pessoa gosta de Machado de Assis – fundador e primeiro presidente da Academia Brasileira de Letras. Tanto que pensa publicar, na sua editora Olisipo, Memórias Póstumas de Brás Cubas. Ficaria no desejo. E também gosta de Cecília Meireles – que no Brasil escreveu, em 1944, os primeiros textos críticos a respeito de sua poesia, na antologia Poetas Novos de Portugal.
Há episódio curioso, com eles. Em fins de 1934, Cecília vai pela primeira vez a Lisboa. Ela e seu primeiro marido, Fernando Correia Dias – que se suicidaria, logo depois, no mesmo mês em que morreria Pessoa. Marcam encontro na Brasileira (do Chiado). Depois de duas horas de espera em vão, retorna para o hotel em que se hospedara – provavelmente o Borges (da Rua Garret). E lá encontra exemplar do livro Mensagem, de Pessoa, dedicado A Cecília Meireles, alto poeta, e a Correa Dias, artista, velho amigo e até cúmplice (vide Águia). Essa Águia é uma revista em que Pessoa escreve, ilustrada por Correia Dias. Junto, bilhete justificando essa ausência. É que, sentindo vibrações mediúnicas, decidira fazer seu horóscopo daquele dia. Nele vendo que os dois eram para não se encontrar. Com Pessoa, tudo é possível. (Continua).