José Carneiro
Juiz e professor
Publicação: 04/05/2017 03:00
Meu pai era um homem habilidoso. Agropecuarista, sua fazenda Cedro, localizada no município de Custódia, na ribeira do Carvalho, era uma das maiores e melhores da região. Dispunha de currais, chiqueiros, manga, baixio, barreiro, bebedouro, revezo e cacimbas. Ainda hoje um dos seus filhos nela desfruta da parte que lhe coube por herança. Meu pai não fazia distinção entre agricultura e pecuária. Na agricultura cultivava algodão, milho e mamona e, na pecuária, gado bovino, caprino e ovino, pé-duro, por ser uma raça adaptada ao clima e resistente a doenças. Eu, sempre ligado a ele, o ajudava bastante, mormente nos períodos de férias. Entre outras práticas, ferrava, vacinava, castrava, assinalava cabritos e curava bicheiras. A minha disposição pelo trato de gado era tanta que cheguei a campear devidamente vestido de gibão, perneiras, guarda-peito, esporas, chicote, barbicacho e chapéu de couro.
Confesso uma particularidade que me proporcionou muita satisfação. Por um dos cavalos da fazenda eu me afeiçoei. Um árdego alazão que o cognominei de Centauro, inspirado no fabuloso animal mitológico. Houve entre nós dois uma forte identidade. O cavalo em si, para mim, é o animal mais elegante do seu reino em nossa Terra e Centauro em especial, por tê-lo entre os outros como o mais formoso e esperto. Só faltava falar. Ouvia e entendia tudo o que eu lhe dizia. Tinha rasgos de inteligência. Umas vezes parecia rir e outras demonstrava tristeza. Tinha um trote leve e macio. Um cavalo se conhece pelos sinais que tem, assim se classificando: um é bom; dois é melhor; três não presta; quatro é pior; cinco é brinco e seis é rei. Centauro tinha dois sinais, um deles encoberto. Cascos pretos. Crinas do lado direito. Gostava de comer palha de milho verde com boneca, ensopada de mel-de-furo. Batia com um dos cascos dianteiros quando eu dizia: “Centauro velho de guerra” e murchava as orelhas quando eu ralhava com ele.
Empolgado com a vida campestre e me achando capaz propus ao meu pai tomar conta do criatório da fazenda, salientando que mudaria o nome de Cedro para Tirol, região histórica da Áustria, melhoraria a qualidade do rebanho e construiria uma bela casa alpendrada. O velho deu o maior fora e disse que eu iria estudar internamente no colégio onde Ernestinho, filho do prefeito Ernesto Queiroz, estuda em Pesqueira. Você é inteligente e eu quero vê-lo doutor. Lá se foi o meu sonho. Isto mudou o leme do meu destino. Mas, como mudar é renovar, buscando coisas melhores, mudei com esse propósito.
Ao vir de férias, meu pai me disse ter vendido Centauro porque ele havia se transformado completamente, tornando-se um animal inútil. Foi mesmo que me matar. Senti o quanto ele sofreu com a minha ausência e chorei de saudade. Não quis mais saber do Cedro e me dediquei aos estudos. No Recife, concluí o curso de Direito da Universidade Federal e de Licenciatura, em línguas neolatinas, na Universidade Católica. Segui a magistratura e o magistério, sendo por mais de vinte anos consecutivos juiz de Direito de Caruaru e professor de sua faculdade de Direito. Foi um tempo venturoso.
Não esqueço o Cedro e Centauro. Adquiri uma casa em Aldeia, um dos recantos mais aprazíveis do estado, no Clube de Campo Alvorada, um condomínio organizado e muito bem cuidado, onde passo boa parte de minha vida e encontro paz e sossego espiritual. Voltei às minhas origens e voltar é reviver. E, se não bastasse, o clube conserva como lembrança “Curió”, velho cavalo de estimação, que me lembra Centauro e me traz agradáveis recordações. Lá escrevi o meu primeiro livro, A Baraúna, respirando o ar puro da floresta e ouvindo o canto suave dos pássaros. É lá que desfruto da amizade de muitos companheiros, destacando Renato Amaro, como bom vizinho; de Adolfo Jorge, a quem devo um favor; de Bartolomeu Leal, pela apresentação do meu livro A Baraúna e, com admiração e respeito, o casal Evamberto Lucas e Jandira. Ela, natural de Inajá, onde fui juiz, e ele, ilustre filho de São João do Cariri, Paraíba, conterrâneo de meu pai, quem mais me dispensa atenção e cordialidade.
Recordar faz bem ao espírito, renova o pensamento e conforta o coração.
Confesso uma particularidade que me proporcionou muita satisfação. Por um dos cavalos da fazenda eu me afeiçoei. Um árdego alazão que o cognominei de Centauro, inspirado no fabuloso animal mitológico. Houve entre nós dois uma forte identidade. O cavalo em si, para mim, é o animal mais elegante do seu reino em nossa Terra e Centauro em especial, por tê-lo entre os outros como o mais formoso e esperto. Só faltava falar. Ouvia e entendia tudo o que eu lhe dizia. Tinha rasgos de inteligência. Umas vezes parecia rir e outras demonstrava tristeza. Tinha um trote leve e macio. Um cavalo se conhece pelos sinais que tem, assim se classificando: um é bom; dois é melhor; três não presta; quatro é pior; cinco é brinco e seis é rei. Centauro tinha dois sinais, um deles encoberto. Cascos pretos. Crinas do lado direito. Gostava de comer palha de milho verde com boneca, ensopada de mel-de-furo. Batia com um dos cascos dianteiros quando eu dizia: “Centauro velho de guerra” e murchava as orelhas quando eu ralhava com ele.
Empolgado com a vida campestre e me achando capaz propus ao meu pai tomar conta do criatório da fazenda, salientando que mudaria o nome de Cedro para Tirol, região histórica da Áustria, melhoraria a qualidade do rebanho e construiria uma bela casa alpendrada. O velho deu o maior fora e disse que eu iria estudar internamente no colégio onde Ernestinho, filho do prefeito Ernesto Queiroz, estuda em Pesqueira. Você é inteligente e eu quero vê-lo doutor. Lá se foi o meu sonho. Isto mudou o leme do meu destino. Mas, como mudar é renovar, buscando coisas melhores, mudei com esse propósito.
Ao vir de férias, meu pai me disse ter vendido Centauro porque ele havia se transformado completamente, tornando-se um animal inútil. Foi mesmo que me matar. Senti o quanto ele sofreu com a minha ausência e chorei de saudade. Não quis mais saber do Cedro e me dediquei aos estudos. No Recife, concluí o curso de Direito da Universidade Federal e de Licenciatura, em línguas neolatinas, na Universidade Católica. Segui a magistratura e o magistério, sendo por mais de vinte anos consecutivos juiz de Direito de Caruaru e professor de sua faculdade de Direito. Foi um tempo venturoso.
Não esqueço o Cedro e Centauro. Adquiri uma casa em Aldeia, um dos recantos mais aprazíveis do estado, no Clube de Campo Alvorada, um condomínio organizado e muito bem cuidado, onde passo boa parte de minha vida e encontro paz e sossego espiritual. Voltei às minhas origens e voltar é reviver. E, se não bastasse, o clube conserva como lembrança “Curió”, velho cavalo de estimação, que me lembra Centauro e me traz agradáveis recordações. Lá escrevi o meu primeiro livro, A Baraúna, respirando o ar puro da floresta e ouvindo o canto suave dos pássaros. É lá que desfruto da amizade de muitos companheiros, destacando Renato Amaro, como bom vizinho; de Adolfo Jorge, a quem devo um favor; de Bartolomeu Leal, pela apresentação do meu livro A Baraúna e, com admiração e respeito, o casal Evamberto Lucas e Jandira. Ela, natural de Inajá, onde fui juiz, e ele, ilustre filho de São João do Cariri, Paraíba, conterrâneo de meu pai, quem mais me dispensa atenção e cordialidade.
Recordar faz bem ao espírito, renova o pensamento e conforta o coração.