Mapa como lugar de memória e arte

Marcus Prado
Jornalista

Publicação: 16/06/2025 03:00

Na ladeira olindense que vai para o Alto da Sé, no lado leste da cidade que, em extensão, desafia as Ladeiras da Misericórdia e do Seminário Maior de Nossa Senhora Rainha dos Apóstolos (eis o bispo Azeredo Coutinho, eis o Padre Antônio Vieira), numa só casa centenária, acumula-se um acervo incrível de obras de arte, além de uma valiosa biblioteca, móveis antigos, retratos, oratório e esculturas: a casa da pintora Maria Tânia Carneiro Leão. Foi nessa casa, lembra a pintora, que em 1960 a designer de joias Clementina Duarte fez o seu primeiro desfile. Também passaram por lá Francisco e Deborah Brennand (Saindo da distante Várzea, do Recife, tinham o hábito de tomar o café da manhã na casa olindense de Tânia e André), Maria José de Savoia (Rainha da Itália), Isabel de Orleans e Bragança (Condessa de Paris), Jorge e Zélia Amado, Miguel e Magdalena Arraes, Capiba, César Leal, Pelópidas e Marilu, Marcos Freire e Carolina, Ascenso Ferreira e Lourdes, Paulo Tarso Flecha de Lima e Lúcia, Antônio Carlos Magalhães, Vicente do Rego Monteiro, João Cabral e Stela, Cicero Dias e Raymonde, João Candido Portinari, João Condé, Chacrinha (Abelardo Barbosa, que era primo de seu pai), Assis Chateaubriand, Roberto Marinho, Elis Regina, acompanhada de Sileno e Cristina Ribeiro, Marcus Accioly, entre outros.

Nessa casa, de 1875, em mais de um pavimento, também galeria de arte (não é aberta ao público), projetada pelo engenheiro francês Louis Léger Vauthier, na sua histórica passagem pelo Recife (dele o Teatro de Santa Isabel), fui encontrar, além de quadros abstratos pintados por Tânia, os seus mapas inspirados em acontecimentos e lugares históricos da cidade Patrimônio Mundial da Humanidade. A esse tema, Tânia tem se dedicado desde quando descobriu as suas possibilidades de linguagem e documentação, não só cartográfica.  “Saí à procura de um livro sobre mapas do Século XVII, achei a inspiração. Pintei dois mapas, envelheci tanto que um deles tive que restaurar a pintura. Mandei emoldurar e chamei os interessados pra comprar os quadros. Pensaram que eram antigos e não teriam dinheiro pra pagar, deveriam ser muito caros. Foi quando eu disse que eram meus e eram um presente. Eram as peças mais admiradas pelos clientes. Depois, a experiência foi um sucesso. Então me animei e continuei pintando mapas. (....). Cussy de Almeida foi o primeiro comprador, depois vieram outros.” Um dos primeiros mapas pintados, lembra a pintora, foi a paisagem do Recife no período do Domínio Holandês (1630-1654), o que é hoje o bairro de Santo Antônio. Retrata o Forte das Cinco Pontas, o Palácio Friburgo, sede do governo de Mauricio de Nassau. Olinda do passado fez parte de outros mapas, a cidade alta, a paisagem edificada. Tânia reconhece que o mapa desempenha um papel crucial na historiografia, fornecendo ferramentas visuais para interpretar o passado histórico. Todo mapa é construído de fragmentos que vão sendo justapostos, uma visão contextualizada de um tempo, as cartografias de Tânia.