EDITORIAL » Homossexualidade não é doença

Publicação: 22/09/2017 03:00

Na contramão do entendimento da ciência, causou surpresa a decisão do juiz federal da 14ª Vara do Distrito Federal Waldemar Cláudio de Carvalho que abre brechas para que psicólogos ofereçam terapia de reversão sexual — popularmente, chamada de “cura gay”. A concessão da liminar recoloca, na ordem do dia, o debate sobre questão que se imaginava superada, apesar de todo o preconceito existente contra essa parcela da sociedade. O Conselho Federal de Psicologia (CFB) adiantou que recorrerá da liminar. Para a entidade, a ação popular contra a Resolução 1/1999 representa violação dos direitos humanos e não tem nenhum embasamento científico.

Na ciência, a questão está pacificada: homossexualidade não é patologia, mas um comportamento tão normal quanto a heterossexualidade. Desde 1990, a Organização Mundial de Saúde (OMS) suprimiu o tema da Classificação Internacional (CID). Cinco anos antes, no Brasil, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) o havia retirado a lista de transtornos, como o fizeram as associações norte-americanas de Psiquiatria, em 1973, e de Psicologia em 1975. O médico e escritor Dráuzio Varella afirma que os que veem a homossexualidade como desvio, como aberração da natureza, o fazem por absoluta ignorância. Ele lembra que o comportamento é controlável, mas o desejo, impossível.

Quem está em conflito com os próprios desejos que busque a ajuda de um especialista, seja psicólogo, seja profissional de saúde. Mas a insatisfação individual não pode ter força suficiente para se transformar em patologia ou crime, nem ser confundida com epidemia. A mudança implicaria tornar verdades sofismas que embasam preconceitos e, queiram ou não, incentivam a violência e o ódio contra os homossexuais e outros segmentos sociais minoritários.

O noticiário policial mostra, com muita frequência, os danos que esses estímulos provocam na população LGBT. Ora as pessoas são espancadas, ora são mortas por terem comportamento diferente dos heterossexuais. As políticas públicas para conter os crimes motivados pelo ódio não têm sido eficientes. Em determinadas situações nem sequer parecem existir.

Entender as relações homoafetivas como doença seria retrocesso para o país. Em 2011, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a legalidade da união homoafetiva. Se há patologia em todo esse imbróglio, ou demanda por reorientação, ela afeta parcela dos brasileiros tomada pelo preconceito, pela discriminação e propagadora da violência. A sexualidade não é padrão de medida para avaliar a capacidade do indivíduo.