De raposas e de galinhas

Vladimir Souza Carvalho
Magistrado

Publicação: 20/03/2021 03:00

No meio da caminhada, o milharal dos dois lados, a raposa saiu correndo, se imiscuindo entre os pés de milho que se mantinham em pé, à espera do momento certo da colheita. Ali desaparece, não havendo como ver para onde foi. Tudo se passa em poucos segundos. A raposa, sinônimo de esperteza, não ia parar para me saudar, indagar como eu estava, apesar de não estar portando nenhuma arma que pudesse lhe afetar a vida. Nem pedra lhe jogaria.

Depois, ouviria que as galinhas, trancadas no galinheiro, espaço quadrado, cerca de pau a pique, no meio da noite, quando se agitam e passam a piar, assim procedem porque sentem o cheio de raposa por perto, e, então, ficam inquietas. Sabem, por experiência que vem no sangue, ser delas o alimento predileto. No caso, três cães, autênticos vira-latas, dormem por perto, atentos a todo barulho, eles também com faro suficiente para assinalar a presença de raposa, se, por al, alguma resolva se aproximar do galinheiro. Correm atrás, latindo ainda mais.

Indo, da sede da fazenda, para um povoado, me deparei, na estrada de barro, com uma raposa morta, estendida no chão, perto da cerca, atropelada por algum veículo quando atravessava a estrada, fato, aliás, mui comum. Apesar da eterna manha, muitas vezes, na travessia de um lugar para o outro, com a estrada no meio, a raposa o faz em momento inoportuno, quando um veículo passa. O atropelamento ocorre. Uma a menos, diriam as galinhas lá do galinheiro, se soubessem. Nada falei. Não sou de dançar em torno do cadáver de uma raposa.

Na Justiça Federal, no Aracaju, se criavam galinhas, que passeavam pelo anexo cheio de mato. No meio da noite, se tornavam banquete de raposa. No chão, não ficava um só osso. Só as penas da vítima, artesanalmente retiradas. Ouvia que a colocação de cachaça numa vasilha, a raposa, atraída pelo cheiro, bebia e ficava sem forças para sair do local, o que facilitava, no dia seguinte, a sua captura e imediata morte.  Nunca me animei a patrocinar a aquisição da bebida.

D. João VI só comia frango. Na mesa de um amigo, na Itabaiana, era só galinha todo dia. Se faltava, reclamava: “Nessa casa não se come mais galinha.” E tome sermão. Então, a culpa não é da raposa, mas do frango e da galinha. A raposa integra, também, o rol dos seus admiradores.