Rodrigo Pellegrino de Azevedo
Advogado
Publicação: 09/11/2021 03:00
A vida sempre se impregna do que pensamos dela, do que nossos pais nos legaram para ela e do ambiente científico que nela interfere. Como homem da geração “x”, nascido entre 1965 e 1984, tive que dialogar e me entender com meus pais, nascidos antes da segunda guerra mundial, portanto, genitores que nem sequer eram da geração “baby boomer”, que são os nascidos entre 1945 e 1964.
Como filho do Recife, no Nordeste do Brasil, muito pouco, ou quase nada, pude acompanhar do que se passava nos recônditos do mundo. As leituras e a rua foram as fontes da construção de meu espírito. Eram uma espécie de “World Wide Web” permitida e serviam para interagir com o mundo real - único possível nessa época - com pessoas reais e impasses reais. Correr ou não correr de uma briga, estudar ou ir empinar papagaio, caçar ou não caçar passarinho, jogar bola ou fazer a tarefa de casa, brechar ou não brechar a vizinha. Eram dilemas reais.
Claro, também as missas aos domingos, com meus pais, assim como as novenas na Igreja de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, todas as terças-feiras, no bairro da Madalena, bem como os passes e as rezas que “Tonho” me dava, marido de “Dona Elza” (nossa eterna babá), quando por algum motivo, mamãe, em desespero com minhas febres intermináveis, chamava o “curandeiro” para me benzer.
Lembro, como hoje, o momento mágico, quando as folhas de “pinhão roxo” murchavam e o diagnóstico era quase fatal: mau-olhado. Eu, ficava olhando para “Tonho”, bem na minha frente, a rezar para mim numa língua que não conhecia, suando como “tampa de chaleira”, esperando o fim daquela “expulsão” dos espíritos malignos. Foram muitos diagnósticos deste tipo e acho que até hoje ainda rolam essas coisas, mas .... deixa para lá.
Acredito que assim foi possível compreender a complexidade da existência, sem tomar susto com medos indecifráveis, pois o máximo que poderia nos atingir, para além da realidade, era estar tomado por maus espíritos (olho-gordo) que eram prontamente expulsos pelas rezas. Coisa simples e concreta, coisa que não pude legar aos meus filhos, nascidos entre a geração “Y” e “Z” (1985/99 e 2000/até hoje).
A geração de meus filhos possui características maravilhosas. Tiveram acesso a coisas somente imagináveis, para minha geração, através da ficção científica. É uma geração cuja realidade, outrora, eram apenas minhas ficções futurísticas. Essa geração atual foi minha ficção científica. A tecnologia dotou essa geração da imediatidade para tudo. É uma geração forjada em hipertrofia de direitos, regalias e produtos que não precisam ser extraídos. O suco é engarrafado, o leite, o bolo, o pão e até os amores e as músicas, quase todas iguais.
Outro dia, perdido a olhar o céu, pensava se as novas gerações acreditariam em almas assombradas e espíritos malignos. Presumo que não, devem sentir essas coisas dentro de si, mas não conseguem entender. A ciência acabou com as expectativas simbólicas. Tudo tem uma explicação, menos o mal-estar que muitos jovens se veem acometidos. Algumas pistas podem surgir, mas uma factual impõe reflexão: o ser humano é parte de um cosmo social, de dor e do imponderável, sem os quais a sua natureza se esvai.
Há de se pensar e viver com todas as benesses do mundo tecnológico, mas teremos que nos reencontrar com o desconhecido, o fantasmagórico, o inexplicável, pois, na medida em que o real se transforma em simulacro da realidade (a virtualidade), uma topada pode significar o fim do mundo. Precisamos ter mais “Merthiolate” e menos “Mercúrio Cromo”. Chegamos a inventar “Elixir Sanativo” que não arde! Vejam só. A tecnologia, para as novas gerações eliminou a dor e com isso envergou a realidade. Daí intuo, que esse fato tem gerado indivíduos “não me toques”. Felizmente, quando o tempo permite, ainda converso com meus queridos filhos sobre “Tonho de Dona Elza” e eles ainda me respondem dizendo: “-cruz credo!” e soltam risadas, choram, têm insônias, pesadelos e sentem dor. Que bom!
Como filho do Recife, no Nordeste do Brasil, muito pouco, ou quase nada, pude acompanhar do que se passava nos recônditos do mundo. As leituras e a rua foram as fontes da construção de meu espírito. Eram uma espécie de “World Wide Web” permitida e serviam para interagir com o mundo real - único possível nessa época - com pessoas reais e impasses reais. Correr ou não correr de uma briga, estudar ou ir empinar papagaio, caçar ou não caçar passarinho, jogar bola ou fazer a tarefa de casa, brechar ou não brechar a vizinha. Eram dilemas reais.
Claro, também as missas aos domingos, com meus pais, assim como as novenas na Igreja de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, todas as terças-feiras, no bairro da Madalena, bem como os passes e as rezas que “Tonho” me dava, marido de “Dona Elza” (nossa eterna babá), quando por algum motivo, mamãe, em desespero com minhas febres intermináveis, chamava o “curandeiro” para me benzer.
Lembro, como hoje, o momento mágico, quando as folhas de “pinhão roxo” murchavam e o diagnóstico era quase fatal: mau-olhado. Eu, ficava olhando para “Tonho”, bem na minha frente, a rezar para mim numa língua que não conhecia, suando como “tampa de chaleira”, esperando o fim daquela “expulsão” dos espíritos malignos. Foram muitos diagnósticos deste tipo e acho que até hoje ainda rolam essas coisas, mas .... deixa para lá.
Acredito que assim foi possível compreender a complexidade da existência, sem tomar susto com medos indecifráveis, pois o máximo que poderia nos atingir, para além da realidade, era estar tomado por maus espíritos (olho-gordo) que eram prontamente expulsos pelas rezas. Coisa simples e concreta, coisa que não pude legar aos meus filhos, nascidos entre a geração “Y” e “Z” (1985/99 e 2000/até hoje).
A geração de meus filhos possui características maravilhosas. Tiveram acesso a coisas somente imagináveis, para minha geração, através da ficção científica. É uma geração cuja realidade, outrora, eram apenas minhas ficções futurísticas. Essa geração atual foi minha ficção científica. A tecnologia dotou essa geração da imediatidade para tudo. É uma geração forjada em hipertrofia de direitos, regalias e produtos que não precisam ser extraídos. O suco é engarrafado, o leite, o bolo, o pão e até os amores e as músicas, quase todas iguais.
Outro dia, perdido a olhar o céu, pensava se as novas gerações acreditariam em almas assombradas e espíritos malignos. Presumo que não, devem sentir essas coisas dentro de si, mas não conseguem entender. A ciência acabou com as expectativas simbólicas. Tudo tem uma explicação, menos o mal-estar que muitos jovens se veem acometidos. Algumas pistas podem surgir, mas uma factual impõe reflexão: o ser humano é parte de um cosmo social, de dor e do imponderável, sem os quais a sua natureza se esvai.
Há de se pensar e viver com todas as benesses do mundo tecnológico, mas teremos que nos reencontrar com o desconhecido, o fantasmagórico, o inexplicável, pois, na medida em que o real se transforma em simulacro da realidade (a virtualidade), uma topada pode significar o fim do mundo. Precisamos ter mais “Merthiolate” e menos “Mercúrio Cromo”. Chegamos a inventar “Elixir Sanativo” que não arde! Vejam só. A tecnologia, para as novas gerações eliminou a dor e com isso envergou a realidade. Daí intuo, que esse fato tem gerado indivíduos “não me toques”. Felizmente, quando o tempo permite, ainda converso com meus queridos filhos sobre “Tonho de Dona Elza” e eles ainda me respondem dizendo: “-cruz credo!” e soltam risadas, choram, têm insônias, pesadelos e sentem dor. Que bom!