Morreu o filho do herói!

Luiz Augusto Correia de Araújo
Prático

Publicação: 09/09/2023 03:00

Dia 5 de setembro passado, em pleno Aeroporto de Orlando, na Flórida, prestes a embarcar no avião de volta ao Recife, Nelcy da Silva Campos Filho faleceu em decorrência de um enfarte fulminante. Para quem não sabe, Nelcy era filho do nosso herói estadual, o prático da barra Nelcy da Silva Campos.

No dia 15 de maio de 1985, o navio brasileiro Jatobá, carregado de gás líquido propano, incendiou um dos seus tanques, atracado ao cais do Terminal do Brum, destinado a tancagem de derivados de petróleo, inclusive do chamado gás de cozinha.

Naquela madrugada, já tinha sido eu chamado pelo capitão dos Portos, comandante Sperling, pedindo que eu o ajudasse na retirada do navio em chamas. Declinei da honra e não fui ao encontro do navio, até por questão de sobrevivência.

A essa altura, fui para o porto e, no nosso escritório da praticagem, tivemos conhecimento que o prático, nosso colega Nelcy da Silva Campos, já tinha se dirigido ao local do navio em chamas, tendo já convencido o mestre de um rebocador e sua tripulação de que todos deveriam se dirigir para onde estava o navio e lá tentar rebocá-lo barra afora.

Todos sabem dos perigos que envolveram essa atitude que, ao meu ver, era extremamente perigos ou até fatal! Após concluir a retirada do navio, ainda em chamas, com dois tranques carregados de gás, o colega Nelcy, ao chegar em terra, deu entrevista a toda a imprensa e ficou na mídia pelo menos durante um mês.

O governador Roberto Magalhães, e outras autoridades do estado, tomando conhecimento do ato heroico do simples prático da barra, condecorou o novo herói, que havia salvo toda a área do Porto do Recife e adjacências, no raio de cinco quilômetros, que abrangia o prédio da Prefeitura do Recife, do governo do estado, da Marinha do Brasil, instalações portuárias, e escritórios de algumas dezenas de empresas privadas. Essas edificações estavam com todo o seu pessoal já nos devidos  locais de trabalho.

Não há nada mais justo e oportuno do que homenagear pessoas que não fazem ideia do que seja medo ou covardia, enfrentando perigos que ameaçavam a vida de todos, inclusive a sua própria. Nelcy ganhou, assim, das mãos do governador, a medalha de honra ao mérito no seu mais alto grau.

Poucos anos depois, acometido de um câncer de pele, meu colega herói faleceu. Entrou em cena seu filho Nelcy da Silva Campos Filho, numa obstinada campanha de homenagear seu falecido pai. Essa homenagem constaria de nomeação do terminal de passageiro do porto com o nome do seu pai e a colocação de um busto na entrada desse local, com a placa alusiva ao feito e ao fato!

Poucas portas se abriram ao seu projeto, exceto a do Terceiro Distrito Naval, onde o almirante Barbosa, concordando com o projeto, iniciou a construção na Praça Rio Branco, hoje Marco Zero, dessa estrutura destinada à homenagem tão justa e oportuna.

Pessoalmente, com um longo caminho já navegado por mim, não me lembro de ter visto um filho dedicar o seu tempo diuturnamente na homenagem ao seu pai herói. Com bom discurso, divulgou seu pai em todas as entidades públicas e privadas, sensibilizando a todos com aquela atitude do amor eterno ao seu estimado pai. Chegava, em alguns momentos, a ter atitudes até certo ponto hilariantes, como certa vez em um almoço na SOAMAR (Sociedade dos Amigos da Marinha), quando solicitou aos garçons que suspendessem os serviços, pois ele estava falando sobre seu pai!!

Nelcy se foi, inesperada e intempestivamente chamado por Deus. Deixou muita saudade nos seus entes queridos, mas com certeza está navegando junto ao seu pai, que em vida sempre dedicou ao filho admiração e carinho extremo. Deus os mantenham vivos e juntos, em nome desse amor muito grande!