A psicologia da adesão ao fascismo

Alexandre Rands Barros
Economista

Publicação: 09/11/2024 03:00

A eleição de Trump nos E.U.A. expõe uma preocupação importante dos democratas de todo o mundo. O que poderia levar tantas pessoas que vivem num país de grandes liberdades individuais a votarem em um candidato que se apresenta como defensor das teses fascistas? Há três hipóteses principais apresentadas por psicanalistas para explicar a adesão dos indivíduos a essas ideologias. A primeira delas, tem como pano de fundo a relação criada entre frustração e agressão. Ela tem como sustentáculo a hipótese apresentada por Dollard e Miller, entre outros, ainda durante a segunda guerra mundial. Vários estudos empíricos mostram que quanto mais frustrado um indivíduo é, mas agressivamente ele tende a reagir. Quando se transporta essa relação para frustração estrutural, pode-se deduzir que ela induz à adesão a ideologias mais agressivas, como é o caso do fascismo.

A segunda hipótese foi apresentada por Erich Fromm, em seu livro de 1941 “Escape from Freedom”. Ele enfatiza que a evolução da humanidade gerou muita liberdade individual nos países ocidentais. Mas a contrapartida é que gerou também muita solidão, incertezas e insegurança quanto ao futuro e ao desconhecido. Daí, muitos indivíduos regridem psicologicamente e buscam o acalanto de líderes fortes que supostamente defendam o seu valor em detrimento de outros grupos de indivíduos, como imigrantes latinos (Trump), judeus (Hitler), nordestinos, homossexuais, comunistas e mulheres (Bolsonaro). Esses líderes fascistas geram o efeito psicológico semelhante à proteção dos pais, como aliás já foi sugerido por Freud no livro Psicologia das Massas. Daí, o entusiasmo de muitos por eles.

A terceira hipótese importante foi apresentada por Wilhelm Reich, também na década de 1940, e enfatiza o papel da repressão sexual e educação autoritária como propulsores de uma personalidade autoritária. Suas vítimas tendem a aderir a projetos autoritários de líderes fascistas. Theodor Adorno e colaboradores enfatizaram o papel da educação doméstica para a formação da personalidade autoritária, que contempla pessoas com valores rígidos e simpáticas a hierarquias. Elas podem, facilmente, aderir a movimentos políticos que pregam a intolerância e o preconceito.

Testei essas três hipóteses, utilizando dados para o Brasil e recorrendo ao voto em Bolsonaro, em 2018, como proporção dos votos de todos os opositores ao PT e ao PSTU. Havia no Brasil um leque de alternativas de oposição, que poderiam ser alvo do voto dos que apenas estavam contra o governo petista. Assim, essa variável dependente revela a proporção dos indivíduos que escolheram aderir ao fascismo, representado por Bolsonaro, separando-os daqueles que apenas não queriam o PT ou PSTU. Utilizou-se como proxy para cada uma das hipóteses: (i) o inverso da taxa de crescimento do PIB per capita entre 2010 e 2018, que captura frustração de renda; (ii) o PIB per capita de 2018 (Eric Fromm), que captura o nível de desenvolvimento do município e nível de liberdades individuais; e (iii) a quantidade de eleitores (Reich), que captura o controle social a partir de maior conhecimento proporcional entre as pessoas. Há mais controle social a partir de valores rígidos em cidades menores. Os resultados confirmam as três hipóteses com coeficientes estimados com sinais dentro do esperado e nível de significância estatístico acima de 99% de chance de ser diferente de zero. Isso também demonstra que o voto em Bolsonaro é uma boa proxy para o fascismo no Brasil.