A história da inflação recente que o IPCA quer nos contar

Alexandre Rands Barros
Economista

Publicação: 08/02/2025 03:00

A inflação no Brasil mudou de patamar a partir do final de 2020. Ela deu um salto devido à pandemia e a mudanças de estrutura no consumo. Contribuiu também, após o fim do isolamento, a tentativa das empresas de compatibilizar seu fluxo corrente de receitas com o novo patamar de endividamento. A partir de julho de 2022, a inflação voltou a cair, principalmente por causa de políticas populistas de Bolsonaro na tentativa de ganhar as eleições. Mas também iniciou o arrefecimento dessa reacomodação de preços decorrente da mudança na estrutura da demanda e da recomposição de compatibilidade do fluxo financeiro das empresas com o novo patamar de endividamento. No início de 2023, tendo passado a pressão dessa reestruturação e recuperação de empresas endividadas e com o fim das políticas populistas, ela começou a cair estruturalmente, mantendo-se nessa tendência até o terceiro trimestre de 2024. Desde então, ela voltou a subir. Agora sim, decorrente do excesso de demanda gerado pela renda elevada nas mãos da população e de um novo ciclo de investimentos das empresas.

Os economistas cavaleiros do apocalipse, que já tinham errado feiamente nas previsões de crescimento do PIB e do déficit público para 2024, agora resolveram eleger um novo Cavalo de Troia que o governo atual teria colocado na economia brasileira: a inflação. Ela, agora, realmente cresce por causa do excesso de demanda sobre a oferta e de um nível de poupança não gasta com investimentos abaixo do que seria necessário para manter o equilíbrio entre oferta e demanda agregadas. A política monetária pode ser um instrumento para forçar a elevação da poupança ou redução dos investimentos. Contudo, talvez ela tenha que ser muito rigorosa no momento, como está se mostrando na realidade: os juros aumentam e a inflação não cede tanto.

O economista Bráulio Borges (FGV-IBRE e LCA) tem sugerido forçar os bancos a fazerem provisões para um fundo que está previsto em lei e que seria o colchão de capital anticíclico. Com isso, eles reduziriam seus empréstimos e a demanda agregada, sem precisar elevar a Selic e o déficit nominal. É uma boa ideia, mas talvez com uma penalização elevada para as empresas privadas, principalmente aquelas que ainda estão se reequilibrando após a pandemia. Os bancos vão aumentar os spreads das diversas operações e restringir crédito para as empresas com níveis de risco mais elevados (esses mecanismos conjuntos talvez não elevem o spread médio). As empresas mais penalizadas serão aquelas que tiveram que se endividar mais na pandemia por causa da estrutura de consumo que prevaleceu naquele momento de exceção.

Uma outra possibilidade seria a redução das tarifas de importação, pois os bens comercializáveis têm tido inflação superior à geral da economia desde agosto de 2024. Isso reduziria a aceleração da inflação e tornaria a economia brasileira mais aberta e mais eficiente. Empresas nacionais sofreriam com a concorrência, mas a penalização maior iria para aquelas que são relativamente mais ineficientes, quando se compara ao mercado internacional, ao invés daquelas que apenas sofreram na pandemia por causa da reestruturação da demanda. Talvez o ônus geral seja menor nesse segundo caso. Mas, nada impede que as duas estratégias apresentadas aqui possam coexistir e sirvam para controlar a inflação, aliviando a sufocante escalada da taxa de juros.