Um doutor pernambucano da política brasileira

Felipe Sampaio
Cofundador do Centro Soberania e Clima; dirigiu o Instituto de Estudos de Defesa no Ministério da Defesa; foi diretor do sistema de estatísticas do Ministério da Justiça; ex-secretário executivo de Segurança Pública do Recife; colabora com Fórum Brasileiro de Segurança Pública

Publicação: 27/05/2025 03:00

O Instituto de Desenvolvimento, Ensino e Pesquisa – IDP conferiu ao ex-ministro Raul Jungmann o título de Doutor Honoris Causa, no último dia 21 de maio. Desse modo, Gilmar Mendes, fundador do IDP, formalizou o reconhecimento à contribuição do homenageado no campo da Política – um estadista no sentido original.

Afinal de contas, foi com trabalho e militância que o Raul conquistou a condição, cada vez mais rara, de ser chamado de Político. Com ‘P’ maiúsculo mesmo, para que não confundamos com as frivolidades da política com ‘p’ minúsculo com as quais o noticiário ainda nos espanta, sem nos surpreender. Tem como agendas o bem-estar social, o desenvolvimento sustentável, a soberania latu sensu, enfim, o Estado de Direito. Em seu discurso de diplomação foi sutil e firme ao parabenizar o Judiciário e as Forças Armadas por suas posições decisivas para a Democracia nos últimos anos.

Tive a sorte de ser estagiário em um think tank que o Raul fundara no Recife no início dos anos 1990, o IDEC – Instituto de Estudos da Cidadania. O cara já conseguia atuar simultaneamente em temas tão diversos como ressocialização de jovens da Funabem, economia do Nordeste, educação de adultos, enquanto dirigia a Federação Nacional de Secretários Municipais de Educação e trabalhava em projetos de ONGs como a Ashoka.

No corredor daquele prédio art déco no bairro do Derby, inesperadamente você podia esbarrar com o ainda senador paulista Fernando Henrique, a socióloga Ruth Cardoso, o governador do Ceará Tasso Jereissati, ou Paulo Freire. O Raul é aquilo que Ted Roosevelt chamava de “o homem que se encontra na arena, com a face suja de poeira”. Sabe que na democracia moderna cargos públicos têm a ver com trabalho e não com poder, como diria Flavio Dino, que esteve presente à diplomação no IDP.

Em 2018, no seu último dia como ministro da Defesa, o Raul chamou os mais próximos de sua equipe para perguntar reservadamente o que achávamos de ele aceitar o convite do presidente Temer para assumir o novo Ministério da Segurança Pública. Daquela conversa participaram o seu chefe de gabinete Alessandro Candeas (que viria a ser o embaixador do Brasil na Palestina durante a crise de Gaza), o economista Flávio Basílio, então secretário de Produtos de Defesa (futuro secretário Nacional de Segurança Pública que idealizaria as fontes financeiras para o Fundo Nacional de Segurança Pública), o assessor de comunicação João Bosco (ex-diretor da redação do Estadão por vinte anos), o assessor para assuntos militares brigadeiro Tadeu Fiorentini (futuro chefe do Estado Maior da Aeronáutica) e eu, como chefe da Assessoria Especial.

Precipitados, fomos unânimes em opinar que seria mais tranquilo permanecer na Defesa, naquele último ano de governo, do que assumir a conturbada Segurança Pública. O que nós não sabíamos é que ele já havia aceitado a tarefa! Deveríamos saber que, assim como Tancredo Neves, o Raul entendia que “a Pátria não é a aposentadoria dos heróis”. Ou, como diria Eduardo Campos, “se fosse fácil, não seria conosco”. A obstinação está no sangue pernambucano desde a Batalha dos Guararapes.

Raul Jungmann foi secretário de Planejamento de Pernambuco, secretário-executivo do Ministério do Planejamento (onde viu de perto a implantação do Plano Real), presidente do Ibama e do Incra, ministro da Reforma Agrária (quando foram assentadas meio milhão de famílias), vereador do Recife, deputado federal por três vezes (cuidou do Estatuto do Desarmamento), ministro da Defesa, ministro da Segurança Pública (criou o Susp), fundou o Centro Soberania e Clima, é membro do Conselho do Cebri e preside o Instituto Brasileiro de Mineração Ibram.