Orlando Morais Neto
Sócio de Paurá Advocacia, especializado em Direito Eleitoral, Mestre e Doutorando em Direito pela Unicap e pela Universidade de Pisa
Publicação: 18/06/2025 03:00
A tecnologia transformou radicalmente a forma como vivemos, nos comunicamos, trabalhamos e até como pensamos. Com a digitalização da vida cotidiana, passamos a compartilhar voluntária (ou involuntariamente) uma quantidade imensa de informações pessoais — em redes sociais, aplicativos, sites de compras, serviços públicos e até ao simplesmente caminhar por ruas monitoradas por câmeras.
Diante desse cenário, surge uma questão central: a Constituição Federal de 1988 está preparada para proteger os nossos dados pessoais e garantir a privacidade na era digital?
A resposta começa com o artigo 5º, incisos X e XII, da Constituição, que reconhece a inviolabilidade da vida privada, da honra, da imagem e das comunicações. Esses dispositivos garantem um núcleo duro de proteção à intimidade do cidadão — o chamado direito à privacidade. Ainda que redigidos numa época pré-internet, esses princípios se mostram surpreendentemente robustos para enfrentar os desafios da era digital.
Com a evolução das tecnologias de vigilância e da chamada “economia dos dados”, a discussão se aprofundou. A coleta e o tratamento de informações passaram a ser não apenas ferramentas de marketing, mas também instrumentos de poder — capazes de influenciar decisões políticas, moldar comportamentos e definir oportunidades sociais. Em resposta a isso, o Brasil aprovou, em 2018, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), criando um marco normativo próprio para regular o uso de dados e estabelecer deveres para empresas e órgãos públicos.
A LGPD foi um passo importante, mas seu alicerce está no texto constitucional. Tanto que, em 2021, a proteção de dados pessoais foi incluída expressamente como direito fundamental autônomo, por meio da Emenda Constitucional nº 115, que alterou o artigo 5º da Constituição. Foi uma atualização simbólica e jurídica de grande peso: o reconhecimento de que, no século 21, proteger dados é proteger pessoas.
O desafio, no entanto, está longe de ser apenas jurídico. O vazamento de dados por instituições públicas, o uso indevido de informações por empresas privadas, a vigilância massiva por algoritmos invisíveis e a manipulação algorítmica de conteúdos são fenômenos reais, que exigem vigilância democrática constante. A Constituição oferece os princípios; cabe ao Estado e à sociedade aplicá-los com eficácia, transparência e responsabilidade.
O Supremo Tribunal Federal também tem desempenhado papel relevante nesse campo. Em decisões como a que suspendeu a eficácia da Medida Provisória nº 954/2020 — que previa o compartilhamento de dados de usuários de telecomunicações com o IBGE —, o STF reforçou que o tratamento de dados exige base legal, finalidade legítima e respeito à proporcionalidade. O acesso à informação não pode atropelar o direito à intimidade.
A realidade tecnológica exige que repensemos a noção de privacidade, não como um direito à solidão, mas como controle sobre as próprias informações, inclusive no ambiente digital. Em outras palavras: não se trata de esconder dados, mas de decidir quem pode acessá-los, por quê, e por quanto tempo.
A Constituição de 1988 nasceu analógica, mas seus valores são digitais. O direito à privacidade, à autodeterminação informativa e à liberdade individual permanecem atuais, ainda que os meios tenham mudado. Cabe aos intérpretes da Constituição — juízes, legisladores, professores, cidadãos — manterem esses direitos vivos e eficazes, mesmo diante das transformações tecnológicas mais profundas. A proteção de dados não é apenas um tema técnico: é uma questão de liberdade, cidadania e dignidade na era digital.
Diante desse cenário, surge uma questão central: a Constituição Federal de 1988 está preparada para proteger os nossos dados pessoais e garantir a privacidade na era digital?
A resposta começa com o artigo 5º, incisos X e XII, da Constituição, que reconhece a inviolabilidade da vida privada, da honra, da imagem e das comunicações. Esses dispositivos garantem um núcleo duro de proteção à intimidade do cidadão — o chamado direito à privacidade. Ainda que redigidos numa época pré-internet, esses princípios se mostram surpreendentemente robustos para enfrentar os desafios da era digital.
Com a evolução das tecnologias de vigilância e da chamada “economia dos dados”, a discussão se aprofundou. A coleta e o tratamento de informações passaram a ser não apenas ferramentas de marketing, mas também instrumentos de poder — capazes de influenciar decisões políticas, moldar comportamentos e definir oportunidades sociais. Em resposta a isso, o Brasil aprovou, em 2018, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), criando um marco normativo próprio para regular o uso de dados e estabelecer deveres para empresas e órgãos públicos.
A LGPD foi um passo importante, mas seu alicerce está no texto constitucional. Tanto que, em 2021, a proteção de dados pessoais foi incluída expressamente como direito fundamental autônomo, por meio da Emenda Constitucional nº 115, que alterou o artigo 5º da Constituição. Foi uma atualização simbólica e jurídica de grande peso: o reconhecimento de que, no século 21, proteger dados é proteger pessoas.
O desafio, no entanto, está longe de ser apenas jurídico. O vazamento de dados por instituições públicas, o uso indevido de informações por empresas privadas, a vigilância massiva por algoritmos invisíveis e a manipulação algorítmica de conteúdos são fenômenos reais, que exigem vigilância democrática constante. A Constituição oferece os princípios; cabe ao Estado e à sociedade aplicá-los com eficácia, transparência e responsabilidade.
O Supremo Tribunal Federal também tem desempenhado papel relevante nesse campo. Em decisões como a que suspendeu a eficácia da Medida Provisória nº 954/2020 — que previa o compartilhamento de dados de usuários de telecomunicações com o IBGE —, o STF reforçou que o tratamento de dados exige base legal, finalidade legítima e respeito à proporcionalidade. O acesso à informação não pode atropelar o direito à intimidade.
A realidade tecnológica exige que repensemos a noção de privacidade, não como um direito à solidão, mas como controle sobre as próprias informações, inclusive no ambiente digital. Em outras palavras: não se trata de esconder dados, mas de decidir quem pode acessá-los, por quê, e por quanto tempo.
A Constituição de 1988 nasceu analógica, mas seus valores são digitais. O direito à privacidade, à autodeterminação informativa e à liberdade individual permanecem atuais, ainda que os meios tenham mudado. Cabe aos intérpretes da Constituição — juízes, legisladores, professores, cidadãos — manterem esses direitos vivos e eficazes, mesmo diante das transformações tecnológicas mais profundas. A proteção de dados não é apenas um tema técnico: é uma questão de liberdade, cidadania e dignidade na era digital.