Um maluco beleza, um mago e a censura
CNV detalha episódio em que Raul Seixas e Paulo Coelho foram detidos por militares por causa da expressão %u201CSociedade Alternativa%u201D
Daniel Camargos
politica.mg@dabr.com.br
Publicação: 06/01/2015 03:00
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Paulo Coelho e Raul Seixas, parceiros desde o início da década de 1970, registraram em cartório a Sociedade Alternativa |
Os dois tiveram que se apresentar na sede da Delegacia de Ordem Política e Social (Dops), às 15h de 27 de maio de 1974, no Rio de Janeiro, para explicar detalhes que incomodaram os censores a respeito do álbum Krig-Há, Bandolo!, lançado no ano anterior e que foi o primeiro solo de Raul. O disco tem as primeiras parcerias do cantor com Paulo Coelho. Os dois se conheceram em maio de 1972, após Raul ler um artigo do escritor na revista A Pomba, especializada em ufologia.
“Eles se apresentaram sem advogado, pois acreditavam que essa seria mais uma intimação para discutir a liberação de canções censuradas, fato já ocorrido anteriormente”, assinala o relatório. O texto da CNV afirma que Raul foi liberado 30 minutos após o depoimento, mas que Paulo Coelho ficou três horas em uma cela do Dops. “O policial encarregado do interrogatório questionou o conteúdo do gibi encartado no LP, de autoria do escritor, com desenhos de sua então namorada, Adalgisa Eliana Rios de Magalhães, estudante de arquitetura. Tratava-se de uma história em quadrinhos com quatro páginas inspirada nas aventuras de Tarzan, personagem criado por Edgar Rice Burroughs.”
O interrogatório foi interrompido e um camburão, com quatro policiais armados foi prender Adalgisa. Na madrugada de 28 de agosto, o casal foi fichado. “Sem nenhuma ordem , mandado de prisão ou mesmo uma acusação formal, os dois tiveram seus pertences recolhidos. No interrogatório foram questionados sobre o conteúdo do gibi e a criação da Sociedade Alternativa”, descreve o relatório.
Segundo os documentos pesquisados pela CNV, os interrogatórios foram individuais e duraram várias horas. Os dois não foram torturados nas dependências do Dops. Os policiais queriam informações sobre brasileiros exilados no Chile. O advogado contratado pela família de Paulo Coelho foi informado no Dops que o escritor seria liberado ainda no 28 de agosto. Às 22h, o casal assinou o alvará de soltura. Mas, segundo pesquisa da CNV, foi conduzido ao 1º Batalhão de Polícia do Exército, no Rio de Janeiro.
No depoimento de cinco horas que prestou no Exército, Paulo Coelho detalhou sua parceria com Raul Seixas e tentou explicar sobre a Sociedade Alternativa: “Que colocaram que a intenção não era ir contra o governo, mas, inclusive, interessar a juventude num outro tipo de atividade”. (Do Estado de Minas)