Antivirais podem evitar a síndrome do zika Pesquisadores vão testar em humanos uma substância capaz de eliminar replicação em 99%

Publicação: 16/08/2017 03:00

Ao estudar a capacidade de uma substância de bloquear a produção do vírus de uma doença canina, pesquisadores do Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, da Fiocruz-PE, podem ter descoberto a chave para impedir os comprometimentos neurológicos associados à infecção pelo zika vírus. A pesquisa mostrou que a substância 6-metilmercaptopurina ribosídica (6MMPr) diminui em mais de 99% a produção do zika nas células epiteliais (pele e cavidades internas) e neurais (sistema nervoso). O achado tem potencial de ser a base para o desenvolvimento de antivirais que evitariam a síndrome congênita do zika, que pode acarretar microcefalia e manifestações neurológicas como a síndrome de Guillain-Barré.

O estudo foi publicado na na revista International Jornal of Antimicrobial Agents. Os pesquisadores realizaram testes in vitro, nos quais introduziram a 6MMPr em células humanas e de primatas, com diferentes tempos e dosagens. A verificação foi feita em dois cenários - pós-tratamento e prevenção. Em ambos os casos, os resultados apontaram a capacidade da substância de bloquear a ação do zika.

“Em um dos testes, infectamos as células com o vírus e tratamos com a droga, que é o mais comum, já que o paciente adoece e vai ao médico. No outro, tratamos com a substância e depois infectamos com vírus. Os resultados foram semelhantes e muito robustos. Não chegou a cessar a replicação do vírus, mas atingiu 99,6%, inibição muito significativa”, disse o médico veterinário e pesquisador da Fiocruz-PE, que coordenou o levantamento, Lindomar Pena.

A 6MMPr é uma susbtância sintética de um grupo utilizado no tratamento de câncer. Provar a capacidade dela de bloquear o vírus da cinomose canina foi o que levou os pesquisadores a realizarem os testes com zika. O estudo também constatou que a substância é menos tóxica às células neurais do que às epiteliais, indicativo de que ela poderá ser utilizada no futuro para tratar infecções do sistema nervoso. “Essas células são os alvos mais importantes do zika, onde ocorrem as consequências mais devastadoras”, disse Pena. A próxima fase serão testes com camundongos, cujos resultados devem ser divulgados até o fim do ano. O protocolo requisita testes com outras duas espécies animais antes da avaliação em humanos. O tempo médio de desenvolvimento de uma droga é de 10 anos, o que, pela urgência, pode ser encurtado.

Os pesquisadores tentarão melhorar a atividade da substância. A ideia é chegar a 99,9% de bloqueio. Outra meta é melhorar a penetração da substância no sistema nervoso central, usando nanotecnologia, em parceria com a UFRPE e a Fiocruz Bahia. A pesquisa foi financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e pela Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco.

Como age a 6MMPr
  • Para se replicar dentro da célula, o vírus usa os nucleotídeos em duas bases diferentes
  • A substância tem uma estrutura parecida com essas moléculas essenciais para o vírus
  • A 6MMPr é um chamado nucleotídeo fraudulento
  • Quando ela é introduzida na células, o vírus que está se replicando incorpora a substância como se fossem as outras
  • Neste momento, a replicação para
  • A pesquisa observou que quanto maior era a dosagem, maior era a inibição
Microcefalia em Pernambuco
  • 2.357 casos notificados
  • 420 confirmados
Fonte: The thiopurine nucleoside analogue 6-methylmercaptopurine riboside (6MMPr) effectively blocks zika virus replication