Soma de fatores provocou tragédia Policiais foram atropelados por trem no ponto mais perigoso dos 70,5 km de linhas do metrô, após se afastarem de outra composição em movimento

Publicação: 17/05/2018 09:00

Os quatro policiais militares do Grupo de Apoio Tático Itinerante (Gati) do 16º Batalhão estavam de costas para um trem do metrô que trafegava às escuras quando foram atropelados, na noite da terça-feira, durante uma perseguição a suspeitos. Antes de serem atingidos, eles perceberam a aproximação de um outro trem no sentido contrário, este com os faróis acessos, e tentaram escapar para a outra linha.

Dois deles morreram e os demais ficaram feridos. As informações foram divulgadas pelo coronel aposentado Luiz Meira, que também é ex-consultor de segurança do Metrô do Recife, cargo que deixou em julho do ano passado após sete meses de trabalho. Ele conversou com um dos sobreviventes no Hospital da Restauração (HR), que lhe contou detalhes do ocorrido.

Neste ano, a CBTU calcula três mortes por atropelamento na linha férrea do metrô. A primeira delas foi a de um garoto que empinava pipa. Ontem à tarde, os corpos do sargento Eneias Severino de Sena, 40, e do cabo Adeildo José Alves, 40, foram sepultados com honras militares no Cemitério de Santo Amaro.

O acidente aconteceu por volta das 20h30, quando os PMs trocavam tiros com suspeitos de tráfico de drogas e assaltos. O sargento Eneias morreu na hora. O efetivo foi solicitado após denúncia de que cinco suspeitos estavam praticando crimes nos trilhos e, possivelmente, tinham um refém sob seu poder.

As informações dadas pelo coronel ainda não foram confirmadas oficialmente pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), que convocou a Comissão de Acidentes para apurar o ocorrido. Segundo Murilo Barros, gerente de estações do Metrô do Recife, o trecho onde aconteceu o acidente, entre as estações Joana Bezerra e Recife, no bairro de São José, é realmente considerado pela empresa o mais perigoso dos 70,5 quilômetros de linha férrea. Isso porque é o único ponto onde pode ser registrado o fluxo de quatro trens ao mesmo tempo, já que recebe composições das linhas Sul e Centro. A determinação, nesses casos, é apagar os faróis para não ofuscar os maquinistas.

Os dois fatores juntos aumentam o risco. Apesar de ser o ponto mais perigoso, o lugar carece de câmeras. Barros informou que há um contrato de R$ 9,2 milhões para instalação de 1,3 mil câmeras na linha centro e na sul. O serviço está em andamento. Barros disse, ainda, que os trens percorrem a maior parte dos 70,5 quilômetros de linha com os faróis acessos. A exceção se dá no cruzamento e também na chegada à plataforma onde ficam os passageiros. Isso acontece para não ofuscar a visibilidade do usuário e permitir que ele enxergue o destino do trem.

O caso será apurado em duas frentes. A Comissão de Acidentes da CBTU tem 30 dias para apresentar os resultados da apuração feita internamente. Por outro lado, o delegado Paulo Jean, da Delegacia de Delitos de Trânsito, também instaurou inquérito, mas somente irá se pronunciar ao final da investigações. A equipe do Instituto de Criminalística (IC) realizou perícia no local e tem o prazo de 15 dias para remeter os resultados ao delegado. Segundo Heldo Souza, perito do IC, o local do acidente tem trilhos em declive e visibilidade nula. A farda preta dos PMs também pode ter contribuído para a invisibilidade das vítimas.

Segundo Barros, um trem pesa 200 toneladas e percorre um espaço grande até parar quando o freio é acionado pelo maquinista. “Os trens podem andar até 70km/h, de acordo com normas do código de via. Acima disso, o trem é parado automaticamente. Os quilômetros percorridos após o freio vão variar de acordo com a velocidade do momento”, explicou. Ele disse também que toda a via tem muro de vedação para o metrô circular sem ofertar risco para a população. No entanto, moradores da vizinhança fazem buracos ao longo do muro para facilitar o percurso proibido.

“Lamentamos a fatalidade, nos solidarizamos com as famílias e com a PM, que é nossa parceira. Como se tratava de uma perseguição policial, eles poderiam entrar em qualquer lugar”, completou Barros.

O soldado Luciano Antônio Silva, 30, sofreu traumatismo no braço esquerdo e foi transferido, na manhã de ontem, do Hospital da Restauração para o Hospital Geral da Polícia Militar. Já o cabo Clécio Wagner dos Santos, 36, continua internado no HR. Ele sofreu traumatismo cranioencefálico leve, além de traumatismo raquimedular, ou seja, tem uma lesão grave na coluna. Ontem, Clécio foi submetido à cirurgia.

O comandante geral da Polícia Militar, coronel Vanildo Maranhão explicou que dois inquéritos estão sendo feitos o da Civil e o da PM. “Em até trinta dias nós vamos concluir o inquérito da PM. O mais importante agora é oferecer apoio às famílias”, afirmou.

Entenda o acidente
  • 4 trens passam ao mesmo tempo no trecho em que a tragédia ocorreu, entre as estações Recife e Joana Bezerra, o único com esse tipo de fluxo ao longo dos 70,5 km de linhas férreas
  • 4 policiais estavam no trecho, atendendo a uma denúncia, quando perceberam um trem vindo com os faróis acesos. Os PMs foram para a linha de sentido oposto para se proteger, mas terminaram sendo atingidos por outra composição, essa com as luzes apagadas. Dois morreram e dois se feriram.  
  • 200 toneladas é o peso médio de uma composição do Metrorec
  • 70 km/h era a velocidade praticada pelo trem