Guerra sem fim O combate ao crime organizado ligado ao tráfico de drogas no Rio de Janeiro volta hoje às telas do cinema com a estreia de Alemão

Júlio Cavani
juliocavani.pe@dabr.com.br

Publicação: 13/03/2014 03:00

 (PAPRICA FILMES/DIVULGACAO)

Se Tropa de elite 1 e 2 já soavam como uma espécie de continuação de Cidade de Deus, o filme Alemão, que estreia hoje no Brasil, funciona como uma sequência para aqueles acontecimentos. São projetos diferentes, que não foram criados pelos mesmos cineastas e produtores, mas que parecem fazer parte de uma mesma série de produtos. Somados a Cidade dos Homens, Morro dos Prazeres e Notícias de uma guerra particular, todos esses filmes reunidos traçam um panorama histórico sobre o crime organizado ligado ao tráfico de drogas no Rio de Janeiro.

No caso de Cidade de Deus, Tropa de elite e Cidade dos homens, a semelhança vai além da temática da violência urbana. São filmes que importam para o Brasil um ritmo e uma linguagem narrativa essencialmente hollywoodiana, com fortes elementos de cinema de ação e de guerra. Sem narração em off ou ironias, Alemão é mais cru e segue um estilo direto, concentrado mais na ação em si e nos dramas pessoais do que em explicações sobre o sistema. É uma outra proposta de cinema, apesar de ainda funcionar como sequência em relação à cronologia dos fatos históricos recentes.

O cenário, desta vez, é o Complexo do Alemão, no momento da ocupação militar de 2010, quando uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) foi implantada na comunidade. A direção é de José Eduardo Belmonte (Billi Pig). Caio Blat, Gabriel Braga Nunes, Otávio Muller, Cauã Reymond e Antônio Fagundes estão no elenco.

As equipes de produção de Cidade de Deus, Cidade dos homens e Tropa de elite têm nomes em comum, como Daniel Rezende (montagem), Lula Carvalho (câmera) e Bráulio Mantovani (roteiro). Alguns atores também são repetidos nesses filmes, como Seu Jorge, Douglas Silva e os irmãos Haagensen. Esses cruzamentos não se repetem em Alemão, que tem apenas o ator Milhem Cortaz (Tropa de elite) como elo com os demais.

Apesar de ser um documentário, Notícias de uma guerra particular antecipou tudo e tem pontos de ligação com as ficções, como os depoimentos do escritor Paulo Lins (autor do livro Cidade de Deus), do sociólogo Luiz Eduardo Soares (autor do livro Elite da tropa) e do policial Rodrigo Pimentel (uma das inspirações para o fictício Capitão Nascimento). Kátia Lund, uma das diretoras, também dirigiu Cidade de Deus, um episódio do seriado Cidade dos homens e o videoclipe A minha alma (2000), da banda
O Rappa, que inaugurou toda essa estética da favela-pop. Já Morro dos Prazeres, que não usa entrevistas, expõe as contradições das UPPs por meio de situações filmadas dentro daquela realidade, que representa o estágio mais recente do conflito até agora.

Cronologia

CAPÍTULO UM:
Cidade de Deus
O filme de Fernando Meirelles e Kátia Lund, lançado em 2002, retrata o início do crime organizado no Rio de Janeiro entre as décadas de 1960 e 1980, com o crescimento dos chefes do tráfico Mané Galinha, Cenoura, Bené, Zé Pequeno, que entram em guerra entre si, além de desenvolverem uma relação promíscua com a polícia. O roteiro é baseado no livro homônimo de Paulo Lins.

CAPÍTULO DOIS:
Notícias de uma guerra particular
Este documentário de 1999 dirigido por João Moreira Salles e Kátia Lund traça um panorama geral da questão do crime organizado no Rio com imagens de arquivo dos anos 1980, filmagens em locações reais e entrevistas com agentes da polícia, do tráfico e do Batalhão de Operações Especiais (Bope), além de crianças e presidiários.

CAPÍTULO TRÊS:
Tropa de elite
Vencedor do Urso de Ouro no Festival de Berlim em 2008, o filme de José Padilha mostra como funcionava o Bope na década de 1990 a partir da rotina de dois oficiais que são treinados pelo Capitão Nascimento. A violenta truculência dos métodos da instituição e a corrupção do sistema policial ganham ênfase na trama. É um verdadeiro filme de guerra.

CAPÍTULO QUATRO:
Cidade dos homens - A série e O filme
O seriado da Rede Globo retrata a rotina de duas crianças que crescem em um morro do Rio de Janeiro na primeira década dos anos 2000. Os problemas do tráfico fazem parte de seu cotidiano. Os meninos ficam mais velhos a cada temporada. A saga da dupla foi encerrada com o lançamento de um longa-metragem nos cinemas.

CAPÍTULO CINCO:
Tropa de elite 2
Maior sucesso de bilheteria do cinema brasileiro, com mais de 10 milhões de espectadores, o filme traz o Capitão Nascimento de volta, desta vez em um alto posto na Secretaria de Segurança do Rio. Agora é acrescentada a participação dos políticos nos esquemas do tráfico e discussões sobre direitos humanos nos presídios e o consumo de drogas pela classe média.

CAPÍTULO SEIS:
Alemão
Retrata a preparação para a invasão do Complexo do Alemão em uma operação conjunta entre o Exército, a Marinha e as forças policiais com a intenção de expulsar os traficantes e implantar uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) em 2010. O ponto de vista é o de cinco policiais infiltrados na favela e precisam se esconder em ao serem desmascarados por bandidos.

CAPÍTULO SETE:
Morro dos Prazeres
Lançado no Festival de Brasília em 2013 e ainda inédito no Recife, o documentário de Maria Augusta Ramos retrata o cotidiano de uma comunidade após a instalação de uma UPP. O filme foge de simplificações maniqueístas e mostra como a presença imposta do estado invade a privacidade e chega a humilhar os moradores. Ao mesmo tempo, os policiais são recebidos como intrusos.