Aconteceu, é caricatura
Acostumados a retratar temas espinhosos da história, artistas gráficos ilustram com picardia o cotidiano. Bienal Internacional resgata preciosidades do século 19
Luiza Maia
luizamaia.pe@dabr.com.br
Publicação: 09/04/2014 03:00
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Pioneirismo pernambucano: jornal O maribondo registra a primeira caricatura do Brasil |
Religião, futebol e, principalmente, política. Desde o ínicio do século 19, os caricaturistas brasileiros exploram temas espinhosos. Imortalizadas pela atualidade e universalidade dos temas, ilustrações dos primórdios da arte no Brasil podem ser vistas na 1ª Bienal Internacional da Caricatura, na Biblioteca Central da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), com coordenação do professor e chargista Clériston Andrade e design e editoração do material da exposição do chargista do Diario Samuca.
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A descoberta da primeira caricatura do país é um dos principais trunfos do livro História da caricatura brasileira - Os precursores e a consolidação da caricatura no Brasil (Editora Gala, R$ 120 - R$ 60, no local), do sociólogo e caricaturista Luciano Magno (pseudônimo de Lúcio Picanço Muruci), no qual a exposição é inspirada. A obra tem 700 imagens. A mostra, 40 painéis. “Selecionamos as mais significativas do período, tanto com relação aos autores quanto aos pasquins”, diz Samuca. Muruci vai à abertura, hoje, às 10h, e conversa sobre o processo de pesquisa. A Bienal promove mesas-redondas com humoristas gráficos, amanhã, e outra com a professora Valéria Bari, na sexta-feira, ambas às 10h.
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Mostra tem 40 painéis extraídos de livro considerado a principal publicação sobre o tema no país |
Serviço
1ª Bienal Internacional
da Caricatura
Onde: Biblioteca Central da UFPE
Quando: De hoje a 30 de abril
Entrada gratuita
Traços marcantes
Política
A caricatura política teve um papel proeminente no século 19, em Pernambuco e no Rio de Janeiro. Nos últimos 40 anos, desde o Pasquim, entre os artistas brasileiros, a charge é realmente o principal foco dos trabalhos.
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Outro tema recorrente no século 19 ainda presente nas produções contemporâneas é a tolerância religiosa. “Em 1870 e 1880, eles questionavam o monopólio da religião católica no Brasil. Outros cultos eram proibidos. Antes de tudo, busca-se a liberdade”, defende Muruci.
Caricatura de costumes
Nos primeiros 50 anos do século 20, havia muito a caricatura de costume, mundana, sobre modismos, relações pessoais, as mudanças da mulher na sociedade, que hoje se perdeu.
Politicamente correto
“Eu acho que a questão do politicamente correto envolve muito o teatro e a televisão, mas a caricatura é tão livre que você pode fazer um político representado como qualquer ser da natureza, antropomorfizado. A charge é libertária”, diz o autor de História da caricatura brasileira.
Editorial
Geralmente, acompanhando o desenho, havia o editorial. “Mesmo a Revista ilustrada (criada por Angelo Agostini, na década de 1870) vinha acompanhada de textos. Nessa época, eu diria que era meio a meio”, exemplifica Muruci. A contextualização era necessária para que o público entendesse, porque a comunicação não tinha a velocidade atual.
Minorias
A motivação da charge é, em geral, estar a serviço dos mais pobres e oprimidos, não de poderosos. Para o autor, “os chargistas são humoristas do desenho. A caricatura aponta como os erros são ridículos. A tendência é ter uma visão a favor do povo, contra regimes ditatoriais”.
Assinatura
Uma característica dos primeiros trabalhos é não ter nos pasquins autoria definida de forma clara. Para os artistas terem uma segurança maior, eles não se identificavam, como também durante a ditadura. Hoje, isso não é mais necessário.
Técnica
As primeiras caricaturas pernambucanas eram feitas em xilogravuras, muitas vezes por artesãos populares e cordelistas. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, a litogravura era dominante. Hoje, os meios gráficos computacionais são hegemônicos.