TELINHA » Disposta a mudanças

Publicação: 24/06/2015 03:00

Laís e Rafael: conto de Romeu e Julieta se mantém fiel à sinopse original da trama (ESTEVAM AVELLAR/ GLOBO)
Laís e Rafael: conto de Romeu e Julieta se mantém fiel à sinopse original da trama
Nesses tempos em que a intolerância dá sinais explícitos no cotidiano de um país conhecido pela boa convivência entre todos os credos e raças, saber ouvir é uma arte – quase um talento. Sorte de Luisa Arraes, quase 22 anos feitos, intérprete da mocinha evangélica da novela das 21h da Globo. Laís está entre as poucas personagens poupadas da desastrosa reforma operada em Babilônia, que sofreu uma série de alterações, em vão, justamente para se adequar à tolerância média da audiência. A mocinha da história e seu par – Rafael (Chay Suede), filho do casal lésbico – ainda fazem o folhetim valer a pena.

Laís é a estreia de Luisa em novelas. A considerar o histórico, até que demorou. Filha dos pernambucanos Virginia Cavendish (atriz) e Guel Arraes, diretor que esteve à frente das melhores manifestações de vanguarda da TV nas últimas quatro décadas, fez aparições dignas de figurante quando criança. Depois, sim, fez teatro, cinema, seriado (Louco por elas), mas novela, só agora. “A grande piada, quando eu era pequena, era: ‘não vai ser atriz, não vai ser atriz!’ Nunca houve essa pressão em cima de mim”, conta.

Diferentemente da personagem, criada em uma família evangélica que repudia a união homoafetiva, Luisa não segue religião alguma. Tem, no máximo, boas referências da fé que mobiliza multidões, com raízes fortes no religioso Recife e no Crato, no Ceará, terra do cultuado padrinho Padre Cícero. “Mas a gente brinca, eu e o Chay, que ele é a Laís e eu sou o Rafael, porque eu poderia muito bem ser filha de dois pais ou de duas mães”. Já o ator, ela confirma, foi criado numa família mais conservadora. (AE)

Entrevista >> Luisa Arraes

Como foi crescer no meio de uma família de artistas?
Meus pais nunca me deixaram trabalhar quando criança. Eles trabalham com isso e sabem como é. Eu não falava pra ninguém, mas queria muito. Eu pedia pra fazer parte das peças dos meus pais quando eu era pequena. Meu pai disse que eu lutei um ano por uma fala. Fiz a daminha de honra e uma pontinha na montagem de Lisbela e o prisioneiro, ao lado da mãe. Quando perguntei a meu pai se deu para ouvir o que dizia, ele respondeu: ‘Não deu muito não filha, mas tudo bem’. Ele nunca mentiu pra mim.

E como vê as descobertas da sua personagem?
Laís tem uma coisa linda. Ela aprendeu um negócio, a vida inteira, e está agora, na idade dela, reaprendendo tudo. Isso é de uma humildade muito linda, porque a quantidade de gente que acha que já sabe tudo, sabe? Tem uma frase dela pro Rafael que diz: ‘Eu não quero ser dessas pessoas que acham que sabem de tudo, eu não sei de nada’. É ela o tempo inteiro quebrando com tudo o que aprendeu e foi posto na cabeça dela, abrindo os olhos pra poder pensar como ela pela primeira vez. Acho esse movimento muito corajoso.

Qual foi a cena mais marcante até agora?
Toda a sequência que levou à cena do primeiro embate entre Laís e Rafael, quando ela descobriu que ele era filho de duas mães. A gente acabou a cena com dor na barriga. Fizemos uma cena com Fernanda (Montenegro), ela veio falar com a gente e ficamos chorando por horas, agarrados. A gente ensaiou antes, e falava ‘essa cena vai chegar!’ Quando acabou, ele falou assim pra mim: ‘pronto, agora eles estão mais íntimos do que se eles tivessem transado’.