Pais, filhos e construções Drama estrelado por Marco Ricca e rodado no Recife, "Paterno" explora e justapõe temas como gentrificação, corrupção e distanciamento familiar

André Guerra

Publicação: 07/08/2025 03:00


Há mais de 10 anos que o diretor e roteirista Marcelo Lordello, nascido em Brasília e radicado pernambucano, vem preparando o projeto de Paterno. Só em 2017, no entanto, o cineasta responsável também pelo elogiado Eles Voltam (2012) conseguiu filmar esse complexo e robusto roteiro que, de lá para cá, se tornou ainda mais urgente do que quando foi concebido. O longa entra hoje em cartaz nos cinemas do Recife, ao lado de outra estreia nacional prestigiada, o drama maternal A Melhor Mãe do Mundo, dirigido por Anna Muylaert (de Que Horas Ela Volta?), grande vencedor do 29º Cine-PE — Festival do Audiovisual de Melhor Filme e outras quatro categorias.

Em Paterno, todo ambientado na capital pernambucana, o empresário Sérgio (Marco Ricca) toca um empreendimento imobiliário ambicioso e inescrupuloso que visa parte da área de Brasília Teimosa. Com o pai à beira da morte no hospital e enfrentamentos tensos com seu irmão mais velho, Lucas (Nelson Baskerville), ele nem se dá conta de que sua ambição nos negócios o afasta cada vez mais de seu filho, Thomás (Guga Patriota). Ainda no elenco está o pernambucano Thomas Aquino, que interpreta Claudio, morador da região que vira um inesperado aliado do protagonista.

Explorando diferentes camadas do universo do empresariado, desde a política até a familiar, Paterno oferece mais conflitos sem resoluções do que respostas fáceis para o público. Marcelo Lordello, que se prepara para lançar em breve o seu terceiro longa, provisoriamente intitulado ‘Edificante’, opta por enquadramentos claustrofóbicos, grudando a câmera na parte interna de carros, apartamentos e escritórios, revelando pouco das ruas e do povo. A torre de marfim construída por esse pais ricos para seus filhos, afinal, os distancia paulatinamente do Recife/Brasil que existe e respira para além de seus casulos.

ATUALIDADE
“É muito triste que o filme tenha permanecido tão contemporâneo mesmo tendo sido escrito há mais de uma década, já que muitos aspectos tratados nele até pioraram”, comenta Lordello em entrevista exclusiva ao Viver. “Ao mesmo tempo, é bom que as pessoas estejam notando a importância de discutir os personagens masculinos dessa aristocracia corrupta, porque eles são os condutores de muito do que nos cerca e é fundamental entendermos suas mentalidades”, ressalta o cineasta.

“Sempre achei o roteiro muito maduro na forma como traz a questão da gentrificação, da política misturada com o empresariado e ainda a esfera pessoal desses mundo rico, tudo sem qualquer didatismo ou obviedade. Além disso, é um trabalho esteticamente de excelência mesmo”, elogia Marco Ricca, que destaca ainda a força e unidade do cinema recifense. “É um filme que tenho muito orgulho de ter feito parte, principalmente por ter visto de perto, durante o mês e meio que gravei no Recife, como o cinema dessa cidade é pulsante e como todos se conhecem e colaboram uns com os outros. Mesmo que esteja apenas no seu segundo longa, eu já considero Lordello um dos grandes”, exalta o ator.

Apesar do hiato entre a produção e o circuito comercial, Paterno chegou acompanhado por uma poderosa safra do cinema pernambucano, com O Último Azul, de Gabriel Mascaro, e O Agente Secreto, de Kleber Mendonça Filho, batendo na porta.