Entrevista // Fernanda Young Escritora, roteirista e atriz

Publicação: 13/06/2018 03:00

MEDO

Autodenominada “especialista em rejeição”, Fernanda Young não esconde o medo que sentiu ao escrever as palavras dispostas em seu novo livro, temendo ser mal interpretada. Caracteriza esse sentimento como “um lugar em que volto a ser aquela menina de 6 anos estranha e ignorada”. “Enquanto intelectual, não sou respeitada, muito porque não me prostro a beijar os pés dos coronéis da literatura e não hesito em assumir os erros do meu discurso. Mas o tempo tem sido gentil e tenho enfrentado uma boa jornada até aqui, baseada na minha liberdade. É aquela coisa: os cães ladram e a caravana passa”.

De acordo com ela, há um certo machismo pelo fato de ser uma escritora que não refuta a realidade de ser mulher. “Estou presente no fenômeno de ser quem eu sou. Não suporto quando vêm me perguntar quais são minhas autoras preferidas. Caguei! Entendo de literatura muito menos do que gostaria e acho um porre quando ficam buscando referências de outras em minha escrita, sem analisar a minha obra em si”, avisa.

Obra esta que Fernanda Young deve muito ao humor aliado à poesia e ao olhar anarquista. Apesar dos temas sinuosos abordados, ela se esquiva da inacessibilidade no que tange ao formato da publicação. Seus últimos livros: A mão esquerda de Vênus e Estragos são uma espécie de instalação artística, na qual o processo de escrita é exposto. Diferente disso, Pós-F não derrapa em outras linguagens e é, para ela, uma leitura fácil.

“Trata-se de um livro gentil. Gosto dele como objeto. Passei oito meses escrevendo e, durante esse processo, a editora Eugênia Ribas Vieira foi me pedindo uma série de desenhos, que, no final, foram incorporados à narrativa”, explica.

VADIA

Em março de 2015, a escritora foi alvo de um ataque de cunho sexual por meio de um perfil falso no Instagram. Xingada de “vadia lésbica”, recorreu à Justiça contra o agressor. “Fui assediada sexualmente e agredida verbalmente. Depois disso, consegui a identidade do indivíduo e enfrentei uma jornada longa e extenuante em tribunais para, no fim, o juiz roubar do agressor o seu papel”, critica.

Dois anos depois de Fernanda acionar a Justiça, o juiz Christopher Alexander Roisin, da 11ª Vara Cível de São Paulo, concordou que a intenção do agressor “era de insultar a autora” e o condenou a pagar indenização de R$ 5 mil por danos morais. O valor não tão expressivo, argumentou, levou em conta “o fato de a autora ter artisticamente posado nua, de modo que sua reputação é mais elástica.”

“Ao final do processo, fui punida”, comenta Young. “É aquela velha história: a pessoa que se veste com a minissaia, é a vítima, segue como culpada. Não posso passar por esse tipo de constrangimento porque fui agredida. Estou recorrendo e sei que será difícil, pois não tenho ‘amigos importantes’ para quem possa telefonar e resolver”, completa.

CANTADA

No quinto capítulo de Pós-F, com o controverso título Tudo agora é assédio, a autora relativiza o tema – “Tem assédio sim, mas temos que saber discernir”, escreve. E sai em defesa da cantada: “Se passo na rua hoje em dia, sofro bem menos, porque os homens, acho, estão mais educados, e sabem que não podem olhar para uma mulher e falar ‘gostosa’. Isso é assédio?”. A resposta, ela confessa ainda não ter.

“Sou uma pessoa privilegiada. Quando não se tem acesso ao mínimo, você não pode se dar ao direito de assuntos privilegiados. Assim, muitas mulheres passam por essa situação sem mesmo notar que estão sendo assediadas. Obviamente, dentro desses casos, temos que estar atentos”, conclui.