O roqueiro mais velho que o rock Serguei, um dos primeiros hippies brasileiros, morreu aos 85 anos, com muita história alucinante vivida

Publicação: 08/06/2019 03:00

Serguei era 18 anos mais velho que o rock. Em 1951, quando Ike Turner gravou Rocket 88, considerado por muitos o primeiro rock’n’roll da história, o carioca Sergio Augusto Bustamante já era maior de idade. O músico de 85 anos morreu na sexta-feira, no hospital Zilda Arns, em Volta Redonda. Ele havia sido internado ainda em Saquarema, onde vivia, no dia 6 de maio, com quadro de anemia, infecção e pneumonia, e estava desde o final do mês na CTI de Volta Redonda.

Nascido em 8 de novembro de 1933, filho único de um rico executivo da IBM e uma dona de casa, ganhou o apelido Serguei de um amigo russo. Ainda adolescente, vivia na ponte aérea Rio de Janeiro - Nova York. No Brasil, encantou-se por cantoras do rádio como Emilinha, Elizeth Cardoso e Ângela Maria. Nos States, presenciou o nascimento do rock de Little Richard, Elvis Presley e Chuck Berry.

Antes de se aventurar nos palcos, Sergio foi comissário de bordo da Panair e Varig. O emprego lhe rendeu viagens ao exterior e fluência em inglês e francês. Chegou a corrigir, para a musa Elizeth Cardoso, versões em francês de músicas brasileiras cantadas por ela na França. Mas a vida de aeromoço era careta demais para Serginho. Acabou despedido da Panair após festa em que derrubou uma garrafa de champanhe na cabeça da atriz italiana Gina Lollobrigida. “Aquele emprego não era para mim”, diria muitos anos depois. “Eu não nasci pra ser empregado de ninguém.”

Em meados dos anos 1960, começou a cantar em boates no Rio. Os olhos azuis e cabelos louros encantavam as mulheres. Entrava no palco “com maiô de aqualouco e uma bomba de flit na mão, para espantar os grilos da cabeça do público”. Dividiu palcos com Rogéria, Alcione, Miéle e Agildo Ribeiro. Foi um dos primeiros hippies brasileiros.

No fim dos anos 1960, estava nos EUA quando conheceu, por intermédio do percussionista brasileiro Laurindo Almeida, a cantora norte-americana Janis Joplin. Janis o levou para São Francisco, epicentro do mundo bicho-grilo. Serguei esteve no mitológico festival de Woodstock, em 1969, e conheceu Jimi Hendrix e Jim Morrison (The Doors).

Os três amigos de Serguei - Janis, Hendrix e Morrison - morreram num intervalo de dez meses, entre 1970 e 1971, todos de complicações decorrentes de abuso de drogas e álcool. Mas Serguei jura que nunca precisou de estimulantes: “Minha droga é o sexo”. E na hora do sexo, não tinha preconceitos: transava homens, mulheres, extraterrestres e até árvores, como relatou diversas vezes em entrevistas hilariantes.

Em meados dos anos 1970, Serguei mudou para Saquarema, cidade praiana no litoral do Rio, onde se tornou uma espécie de embaixador local. Sua casa, apelidada Templo do Rock, virou atração turística: fãs eram recebidos pelo próprio astro, que mostrava seus discos, álbuns de fotos, e contava altas histórias sobre sua vida de maluco-beleza.

Se as histórias eram verdadeiras, só o próprio Serguei sabia. O fato é que a criatividade do astro para contá-las deixava qualquer um perplexo.””Cada história tinha cinco ou seis versões diferentes”, lembra Paulo Roberto Andel, coautor, com Rodrigo Barros, de As alucinações de Serguei - A biografia do maior roqueiro brasileiro de todos os tempos.

O cantor participou de duas edições do Rock in Rio: fez um show solo em 1991 e uma participação no show de Sylvinho Blau Blau, em 2001, vestido de urso cor de rosa durante a música Meu ursinho Blau Blau. “O Axl Rose, do Guns’N’Roses, estava lá e disse que foi a coisa mais louca que ele já viu num palco”, contou Serguei. O que Axl Rose estava fazendo no show de Sylvinho Blau Blau, dez horas antes do show do Guns, até hoje ninguém sabe.