Violência nua, crua, brutal e nauseante

Publicação: 25/07/2019 03:00

Talvez exista outro filme recente tão desagradável, nauseante e violento como O Bar Luva Dourada, mas é difícil citar. O longa do alemão Fatih Akin ignora todos os códigos da sensibilidade atual ao exibir cenas de truculência espantosamente cruas, brutais, sobretudo contra mulheres. Uma enorme audácia. É a história (real) de Fritz Honka, serial killer dos anos 1970. Um sujeitinho corcunda, estrábico, de nariz torto, que frequentava o que havia de mais decadente na noite de Hamburgo. Sonhava com jovens burguesas, mas fazia sexo com meretrizes baratas, alcoólatras e mais velhas. Matou quatro delas, após rompantes de ira machista. Honka se enfurecia quando riam de sua inaptidão sexual. Escondia os corpos em casa, um antro de mau gosto e insalubridade, e atribuía o odor à comida dos vizinhos gregos.

Akin não poupa o espectador da sordidez daquele universo. Tudo é incômodo, abjeto. Os móveis e roupas setentistas têm o tom perfeito de cafonice, e as paredes sujas, infectas, dão ao filme um aspecto amarronzado, diarreico, que torna as imagens peculiarmente viscosas. Há, porém, algo de bizarramente fascinante nessa podridão. A estilização ajuda, assim como um humor inesperado aqui e ali. Mas o diferencial do longa é menos óbvio - e é o seu cerne. Mostra a humanidade de seres que mal se lembram de que são humanos.

Apesar da brutalidade (às vezes excessiva), há certa condescendência de Akin pelos personagens. Não se trata de perdoar falhas - aliás, todos pagam um preço alto o tempo todo por serem quem são. Mas o filme traz justamente um olhar a eles, mostrando a vida infernal desses desvalidos. São pessoas marginalizadas - velhas, feias, beberronas, miseráveis, sem saúde. E, sobretudo, solitárias. Gente que não interessa à sociedade. A violência do longa não só se justifica, é o que dá sentido.

Akin nunca tenta defender Honka - bem interpretado por Jonas Dassler - ou mesmo compreender o que o leva a ser monstruoso, não quer redimi-lo. Mas em alguns instantes, sua câmera se compadece do patético daquele ser, uma aberração física e moral. Que, ao seu modo torto, vive em busca de normalidade. E de prazer. (Folhapress)