Um cemitério criativo
Derivativo e produzido sob lógica episódica que impossibilita qualquer senso de perigo real, "A freira 2" faz o gênero do terror pagar seus pecados
André Guerra
andre.guerra@diariodepernambuco.com.br
Publicação: 07/09/2023 03:00
Financeiramente, a mais bem-sucedida série cinematográfica da história do terror, Invocação do mal começou a se transformar em um universo compartilhado antes mesmo de expandir o seu próprio cânone. O primeiro derivado da franquia, Annabelle, de 2014, estreou um ano depois do lançamento do filme original e não demorou muito para que Annabelle 2, Annabelle 3: De volta para casa, A freira e A maldição da Chorona ganhassem as telas.
Presumivelmente, o cuidado que o diretor e grande criador James Wan, responsável pelos dois primeiros Invocação do mal, teve com a saga principal transformou os projetos paralelos em produções pasteurizadas e descartáveis que utilizam figuras visualmente marcantes para reproduzir fórmulas em lógica de episódio.
Este A freira 2, em cartaz, sequência do spin-off lançado em 2018, representa exatamente esse sistema – estabelecido sobretudo pelo cinema de super-heróis – no qual os filmes se assemelham mais a teasers do que vem a seguir e menos fins em si. Michael Chaves, que dirigiu A maldição da chorona e o terceiro Invocação do mal, retornam à franquia trazendo de volta a irmã Irene (Taissa Farmiga), que no filme anterior parecia ter derrotado o demônio Valak em um convento amaldiçoado da Romênia. Agora em 1956, com o assassinato de um padre e sucessivas mortes misteriosas se espalhando por toda uma imensa região da França, é colocada sobre a personagem a incumbência de realizar outro milagre enfrentando novamente a criatura cuja forma mimetiza uma freira.
Reinvenção e originalidade nunca foram as marcas do universo estabelecido por James Wan, nem dos outros projetos do realizador fora dele. O seu maior mérito, no entanto, é firmeza com que se apropria das tradições do gênero para ambientar bem o terror, além da coragem em caracterizar os monstros e saber bem a hora de mostrá-los. Wan, em resumo, é um grande executor dos clichês narrativos e criou nos dois primeiros filmes de Invocação do mal algumas sequências particularmente aterradoras.
Ainda que Michael Chaves tenha qualidades na condução do terceiro Invocação.., o seu trabalho aqui em A freira 2 é quase tão protocolar e sem inspiração quanto o de Gary Dauberman no antecessor. Dividido em dois núcleos, este capítulo tem uma história tão convencional que a ânsia da plateia para que algo graficamente interessante apareça é ainda maior do que nas inserções prévias da saga – o que torna altamente frustrante que as coisas demorem demais a acontecer. E, quando algo potencialmente forte ameaça crescer na imagem, o projeto prioriza o susto e joga fora a instalação do clima de pavor.
Jonas Bloquet, ator carismático que volta ao personagem Maurice, tenta dar alguma singularidade a um desses núcleos, ao lado da também agradável Anna Popplewell, como Marcela, professora do convento. Mas todos que aparecem nesses filmes derivados representam sempre funções pré-determinadas: já sabemos que algum deles ficará possuído (o próprio longa anterior anunciou quem) e que os demais podem se tornar peças importantes para projetos futuros.
Impera aqui, mais uma vez, a lógica algorítmica que impede os filmes ganhem vida para além de seus universos e domestica experiências que deveriam provocar medo e sensação ilusória de insegurança.
Foi divulgado há meses que este seria o episódio mais violento da série e, do ponto de vista do que ele representa para o gênero num ano já pouco prolífero, talvez seja mesmo. Aqui, no cemitério de ideias que o universo virou, o terror é quem paga seus pecados.
Presumivelmente, o cuidado que o diretor e grande criador James Wan, responsável pelos dois primeiros Invocação do mal, teve com a saga principal transformou os projetos paralelos em produções pasteurizadas e descartáveis que utilizam figuras visualmente marcantes para reproduzir fórmulas em lógica de episódio.
Este A freira 2, em cartaz, sequência do spin-off lançado em 2018, representa exatamente esse sistema – estabelecido sobretudo pelo cinema de super-heróis – no qual os filmes se assemelham mais a teasers do que vem a seguir e menos fins em si. Michael Chaves, que dirigiu A maldição da chorona e o terceiro Invocação do mal, retornam à franquia trazendo de volta a irmã Irene (Taissa Farmiga), que no filme anterior parecia ter derrotado o demônio Valak em um convento amaldiçoado da Romênia. Agora em 1956, com o assassinato de um padre e sucessivas mortes misteriosas se espalhando por toda uma imensa região da França, é colocada sobre a personagem a incumbência de realizar outro milagre enfrentando novamente a criatura cuja forma mimetiza uma freira.
Reinvenção e originalidade nunca foram as marcas do universo estabelecido por James Wan, nem dos outros projetos do realizador fora dele. O seu maior mérito, no entanto, é firmeza com que se apropria das tradições do gênero para ambientar bem o terror, além da coragem em caracterizar os monstros e saber bem a hora de mostrá-los. Wan, em resumo, é um grande executor dos clichês narrativos e criou nos dois primeiros filmes de Invocação do mal algumas sequências particularmente aterradoras.
Ainda que Michael Chaves tenha qualidades na condução do terceiro Invocação.., o seu trabalho aqui em A freira 2 é quase tão protocolar e sem inspiração quanto o de Gary Dauberman no antecessor. Dividido em dois núcleos, este capítulo tem uma história tão convencional que a ânsia da plateia para que algo graficamente interessante apareça é ainda maior do que nas inserções prévias da saga – o que torna altamente frustrante que as coisas demorem demais a acontecer. E, quando algo potencialmente forte ameaça crescer na imagem, o projeto prioriza o susto e joga fora a instalação do clima de pavor.
Jonas Bloquet, ator carismático que volta ao personagem Maurice, tenta dar alguma singularidade a um desses núcleos, ao lado da também agradável Anna Popplewell, como Marcela, professora do convento. Mas todos que aparecem nesses filmes derivados representam sempre funções pré-determinadas: já sabemos que algum deles ficará possuído (o próprio longa anterior anunciou quem) e que os demais podem se tornar peças importantes para projetos futuros.
Impera aqui, mais uma vez, a lógica algorítmica que impede os filmes ganhem vida para além de seus universos e domestica experiências que deveriam provocar medo e sensação ilusória de insegurança.
Foi divulgado há meses que este seria o episódio mais violento da série e, do ponto de vista do que ele representa para o gênero num ano já pouco prolífero, talvez seja mesmo. Aqui, no cemitério de ideias que o universo virou, o terror é quem paga seus pecados.