Um conto de fadas (des)encantado A história de Lily Braun, canção de Chico Buarque e Edu Lobo, é adaptada para peça musical

Allan Lopes

Publicação: 10/07/2024 03:00

Os desejos, amores, desamores e traumas que marcam a vida de Lily Braun despertaram o interesse de Chico Buarque em 1982. Embora apareça como uma figura secundária no poema O Grande Circo Místico, de Jorge de Lima, onde é apenas uma cantora de casas noturnas, ela é tratada como protagonista em toda sua complexidade na música A História de Lily Braun, uma colaboração entre Chico Buarque e Edu Lobo. Além de conquistar multidões com sua voz cheia de paixão e mistério, Lily transita entre gerações e diversas formas artes, tendo sua história narrada em textos, músicas e apresentações teatrais.  

No ambiente cativante de um cabaré na década de 1920, Lily Braun brilha como uma estrela única e independente, imersa na atmosfera sedutora do palco e distante dos enredos românticos que povoam a vida dos outros. O coração de Lily permane resistente à ideia de se render a um único amor. Em certo momento, no entanto, ousa acreditar que o amor pode ser a resposta para a felicidade. Assim, a cantora decide se casar com o homem dos seus sonhos. Porém, o que parecia um conto de fadas rapidamente se desfaz.

A perspectiva buarquiana sobre o conto de fadas melancólico torna-se tema do espetáculo musical LILY, produzido pela Escola Pina Ballet Hall, um espaço de dança e formação de bailarinos no Recife, credenciado pela Royal Academy of Dance, uma das instituições mais prestigiadas do mundo sediada na Inglaterra. A apresentação ocorre no dia 21 de agosto, às 20h, no Teatro Luiz Mendonça.

Das luzes do palco à escuridão sufocante de um relacionamento tóxico, a jornada de Lily (Amanda Domingos) em busca da verdadeira felicidade ao lado de seu marido (Ângelo Cristóvão) é retratada nos passos de jazz sob a direção de Valério Cristóvão e o roteiro de Montez Oliveira. “Ela passa a compreender seus limites, identifica o que lhe faz bem e o que a define, e começa a entender o que a motiva a viver. Este é um retrato de muitas mulheres que, por vezes, precisam deixar de lado sonhos, amores e profissões para cuidar de uma relação, de um casamento, de uma casa, entre outras responsabilidades”, comenta Valério. O elenco conta com 44 bailarinos da Escola Pina Ballet Hall.

LILY é dividido em dois atos, cada um com uma estética musical específica. No primeiro, que narra a vida de Lily no Dancing - o cabaré onde ela se apresentava - as performances são embaladas por artistas como Liniker e Luísa Sonza, que trazem um toque contemporâneo. Já na segunda parte, focada em sua vida matrimonial, predominam clássicos da MPB, como as canções de Chico Buarque e Maria Bethânia.  Segundo Valério, a montagem da trilha sonora foi o maior desafio no processo de criação do espetáculo.”O Brasil é muito rico musicalmente, então havia muitas possibilidades a serem exploradas. Acredito que consegui encontrar o caminho certo”.

A composição de Chico Buarque e Edu Lobo fez parte da trilha sonora do espetáculo O Grande Circo Místico, em 1983. A produção combinava elementos musicais, ópera, dança, teatro e poesia para narrar a história de uma família austríaca proprietária de um circo, cujo herdeiro, Oto Frederico Kniep, era o apaixonado admirador de Lily Braun. Essa foi apenas uma das referências incorporadas na estética e coreografia da peça musical da Escola Pina Ballet Hall.

O diretor guarda na memória o instrumental de A História de Lily Braun desde a juventude, quando conheceu a versão de Maria Gadú através de sua irmã. Durante a adolescência, sua paixão pela MPB cresceu à medida que se imergia no universo de O Grande Circo Místico. “O que mais me admira na canção é como ela é construída; o uso de cada palavra é tão bem colocado que realmente conseguimos visualizar a história, imaginando Lily e o ambiente ao seu redor. A música conta uma história completa, com começo, meio e fim”.