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Quando a riqueza está dentro de uma sala de aula
Aluno aplicado, Anísio optou pela vida acadêmica ao se formar em engenharia
ANAMARIA NASCIMENTO
anamaria.nascimento@diariodepernambuco.com.br
Publicação: 02/12/2017 03:00
O gosto pela leitura surgiu logo cedo. A mãe, Teresa Freitas, professora primária no Colégio Henrique Dias, de Garanhuns, o incentivava a ler tomando emprestados os livros da professora Luzinete Laporte. Criou o hábito de ler com obras de Jorge Amado, Érico Veríssimo, Machado de Assis, Liev Tolstói e Fiódor Dostoiévski. Ali, o menino Anísio Brasileiro, vencedor do Prêmio Orgulho de Pernambuco na categoria educação superior, nem sonhava em ser o reitor da principal instituição de ensino superior do Norte e Nordeste: a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Quando nasceu, em 4 de setembro de 1954, em Garanhuns, Agreste do estado, a UFPE tinha apenas oito anos de existência. Na época, funcionava apenas no Recife. Hoje, a universidade conta com três campi: na capital, em Vitória de Santo Antão e Caruaru. A UFPE tem dimensões comparáveis às de cidades da Região Metropolitana do Recife, com uma comunidade universitária formada por mais de 50 mil estudantes, servidores e professores. Se fosse uma cidade, teria mais habitantes que Itapissuma (24 mil) e Araçoiaba (17 mil), por exemplo.
À frente da instituição está o garanhuense apaixonado por livros e por ensinar. O gosto pelos estudos do engenheiro civil que se define como uma pessoa “de um família típica do interior” o fez passar com nota 10 em todos os exames de admissão no Colégio Diocesano de Garanhuns, um dos mais tradicionais do estado. “Tive ótimos professores no Diocesano, como Tarsila, Maria José Miranda, Carlos, José Vitor”, diz, sempre se referindo aos “mestres” e a quem o incentivou.
Do pai, o proprietário rural natural de Correntes, Anísio Brasileiro Dourado recebeu o nome. Da mãe, recebia os clássicos da literatura para estudar. Com os três irmãos homens, frequentou o Diocesano, como fez o pai, que lá fez o curso de contabilidade. As duas irmãs frequentaram o Colégio Santa Sofia, onde a mãe havia estudado. “Sempre me preparei para fazer o vestibular. Como era muito bom em matemática, foi natural fazer engenharia civil”, conta.
Entrou na UFPE como aluno em 1973. “Diga-se de passagem, quase toda a minha turma passou sem fazer cursinho. Devemos isso ao padre Adelmar (da Mota Valença, que dirigiu o Diocesano por 44 anos)”, reconhece. Durante a gradução, no Recife, voltava sempre a Garanhuns. O motivo era especial. Ia visitar a namorada Socorro Valença, com quem é casado e tem dois filhos, Marcelo e Nathália. “Ainda na graduação me envolvi muito com o Diretório Acadêmico e fiz parte da chapa Mutirão, que contribuiu para reabrir o DCE, fechado pela ditadura”, recorda.
Na época, conciliava o curso com as aulas de matemática e física que dava nas escolas do entorno da UFPE. Morou na Casa do Estudante, almoçava no Restaurante Universitário e estudava na Biblioteca Central. “Essas vivências me fizeram entender o valor da UFPE. A minha adesão ao modelo do ensino gratuito e de alta qualidade e o impacto que isso tem na vida de uma pessoa não é um sentimento abstrato, mas algo concreto, que mudou a minha vida e a de muitos milhares de outras pessoas”, pontua.
Ao terminar o curso de engenharia, viu-se diante de uma encruzilhada: tinha uma excelente proposta de emprego e uma oportunidade de fazer mestrado, com bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superio (Capes), já com contrato provisório com a UFPE. Optou pela carreira acadêmica. “Fui, com um grupo de colegas recém-graduados, fazer mestrado na UFRJ (Universidade Federal do Rio) e na PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Rio de Janeiro.”
No grupo também estava o ex-reitor da UFPE Amaro Lins. Com o título de mestre, retornou ao Recife, onde viveu intensamente a UFPE de 1981 a 1986. “Mais uma vez, confirmei a percepção que o sucesso e o bem-estar de minha vida tinha relação direta com minha opção por ser servidor público e me tornar professor universitário”, revela.
Concluiu, em 1991, o doutorado em Transportes pela École Nationale des Ponts et Chaussées. Em 2000, o pós-doutorado no Laboratoire Téchniques, Territoires et Société (LATTS), associado à École Nationale des Ponts et Chaussées, Université Marne La Valée et Université Paris XI. Os títulos se somam a um que não rejeita: o de professor. Mesmo reitor, não deixou a sala de aula. Ensina, até hoje, na pós-graduação da UFPE. “Quem escolhe ser professor sabe que é nesse espaço da sala de aula que a nossa atividade ganha mais sentido, fica mais rica”.
Espaço para as vozes da UFPE
Um reitor que amou a UFPE. É assim que Anísio Brasileiro quer ser lembrado quando deixar o comando da instituição, em 2019. Com 60,39% dos votos válidos, foi reeleito, em 2015, pela comunidade acadêmica. “Seria pretensioso da minha parte definir, a priore, como nossa gestão será lembrada no futuro. O que posso dizer é que nosso propósito sempre foi o de garantir que todas as vozes da UFPE se manifestassem”, garante.
A decisão de concorrer ao cargo mais alto da instituição não foi tomada sozinha. “Esse tipo de decisão nunca é individual. É sempre fruto de um trabalho coletivo, de um projeto que envolve dezenas, talvez centenas de pessoas”, diz. O convite do ex-reitor Amaro Lins para assumir a Pró-reitoria de Extensão foi o primeiro incentivo. Em seguida, foi pró-reitor de Pesquisa e Pós-gradução. “Nesse contexto, a decisão de me candidatar a reitor foi construída natural e coletivamente, como resultado de um longo processo de maturação e de experiência acadêmica e como gestor”, ressalta.
No sexto ano de mandato, reconhece os desafios atuais da instituição, mas não deixa de pontuar o que já fez pela universidade. “Depois de 40 anos, a UFPE finalmente tem um novo estatuto, muito mais moderno, muito mais coerente com as mudanças ocorridas na sociedade. Fortalecemos também nossos cursos de graduação e pós-graduação, garantindo ótimas avaliações, que nos colocam disparados na vanguarda das universidades brasileiras”, destaca.
Para os próximos anos, espera fortalecer as cooperações em pesquisa, desenvolvimento e inovação, buscando maior interação com empresas nacionais e internacionais. “Se eu pudesse resumir, diria que nossa agenda vai priorizar, nos próximos meses, o fortalecimento da qualidade dos cursos de graduação, incluindo a formação massiva em idiomas (inglês, espanhol, francês e mandarim); rever as estruturas das áreas básicas da engenharia, para adaptá-las a um ensino profissional dinâmico e inovador; intensificar o uso da Educação a Distância (EaD) e criar bacharelados interdisciplinares”, enumera.
Saber dessas responsabilidades e ser reitor da universidade onde estudou e a qual dedicou toda a vida acadêmica é uma honra, diz. “Meu papel é buscar, com diálogo permanente, sintetizar os esforços (dos mais de 50 mil que formam a comunidade acadêmica), pautando a gestão pelos princípios que nos orientam desde sempre: a democracia, a responsabilidade social, o respeito pelas minorias, a busca pela tolerância, a qualidade da formação em todos os cursos e em todos os níveis. Ser reitor da UFPE, para mim, é uma honra e, ao mesmo tempo, uma enorme responsabilidade.”
Quando nasceu, em 4 de setembro de 1954, em Garanhuns, Agreste do estado, a UFPE tinha apenas oito anos de existência. Na época, funcionava apenas no Recife. Hoje, a universidade conta com três campi: na capital, em Vitória de Santo Antão e Caruaru. A UFPE tem dimensões comparáveis às de cidades da Região Metropolitana do Recife, com uma comunidade universitária formada por mais de 50 mil estudantes, servidores e professores. Se fosse uma cidade, teria mais habitantes que Itapissuma (24 mil) e Araçoiaba (17 mil), por exemplo.
À frente da instituição está o garanhuense apaixonado por livros e por ensinar. O gosto pelos estudos do engenheiro civil que se define como uma pessoa “de um família típica do interior” o fez passar com nota 10 em todos os exames de admissão no Colégio Diocesano de Garanhuns, um dos mais tradicionais do estado. “Tive ótimos professores no Diocesano, como Tarsila, Maria José Miranda, Carlos, José Vitor”, diz, sempre se referindo aos “mestres” e a quem o incentivou.
Do pai, o proprietário rural natural de Correntes, Anísio Brasileiro Dourado recebeu o nome. Da mãe, recebia os clássicos da literatura para estudar. Com os três irmãos homens, frequentou o Diocesano, como fez o pai, que lá fez o curso de contabilidade. As duas irmãs frequentaram o Colégio Santa Sofia, onde a mãe havia estudado. “Sempre me preparei para fazer o vestibular. Como era muito bom em matemática, foi natural fazer engenharia civil”, conta.
Entrou na UFPE como aluno em 1973. “Diga-se de passagem, quase toda a minha turma passou sem fazer cursinho. Devemos isso ao padre Adelmar (da Mota Valença, que dirigiu o Diocesano por 44 anos)”, reconhece. Durante a gradução, no Recife, voltava sempre a Garanhuns. O motivo era especial. Ia visitar a namorada Socorro Valença, com quem é casado e tem dois filhos, Marcelo e Nathália. “Ainda na graduação me envolvi muito com o Diretório Acadêmico e fiz parte da chapa Mutirão, que contribuiu para reabrir o DCE, fechado pela ditadura”, recorda.
Na época, conciliava o curso com as aulas de matemática e física que dava nas escolas do entorno da UFPE. Morou na Casa do Estudante, almoçava no Restaurante Universitário e estudava na Biblioteca Central. “Essas vivências me fizeram entender o valor da UFPE. A minha adesão ao modelo do ensino gratuito e de alta qualidade e o impacto que isso tem na vida de uma pessoa não é um sentimento abstrato, mas algo concreto, que mudou a minha vida e a de muitos milhares de outras pessoas”, pontua.
Ao terminar o curso de engenharia, viu-se diante de uma encruzilhada: tinha uma excelente proposta de emprego e uma oportunidade de fazer mestrado, com bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superio (Capes), já com contrato provisório com a UFPE. Optou pela carreira acadêmica. “Fui, com um grupo de colegas recém-graduados, fazer mestrado na UFRJ (Universidade Federal do Rio) e na PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Rio de Janeiro.”
No grupo também estava o ex-reitor da UFPE Amaro Lins. Com o título de mestre, retornou ao Recife, onde viveu intensamente a UFPE de 1981 a 1986. “Mais uma vez, confirmei a percepção que o sucesso e o bem-estar de minha vida tinha relação direta com minha opção por ser servidor público e me tornar professor universitário”, revela.
Concluiu, em 1991, o doutorado em Transportes pela École Nationale des Ponts et Chaussées. Em 2000, o pós-doutorado no Laboratoire Téchniques, Territoires et Société (LATTS), associado à École Nationale des Ponts et Chaussées, Université Marne La Valée et Université Paris XI. Os títulos se somam a um que não rejeita: o de professor. Mesmo reitor, não deixou a sala de aula. Ensina, até hoje, na pós-graduação da UFPE. “Quem escolhe ser professor sabe que é nesse espaço da sala de aula que a nossa atividade ganha mais sentido, fica mais rica”.
Espaço para as vozes da UFPE
Um reitor que amou a UFPE. É assim que Anísio Brasileiro quer ser lembrado quando deixar o comando da instituição, em 2019. Com 60,39% dos votos válidos, foi reeleito, em 2015, pela comunidade acadêmica. “Seria pretensioso da minha parte definir, a priore, como nossa gestão será lembrada no futuro. O que posso dizer é que nosso propósito sempre foi o de garantir que todas as vozes da UFPE se manifestassem”, garante.
A decisão de concorrer ao cargo mais alto da instituição não foi tomada sozinha. “Esse tipo de decisão nunca é individual. É sempre fruto de um trabalho coletivo, de um projeto que envolve dezenas, talvez centenas de pessoas”, diz. O convite do ex-reitor Amaro Lins para assumir a Pró-reitoria de Extensão foi o primeiro incentivo. Em seguida, foi pró-reitor de Pesquisa e Pós-gradução. “Nesse contexto, a decisão de me candidatar a reitor foi construída natural e coletivamente, como resultado de um longo processo de maturação e de experiência acadêmica e como gestor”, ressalta.
No sexto ano de mandato, reconhece os desafios atuais da instituição, mas não deixa de pontuar o que já fez pela universidade. “Depois de 40 anos, a UFPE finalmente tem um novo estatuto, muito mais moderno, muito mais coerente com as mudanças ocorridas na sociedade. Fortalecemos também nossos cursos de graduação e pós-graduação, garantindo ótimas avaliações, que nos colocam disparados na vanguarda das universidades brasileiras”, destaca.
Para os próximos anos, espera fortalecer as cooperações em pesquisa, desenvolvimento e inovação, buscando maior interação com empresas nacionais e internacionais. “Se eu pudesse resumir, diria que nossa agenda vai priorizar, nos próximos meses, o fortalecimento da qualidade dos cursos de graduação, incluindo a formação massiva em idiomas (inglês, espanhol, francês e mandarim); rever as estruturas das áreas básicas da engenharia, para adaptá-las a um ensino profissional dinâmico e inovador; intensificar o uso da Educação a Distância (EaD) e criar bacharelados interdisciplinares”, enumera.
Saber dessas responsabilidades e ser reitor da universidade onde estudou e a qual dedicou toda a vida acadêmica é uma honra, diz. “Meu papel é buscar, com diálogo permanente, sintetizar os esforços (dos mais de 50 mil que formam a comunidade acadêmica), pautando a gestão pelos princípios que nos orientam desde sempre: a democracia, a responsabilidade social, o respeito pelas minorias, a busca pela tolerância, a qualidade da formação em todos os cursos e em todos os níveis. Ser reitor da UFPE, para mim, é uma honra e, ao mesmo tempo, uma enorme responsabilidade.”
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