De inimigo a aliado na prevenção Genes podem determinar maior risco de câncer hereditário, mas também facilitam que a doença seja evitada

Publicação: 20/01/2018 03:00

ALICE DE SOUZA
alice.souza@diariodepernambuco.com.br

Seis casos de câncer hereditário são registrados por dia em Pernambuco. Da estimativa do Instituto Nacional do Câncer (Inca) de cerca de 22 mil diagnósticos de câncer anuais no estado, 10% ocorrem em pessoas que nascem com alterações ou mutações genéticas herdadas via parentesco. Esse fator pode alterar a precocidade e a forma como o tumor se apresenta e predispor o surgimento de outros cânceres. Contudo, também pode ser uma arma para se prevenir de forma mais eficaz, principalmente com a expansão dos serviços de aconselhamento genético.
O câncer hereditário ocorre quando a pessoa nasce com uma alteração em uma cópia dos chamados genes de controle de danos, cuja função é proteger o organismo contra o câncer. Dos cerca de 20 mil genes que compõem o genoma humano, cerca de 100 têm essa função. Mas nem toda pessoa com histórico de neoplasia na família desenvolverá a enfermidade. “Se existe uma falha, existe uma vulnerabilidade maior, mas não é certeza de que o indivíduo vá manifestar a doença. Existem genes com risco altíssimo e outros com risco moderado”, explica o responsável pelo serviço de oncogenética do Instituto de Oncologia do Real Hospital Português, Diogo Soares.
O médico geneticista, que também é titular do departamento de oncogenética do A.C Camargo Câncer Center e do Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, afirma que a medicina ainda não consegue afirmar com 100% de precisão se o paciente terá câncer, mas existem formas de dimensionar o percentual de risco. São os chamados aconselhamentos genéticos, avaliações realizadas por especialistas a partir de testes genéticos, que permitem atuar de forma precoce na prevenção e evitar o desenvolvimento do câncer.
Esses testes são recomendados em dois tipos de situação. A primeira delas é para identificar, dentro do universo de pessoas com câncer, fatores de hereditariedade e estabelecer estratégias para reduzir o risco de novos tumores. São importantes no caso de tumores com relação entre si, como os de ovário e mama, em situações de ocorrência de tumores de mama antes dos 50 anos, de intestino antes dos 40 anos, e da ocorrência de tipos específicos de câncer, como estômago difuso, retinoblastoma nos dois olhos ou carcinoma medular de tireoide.
A segunda recomendação é para pessoas nunca diagnosticadas com a doença, mas que têm histórico na família. “Uma das características clássicas é que o câncer hereditário não pula gerações”, acrescenta Diogo Soares. Por isso, devem estar atentos aqueles com histórico em parentes de segundo e primeiro grau.
No processo de aconselhamento genético, é feita entrevista com o paciente para investigação dos hábitos, comorbidades, casos entre familiares e outros fatores que podem contribuir para o aparecimento da doença. Só depois disso é avaliado se o teste genético é indicado. “Se for, é feita coleta de amostra biológica (sangue ou saliva). Então, é realizada uma extração do DNA, comparado com o de uma pessoa saudável e verificada a existência de alterações”, detalha Diogo Soares. A análise dura entre 15 e 40 dias, a depender do laboratório. Com os resultados, podem ser definidos métodos de prevenção personalizados, que vão desde o uso de medicamento até a realização de cirurgias.