ENTREVISTA // GUSTAVO WANDERLEY » Os homens precisam cuidar mais da saúde Presidente da Sociedade Brasileira de Urologia em Pernambuco chama atenção para importância da prevenção

Pedro Cunha | pedrocunha.jornalismo@gmail.com

Publicação: 11/11/2017 03:00


Estimativas do Instituto Nacional do Câncer (Inca) mostram que mais de 60 mil homens serão diagnosticados com câncer de próstata neste ano. Em Pernambuco, pode chegar a quase três mil novos casos, o que coloca o estado com a maior taxa de incidência do Nordeste. Segundo a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), 20% dos pacientes descobrem a doença em estágios avançados, o que faz com que a taxa de mortalidade chegue a 25%. No entanto, um diagnóstico precoce leva a 90% de chance de cura. Para isso, é necessária a realização dos exames de Antígeno Prostático Específico (PSA) e toque, que ainda é alvo de  preconceito. E é para conscientizar os homens que o mês de novembro ganha uma cor especial. A campanha Novembro Azul se esmera em alertar não apenas sobre a prevenção ao câncer de próstata, mas também convidar o público masculino a cuidar mais da saúde de maneira geral. Para o presidente  da Sociedade Brasileira de Urologia em Pernambuco, Gustavo Wanderley, ao contrário das mulheres, os homens ainda não incorporaram a prevenção e os cuidados no dia a dia e, por isso, acabam adoecendo mais. Nesta entrevista ao Diario, o especialista propõe uma reflexão sobre as principais doenças urológicas que podem afetar o homem ao longo da vida. O urologista também esclarece alguns temas, como andropausa, reposição hormonal e disfunção erétil que, juntamente com as doenças da próstata, serão enfocados durante a 4ª Jornada Pernambucana de Urologia e o XII Congresso Norte-Nordeste de Urologia, que serão realizados de 16 a 18 de novembro no Summerville, em Porto de Galinhas.

Por que a presença do homem é ainda pequena nos centros de saúde?
As razões são diversas e as “desculpas” para este comportamento dos homens vão desde questões culturais até mesmo questões financeiras. Essas questões culturais poderiam ser  justificadas pela socialização que as mulheres recebem, desde cedo, para reproduzirem e consolidarem os papéis que as tornam responsáveis, quase que exclusivamente, pela manutenção das relações de cuidados e pela prestação de serviços aos outros. O mesmo não acontece com os homens. Outra razão apontada pelo público masculino é a impossibilidade de “faltar” ao trabalho para ir ao serviço de saúde. A vergonha de expor o corpo também é atribuída como causa desta falta de procura pelo atendimento médico. Por fim, a falta de serviços especializados na saúde do homem também é fator determinante.

Dados do IBGE mostram que os homens estão vivendo cerca de sete anos a menos do que as mulheres. Quais as doenças que mais estão matando os homens?
A população masculina é a mais acometida por doenças crônicas, entre elas diabetes, hipertensão e obesidade. Hábitos danosos à saúde como fumo e ingestão de álcool são mais frequentes nos homens quando comparados com as mulheres.

Nenhum homem pode deixar de se preocupar com a próstata. Por que o alerta é mais direcionado aos que possuem idade a partir dos 40 anos?
A próstata é uma glândula que está presente nos homens e os problemas podem começar a aparecer a partir dos 40 anos. O crescimento deste órgão na idade mais madura pode vir a causar uma série de transtornos e os sintomas podem incomodar e alterar bastante os hábitos de vida. Esses problemas podem ser relacionados com o crescimento benigno da próstata ou com o câncer de próstata. Deste modo, a Sociedade Brasileira de Urologia recomenda que os homens sejam avaliados por um urologista a partir dos 50 anos ou aos 45 quando apresentam fatores de risco para o câncer de próstata, como parentes com histórico da doença e obesos.

Muitos não fazem o exame da próstata por machismo, mesmo sabendo do risco que correm. Como é feito o exame?
O exame de check-up da próstata é feito com a dosagem de exame de sangue, chamado de PSA, e o toque retal. O ultrassom pode ser utilizado na definição do tamanho da próstata e na detecção de outras doenças associadas. O exame do toque é indolor, dura poucos segundos e muito necessário.

Quais as consequências da descoberta de um câncer de próstata tardiamente?
Quando o paciente é diagnosticado tardiamente, ele terá menores possibilidades de cura. Se você detecta precocemente, as chances chegam a 90%. Quando o diagnóstico é tardio, diminuem as possibilidades de tratamento com fins curativos, restando, muitas vezes, apenas a paliação. Se nota, nessas situações, que a doença pode já se encontrar numa fase adiantada, causando dificuldade para urinar, sangramento urinário e já começa a invadir outras estruturas, como o reto, podendo espalhar para ossos, pulmão...

Por que os homens negros têm uma tendência maior a ter câncer de próstata?
Não se sabe. É um fator genético, com certeza, mas não se sabe o porquê. Da mesma forma, o câncer de próstata é menos frequente nos asiáticos. Acredita-se que tem muito a ver com a dieta e estilo de vida, porque no Japão, por exemplo, se come muito pouca gordura animal, a alimentação é baseada muito em vegetal. No dois casos, é provável que tenha a ver com hábito de vida e genética.

Sabemos que o câncer de próstata não é o único dilema dos homens, principalmente para aqueles que abusam do sobrepeso e do cigarro. Quais as suas recomendações para que se tenha mais qualidade de vida?
As doenças crônicas como diabetes, hipertensão, câncer em outros órgãos são também problemas que ajudam a diminuir a expectativa de vida dos homens quando comparados às mulheres. A procura pela medicina preventiva e a melhoria no estilo de vida são essenciais para se buscar um aumento na expectativa de vida. Exercícios físicos rotineiros, redução de peso e não fumar já pode ser um bom começo.
O homem se torna infértil com o passar da idade?
O homem, diferentemente da mulher, mantém sua capacidade reprodutiva durante toda a vida. O que pode acontecer com o envelhecimento é a diminuição do volume ejaculado e do orgasmo. Problemas relacionados à ereção também são mais frequentes com o avançar da idade.


A disfunção erétil acomete todos os homens ao longo da vida?
Não. O homem idoso pode ter uma ereção plena. No entanto, sabemos que os problemas com a ereção são mais propensos de acontecer nos idosos. O idoso que se cuidou durante toda a vida certamente tem mais chances de manter sua vida sexual com mais qualidade.

Em quais situações as pílulas para disfunção erétil podem prejudicar a saúde?
As pílulas para tratamento da disfunção erétil são uma excelente alternativa para tratar essas patologias. Mas é preciso deixar claro que esses comprimidos devem ser receitados pelo médico após uma investigação do paciente e estabelecimento de um diagnóstico. Todo medicamento quando tomado de forma abusiva ou sem indicação médica pode ter complicações. As contraindicações devem ser respeitadas.

A andropausa existe?
Existe, sim. É a diminuição da produção dos hormônios masculinos, os andrógenos, e seus sintomas. O principal andrógeno é a testosterona. Andropausa é tratada pelos médicos com o nome de DAEM (Distúrbios Androgênicos do Envelhecimento Masculino). Os homens podem iniciar essa diminuição a partir dos 40 anos de idade, e a sintomatologia pode se tornar mais intensa nos idosos. Sintomas como diminuição da libido, diminuição da intensidade do orgasmo, falta de força muscular e aumento de peso podem ser um indício do problema. Existe tratamento, por isso é necessário uma busca por acompanhamento médico do urologista e do geriatra.

Estudos têm mostrado que os homens têm se permitido um pouco mais de vaidade. Isso de alguma forma chegou a ter um efeito positivo nessa questão do cuidado com a saúde, ou não há essa relação?
Há relação. Com o aumento da vaidade vem a busca por melhores hábitos de vida. Existe uma maior procura pela prevenção médica e, certamente, temos um aumento na qualidade e expectativa de vida.

Ao mesmo tempo em que os homens representam a parcela da população que menos costuma se cuidar, especialmente sob o aspecto da prevenção, são eles também os responsáveis pelo maior número de atendimentos nas urgências e emergências. O que isso representa? Os homens só procuram ajuda médica em último caso?
Na verdade, o aumento do número de atendimentos reflete os dados que mostram que os homens são mais acometidos pelos acidentes e violência, como também são mais propícios a doenças crônicas. A falta de prevenção e de cuidados com saúde também piora estas estatísticas.