RAUL JUNGMANN » 'Os resultados da intervenção estão vindo' Ministro extraordinário da Segurança Pública

André Clemente, Kauê Diniz e Paula Losada | politica@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 12/05/2018 09:00

Em menos de seis anos, a trajetória política e, porque não, a vida de Raul Jungmann deu uma verdadeira guinada. Em 2012, ele estava percorrendo as ruas do Recife para tentar garantir uma vaga na Câmara Municipal. Depois, ocupou, como suplente, uma cadeira na Câmara Federal, mas sempre na incerteza de deixar o Legislativo na volta do deputado detentor do mandato. Mas um convite de Michel Temer, em 2016, para assumir o Ministério da Defesa, com apoio dos militares, foi a mola propulsora da virada. Ganhou prestígio junto ao presidente, que o escolheu para o desafio de comandar, a recém-criada pasta de Segurança Pública em fevereiro deste ano. Uma área que está sob os holofotes de todo o país, devido à violência. “Me espanto quando refaço minha trajetória”, diz o ministro.

Ao aceitar o convite para o novo ministério, o senhor abriu mão de ser candidato nas eleições deste ano. Por que decidiu fazer esse sacrifício pessoal, ficar sem mandato e assumir um ministério que vai lidar com um problema tão grave hoje no país como é a segurança pública?
Pelo fato de que, como você mesmo disse, o ministério vai lidar com um problema tão grave como é a segurança pública hoje. A violência e a insegurança, o crime organizado chegaram a tal ponto que representam uma ameaça à sociedade, ao estado e à democracia. Ademais, neste ano, teremos as mais importantes eleições gerais em décadas e um povo ameaçado, indefeso, será presa fácil de propostas regressivas, autoritárias e antidemocráticas, cuja raiz está na insegurança em que vivemos. Então, criar alternativas de combate ao crime, apresentar resultados, mas dentro da lei, com respeito aos direitos e sem saídas simplistas, tipo olho por olho, dente por dente, me pareceu um desafio ao qual eu não poderia me negar a aceitar.
 
O seu primeiro ato no novo ministério foi exonerar o diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia, que assumiu o cargo prestigiado, inclusive com a presença do presidente Temer na sua posse. Foi uma decisão que causou surpresa no meio político e demonstra sua força como ministro. Por que o senhor tomou essa decisão na ocasião e como convenceu o presidente a aceitar a exoneração dele?
Porque, quando aceitei o cargo, em contrapartida, cobrei carta banca para montar minha equipe e pelos meus critérios. O senhor Segóvia não se enquadrava nela.
 
O que o senhor pretende fazer para acabar com o crime organizado no país? Quais são as suas estratégias para garantir aos brasileiros um país mais seguro?
Primeiro, é preciso entender que o governo federal, desde antes da Carta de 1988, não teve atribuições, nem responsabilidades e muito menos recursos compatíveis para lidar com a segurança pública, cuja responsabilidade é dos estados. A partir disso, tomamos três decisões estratégicas: a primeira delas foi dotar o governo federal de governança na área de segurança, o que ele não tinha até aqui. Como? Disponibilizando dinheiro, via financiamento do BNDES e a fundo perdido, em forma de concessão, para estados e municípios. Porém, e isso é importante, sempre exigindo dos estados e municípios algo em troca, como redução da taxa de homicídios etc. Em segundo lugar e pela primeira vez desde a Carta de 1988, carimbando recursos de diversas fontes para a segurança, dando assim condições de previsibilidade para os investimentos no setor, o que era eterna queixa de todos. Em terceiro lugar, a exemplo da educação, que tem o Inep, criar o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas em Segurança Pública, como já existe em diversos outros países; e criar também a Escola Nacional de Segurança Pública e Inteligência, a qual queremos que venha a ter um nível global de excelência.
 
Em 2016, foram registrados no Brasil 61,6 mil homicídios, o maior número de assassinatos da sua história e que supera os números de mortes violentas de outros 52 países somados. O que fazer para acabar com esse extermínio de brasileiros?
Metade desses 61 mil homicídios estão concentrados em 2% dos municípios, 109 deles. E, em sua maioria, são praticados por jovens vulneráveis na faixa dos 15 anos aos 24 anos. Esse será o nosso foco imediato. Para tanto, foi criada a Câmara Setorial de Prevenção Social e Segurança, composta por todos os ministérios da área social, sob nossa coordenação. Para levar projetos e programas já existentes para esses territórios e grupos sociais mais vulneráveis, evitando assim que eles ingressem no crime.
 
O senhor participou de reunião com todos os governadores e anunciou a liberação de recursos para os estados. Já disse que pretende se reunir com prefeitos, empresários e representantes da sociedade civil para tratar da questão da segurança pública. A impressão que dá é que o senhor está chamando todos à responsabilidade sobre seus papéis no combate à violência, criando uma grande força-tarefa para vencer a criminalidade. A intenção é essa mesmo?
Perfeito. É isso mesmo. Mas também pelo fato que as cidades e regiões que reverteram a situação de insegurança em que viviam, o fizeram sempre com a mobilização e o apoio da sociedade civil. Foram os casos, por exemplo, de Medellin, Bogotá (ambos na Colômbia), Ciudad Juarez (México), essa última considerada durante anos a mais violenta do mundo. O processo de mudança em todas elas durou anos e foi a sociedade organizada que fez os sucessivos governos manterem o rumo certo.
 
Há poucos dias, o senhor reforçou que os estados que não compartilharem com o governo federal, em até 30 dias, os dados sobre criminalidade ficariam impedidos de receber o repasse de dinheiro. Como está essa situação e quais estados não informaram?
A situação tem melhorado e tem que melhorar mesmo. É impossível traçar políticas públicas nacionais, em qualquer área, sem dados e informações que são gerados nos estados. O problema é que vários deles não mandam os dados porque não os tem organizados ou não quer aparecer mal na foto.

Independentemente de quem é de esquerda ou de direita, todos concordam que o estado deve ser responsável pela segurança pública. O que de fato falta para que, estrategicamente, a segurança receba atenção do estado e do orçamento para que a violência seja neutralizada?
Uma resposta parcial, mas decisiva, já foi dada no início dessa nossa entrevista, mas eu a repito aqui: mais participação, em termos de recursos, atribuições e governança por parte da união federal, a exemplo do que já acontece desde 1988 nas áreas da educação, saúde, assistência social etc.

Como ministro da Defesa, o senhor participou diretamente da decisão de fazer a intervenção no Rio de Janeiro. Era a única solução e quais resultados práticos já deram para ser sentidos?
Era a única saída, sim, diante da perda de capacidade do governo estadual de prover a segurança à população carioca e o avanço agressivo da criminalidade. Além do que, o Rio de Janeiro vivia uma crise econômica, fiscal, moral e de segurança. Os resultados da intervenção estão vindo, mas serão gradativos. Afinal, trata-se de refazer toda a polícia civil e militar e reestruturar o sistema penitenciário, entre outras estruturas.
 
O assassinato da vereadora do Rio Marielle Franco, em março, corre risco de ficar impune?
Seguramente, não ficará. As investigações caminham bem, a equipe responsável é reconhecidamente competente e séria.

Qual o orçamento da pasta de Segurança para 2018 e qual a prioridade depois do caso Rio de Janeiro a ser tratada pela sua gestão?
Para 2018, o orçamento é de R$ 13 bilhões, mais o dinheiro novo que estará sendo liberado nessa semana via medida provisória.

Em uma declaração, o senhor apontou para um movimento real, de que parte da classe média brasileira é culpada pela violência, por sustentar o tráfico. Ninguém conseguiu neutralizar esse fluxo de drogas entre as classes. Qual seria o caminho?
Estabelecer na lei das drogas um limite, uma quantidade, que separe, para fins de pena e punição, o usuário do traficante. Para o primeiro, devemos nos fixar na sua recuperação. Para o segundo, a mão dura da lei, penas severas e presídios de segurança máxima.

O senhor anunciou um mutirão carcerário a partir de junho para reduzir superlotação de presídios. Quais resultados pretende alcançar?
Pretendemos que até o fim do ano possamos atender a 50 mil apenados que não cometeram delitos graves e são réus primários.

Para fins eleitorais, a baixa popularidade do presidente Temer pode ser nociva a pleitos futuros que o senhor planeje?
Não creio. O presidente Temer faz um bom governo para o pais. Nos tirou da crise profunda e fez reformas importantes. Estou seguro de que adiante seu real valor será reconhecido.
 
O senhor assumiu um cargo de total gestão de crise, mas que, ainda que o tire de eleições em 2018, pode ser bastante estratégico em médio e longo prazos. Qual a seu plano político a partir de 2019?
Sinceramente, não sei. Estou ministro pela terceira vez, e todas elas em cargos ou críticos ou de muita responsabilidade. Não deixarei a política. Mas o rumo a tomar somente terei isso mais claro um pouco mais adiante.
 
Em 2012, o senhor era eleito vereador no Recife e, seis anos depois, é chamado de “o homem forte do presidente da República”, sendo cotado para a embaixada, entre outras possibilidades. Imaginava tamanha guinada em tão pouco tempo?
Impensável, não é? Nem em sonho. Eu mesmo me espanto quando refaço essa minha trajetória.