Êxodo urbano A nova rotina de vida imposta pelo isolamento social faz com que muita gente deixe o Grande Recife em direção ao interior e ao litoral

Tatiana Notaro
Especial para o Diario
tatiana.notaro@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 18/04/2020 03:00

Quando o isolamento social foi instituído e, em alguns casos, a quarentena se fez indispensável por causa da pandemia da Covid-19, muita gente decidiu ir para cidades do interior. Aqui em Pernambuco, inclui-se o litoral. Gente que passou a trabalhar em home office, com ou sem filhos, e que achou uma forma de deixar apartamentos no Recife e ir para casas de parentes ou imóveis alugados por temporada. No Brasil, não houve até o momento a decretação de “lockdown”, situação em que o trânsito entre limites municipais passa a ser proibido, mas qualquer deslocamento precisa ser feito com responsabilidade.

Alexandre Barbosa trabalha com corretagem em Caruaru e viu, antes da Semana Santa, todas as reservas feitas para festas serem canceladas. Depois, começou a perceber procuras motivadas pela pandemia. Uma médica, diagnosticada com a Covid-19, alugou um apartamento para a quarentena; o marido de uma médica saiu de casa por segurança. “Tenho um site especializado em aluguel por temporada e temos recebido procura de profissionais de saúde, familiares de pessoas idosas. Pessoas que precisaram sair de suas casas provisoriamente”, explica.

Barbosa disse que dos 23 imóveis sob sua corretagem, seis estão alugados. Destes, quatro aluguéis são motivados pela pandemia. “As pessoas optam por esse tipo de imóvel porque são mobiliados e têm toda estrutura”, diz o corretor, que é conselheiro do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci).

O Diario conversou ainda com dois servidores públicos que decidiram deixar centros urbanos durante o isolamento social. Em pleno puerpério, Carolina Paraíba teve bebê no fim de março, e precisou adaptar o resguardo e os cuidados com o recém-nascido paralelos à pandemia. A família, que reside em Caruaru, decidiu pelo isolamento em um sítio no município de Chã Grande, na Mata Sul. “O isolamento é total. Mesmo assim, colocamos dispensers de álcool em gel pela casa e cumprimos todas as regras”, conta ao Diario. Apenas o marido de Carol, que desempenha serviço essencial no Complexo de Suape, sai de casa; outras saídas, só para consultas médicas.

José Henrique Júnior mudou-se do Recife para Timbaúba. Servidor público do estado, Henrique está há um mês na casa dos sogros com a esposa e dois filhos. “Ficamos 15 dias no Recife e, depois nos mudamos para cá. A sensação é de segurança, é diferente. Há a ideia de que as pessoas são mais ‘negligentes’, mas o isolamento tem funcionado aqui”, conta. A maior motivação, além de ter mais espaço para os filhos, foi a ideia de que, em uma cidade menor, a possibilidade de infecção pela Covid-19 seja menor. A família segue sem previsão de volta ao Recife.

Orientação médica

Epidemiologista, pesquisadora em Saúde Pública da Fiocruz Pernambuco e docente, a médica Tereza Lyra diz que, mesmo sem a adoção do “lockdown”, o comportamento das pessoas que se mudam temporariamente precisa seguir os mesmos ritos que deveriam ser tomados em casa. O próprio deslocamento pode ser um fator de risco de disseminação do vírus – por isso, o isolamento nessa residência secundária precisa ser igualmente rígido, com higiene adequada, uso de máscaras e álcool em gel 70%.

“Essas pessoas têm que se comportar, não circular na cidade. Todos os cuidados precisam ser levados”, reforça. A médica explica que em cidades como Gravatá e Chã Grande, além das praias do estado, já tidas como balneários e espaços de festas, precisam manter os protocolos orientados pelas autoridades de saúde.

Tereza Lyra é parte da Rede Solidária em Defesa da Vida, um grupo multidisciplinar de especialistas que se dedica ao combate à Covid-19. Na Semana Santa, a Rede divulgou uma carta de orientações aos prefeitos cujas cidades são muito procuradas no período. Entre elas, distribuição de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) aos profissionais de saúde da família, cumprimento de isolamento e comunicação direcionada e adequada às suas populações.