Dinheiro no exterior pode ser repatriado O Brasil se posiciona como um dos países que mais possui patrimônios fora do país. E o pior: fruto de dinheiro de origem ilícita, que nesse caso é crime

ANDRÉ CLEMENTE
andreclemente.pe@dabr.com.br

Publicação: 10/04/2016 03:00

O aparecimento de milhões de dólares em países mundo afora envolvendo empreiteiras, empresários e políticos brasileiros acendeu um sinal de alerta na sociedade sobre a legalidade de possuir recursos no exterior. E todo mundo sabe que essa prática não é novidade. O Brasil se posiciona como um dos países que mais possui patrimônios fora do país. E o pior: fruto de dinheiro de origem ilícita. Muita gente naturalmente associa “paraíso fiscal” a corrupção ou ilegalidade, o que ocorre de fato, mas não é na sua totalidade. Ainda que seja legal ter contas ou empresas na Suíça, nos Estados Unidos ou qualquer outro lugar do mundo, a regra é clara e segue dois pontos quanto à origem do patrimônio: se for ilítica, é crime com várias possibilidades e a corrupção é só uma delas. Mas se o dinheiro é de fonte legal, o governo brasileira tem que saber da existência dele, ou se torna crime tributário, de sonegação.
É nesse último caso que o governo começou a chamar para “conversar”. O argumento é a Lei da Repatriação, que concede vantagens para o contribuinte irregular ficar quite e ainda ajudar na engorda dos cofre da União. As condições especiais iniciaram em 4 de abril e vão até outubro. A Receita Federal editou em 15 de março deste ano o último texto da Instrução Normativa 1627, que trata exatamente do Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT).
De acordo com o advogado especialista em direito tributário do escritório Da Fonte Advogados, Carlos André Pereira Lima, o objetivo do programa é, conforme instrução, que ocorra “a declaração voluntária de recursos, bens ou direitos de origem lícita, não declarados ou declarados incorretamente, remetidos ou mantidos no exterior ou repatriados por residente ou domiciliados no país.”
Mas há restrições. Políticos ou contribuintes com vínculo governamental são vetados dos benefícios da lei. Repatriar patrimônio sem comprovação de origem legal também. E é onde fecha o cerco no Brasil. Desde que a Operação Lava-Jato iniciou a investigação de corrupção de contratos da Petrobras, muitos políticos e com vínculos com o governo foram citados, delatados e punidos por ganhos ilícitos de receita irregular ou, no mínimo, “escondida”. Nomes como Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, e João Santana, marqueteiro do PT em campanhas eleitorais, mantinham dinheiro em paraísos fiscais. Suíça e República Dominicana eram países onde o patrimônio estava depositado. “O problema, repito, é a origem do dinheiro”, pontua Carlos André.
A suspeita é que as obras de refinarias espalhadas pelo Brasil e que tiveram preços multiplicados para construção abre margem para a investigação. Para se ter ideia, a Refinaria Abreu e Lima, em Suape, passou do orçamento inicial de US$ 2 bilhões para quase US$ 20 bilhões. A linha de busca da Polícia Federal é de que esse “saldo extra” esteja em outros países, em empresas (offshores) criadas para gerir verba de corrupção.
Segundo o advogado, esse público não será atendido pela lei e o canal de comunicação com o governo precisa ser visto sem preconceito pelos contribuintes que queiram ficar de acordo com a legislação. “A Lei da Repatriação permite que as pessoas física ou jurídica donas de patrimônios no exterior comprovado até 31 de dezembro de 2014 possam trazer o recurso para o Brasil, desde que cumpram duas exigências sobre o valor do bem apresentado à Receita e ao Banco Central (quando necessário): a primeira é pagar uma alíquota de 15% de Imposto de Renda e a segunda é uma multa de 100% do valor do imposto devido.” O governo cobra por cinco anos e, em condições normais, o tributo chega a 27,5% do valor e a multa é de 150% do tributo.